Brasil entre potências: soberania, comércio e a nova geopolítica Sul-Sul
1. Um tarifaço, muitas consequências
A ameaça de Donald Trump de impor tarifas de até 50%
sobre produtos brasileiros teve um efeito colateral inesperado: recolocou o
debate sobre soberania econômica e alianças geopolíticas no centro da política
nacional.
Ao contrário do que esperavam os setores submissos ao
trumpismo, o presidente Lula respondeu com altivez:
“O Brasil pode sobreviver sem comércio com os EUA e
vai recorrer a outros parceiros para substituí-lo.”
A fala é mais que retórica. Ela expressa uma mudança
de eixo na política externa brasileira e um reconhecimento do que os números
já indicam há anos: o Brasil é hoje muito mais parceiro da China do que dos
Estados Unidos.
2. Os números
não mentem: China é o principal parceiro comercial do Brasil
Segundo dados divulgados pela Econovis e citados pela
Bloomberg:
Em 2024, o comércio total de bens entre Brasil e EUA
foi de US$ 92 bilhões.
Os EUA exportaram US$ 50 bi e importaram US$ 42 bi.
Resultado: superávit de US$ 7 bilhões para os EUA.
No mesmo período, o comércio entre Brasil e China foi
de US$ 188 bilhões.
A China exportou US$ 72 bi e importou US$ 116 bi.
Resultado: déficit de US$ 44 bilhões para a China, ou
seja, superávit para o Brasil.
Em outras palavras, a China compra muito mais do Brasil do que vende, ao passo que os EUA fazem o contrário. Isso mostra claramente quem contribui para a industrialização brasileira e quem se beneficia da nossa desindustrialização.
3. O falso
patriotismo desmontado pela realidade
Enquanto o bolsonarismo bradava slogans como “Brasil
acima de tudo” e exibia bonés vermelhos de Trump, a economia brasileira se
afundava em dependência, submissão ideológica e atraso industrial.
Agora, com os EUA impondo tarifas punitivas, o
discurso patrioteiro desmorona: como pode um “aliado” ser o primeiro a atacar o
Brasil economicamente? A resposta está na natureza colonial da relação que o
bolsonarismo cultivou com Washington.
O verdadeiro patriotismo, como vem sendo resgatado
por Lula, é o que defende os interesses nacionais com coragem, diversidade de
alianças e visão estratégica.
4. Um novo
caminho: soberania com o Sul Global
A crise com os EUA é também uma chance histórica. O
Brasil pode e deve:
Aprofundar relações com China, Índia, África do Sul,
Rússia, Indonésia, Nigéria e países árabes;
Investir na integração latino-americana,
especialmente com Argentina, Bolívia, Venezuela e Cuba;
Fortalecer os BRICS+, organismos regionais e arranjos
comerciais alternativos ao dólar;
Apostar em soberania tecnológica, industrial e
alimentar, sem medo de romper dependências.
Isso não significa fechar portas. Significa negociar
de igual para igual, como qualquer país soberano deve fazer.
5. A tática do
caos: como o tarifaço de Trump pode ser o estopim de uma nova tentativa de
golpe
Pouco se discute nos jornais, mas é preciso dizer com
todas as letras: a movimentação de Jair e Eduardo Bolsonaro em articulação com
Donald Trump não é apenas simbólica ou diplomática é um movimento tático para
criar instabilidade econômica, política e institucional no Brasil.
Ao estimular a taxação de produtos brasileiros, o
objetivo do clã Bolsonaro era criar um cenário de crise que permitisse cooptar
setores da elite econômica nacional, principalmente aqueles com interesses nos
mercados dos EUA , para apoiar uma ruptura institucional.
A lógica seria simples e perversa:
Trump impõe tarifas;
o Brasil sofre economicamente;
o governo Lula é acusado de “isolar o Brasil do
mundo”;
e os setores da elite, temendo prejuízos, abraçariam
um golpe em nome da “estabilidade dos negócios”.
Esse tipo de tática já foi usado em outros golpes ao
longo da história da América Latina: fabricar crises, sabotar a economia, criar
pânico nos mercados e apresentar um golpe como “necessário” para salvar o país.
Foi assim no Chile de Allende. Foi assim no Brasil em 1964. E a tentativa se
repete agora, reconfigurada no século XXI.
É por isso que desmascarar o falso patriotismo
bolsonarista é uma questão de soberania democrática. O golpe hoje não vem
apenas com tanques vem com tarifas, fake news e alianças externas.
6. Conclusão:
entre tarifas e bandeiras, o Brasil precisa escolher um projeto
A soberania não é uma palavra decorativa. É prática
concreta. E hoje, o Brasil tem nas mãos uma oportunidade histórica de romper
com o ciclo de subordinação e encenar um novo ciclo de autonomia e protagonismo
global.
Trump e seus aliados tentam empurrar o Brasil de
volta à condição de quintal.
Lula, ao reagir com altivez, recoloca o país no centro do tabuleiro mundial.
Aos que ainda usam a palavra “pátria” como disfarce: a
pátria não é um boné — é o povo em marcha rumo ao seu próprio destino.
Referências
Econovis @econovisuals, Twitter, julho de 2025.
Bloomberg. “Lula diz que o Brasil pode sobreviver sem
comércio com os EUA”. Julho de 2025.
FERNANDES, Bob. “O que estão tramando EUA e Israel
nas eleições de 2026?” YouTube, 2025.
GUIMARÃES, Samuel Pinheiro. Quinhentos anos de
periferia. L&PM, 1999.
BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. A formação do império
americano. Civilização Brasileira, 2005.
RIBEIRO, Darcy. O povo brasileiro. Companhia das
Letras, 1995.
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