“O velho está morrendo, e o novo não pode
nascer. Nesse interregno, surgem os monstros.”
— Antonio Gramsci
Roma
e os EUA: Dois Impérios no Espelho da História
A
queda do Império Romano do Ocidente não foi um evento súbito. Foi um colapso
gradual, moldado por décadas de decadência interna e pressões externas. Os chamados
“bárbaros”, visigodos, vândalos, hunos e outros, não foram os únicos
responsáveis, mas atuaram como catalisadores de um processo já em curso.
Hoje, vemos sinais semelhantes de declínio em outro império: os Estados Unidos. Se Roma caiu com o saque de suas cidades e o colapso de sua moeda, os EUA podem enfrentar seu próprio colapso simbólico e geopolítico através da desdolarização, um movimento crescente para abandonar o dólar como moeda dominante no comércio internacional.
1.
Por que Roma caiu?
Fatores
internos:
Crise
econômica e inflação: A moeda romana, o denário, perdeu valor após a redução do
teor de prata.
Corrupção
e má administração: O império inchou com uma burocracia cara e ineficiente.
Divisão
política: A separação entre o Oriente (Constantinopla) e o Ocidente (Roma)
minou a unidade.
Declínio
cívico: O espírito coletivo romano, sua ética pública e identidade comum, se
enfraqueceu.
Fatores
externos:
Migrações
e conflitos: Povos germânicos e hunos pressionaram as fronteiras romanas.
Militarização
terceirizada: Roma passou a depender de soldados bárbaros (foederati) que, mais
tarde, se voltaram contra ela.
Saques
históricos: Em 410 (visigodos) e 455 (vândalos), Roma foi saqueada e marcos do fim simbólico de sua grandeza.
2. O
que é desdolarização e por que ela ameaça os EUA?
A desdolarização
é o processo pelo qual países deixam de usar o dólar como moeda de referência
para o comércio, especialmente de commodities como o petróleo, além de
reduzirem suas reservas cambiais em dólar.
Esse
movimento ameaça o coração do poder americano: o petrodólar e a hegemonia da
moeda como padrão global. E não se trata de teoria: está em curso.
Sinais
claros da desdolarização:
BRICS
(Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul) avançam em acordos comerciais com
moedas locais.
China
e Rússia negociam petróleo em yuan e rublos.
Irã,
Venezuela e Arábia Saudita buscam fugir do sistema SWIFT (dominando pelos EUA).
O Novo
Banco de Desenvolvimento dos BRICS surge como alternativa ao FMI e Banco
Mundial.
3. O
que a desdolarização pode causar nos EUA?
a) Colapso
da demanda por dólares
Sem a
necessidade global de dólares, o valor da moeda americana pode despencar,
tornando o financiamento do déficit insustentável.
b) Inflação
estrutural
Os
EUA poderão enfrentar inflação crônica, semelhante à que afetou impérios em
decadência.
c) Perda
de poder geopolítico
O
dólar permite sanções, controle sobre o comércio e domínio dos fluxos
financeiros globais. Sem ele, o poder coercitivo dos EUA enfraquece.
d) Crise
de legitimidade
Com a
ascensão da China, Índia e de coalizões como os BRICS, aliados tradicionais dos
EUA começam a buscar alternativas.
4.
Roma x EUA: Espelhos da História
|
Elemento |
Império Romano |
Império Estadunidense |
|
Moeda
enfraquecida |
Denário
desvalorizado |
Dólar
ameaçado pela desdolarização |
|
Exércitos
terceirizados |
Bárbaros
como foederati |
OTAN,
mercenários, PMCs (Empresas militares privadas) |
|
Invasões
externas |
Visigodos,
vândalos, hunos |
Pressão
econômica e tecnológica (China, BRICS) |
|
Corrupção
e burocracia |
Administração
decadente |
Paralisação
política e crise institucional |
|
Cultura
em crise |
Esgotamento
do ethos romano |
Polarização
extrema, crise de valores |
|
Queda
simbólica |
Saques
de Roma (410, 455) |
Fim do
petrodólar? Crise sistêmica? |
5.
Conclusão: O novo bárbaro fala mandarim?
A
queda de impérios não acontece da noite para o dia. É sempre um processo, por
vezes imperceptível, até que se torne irreversível. O Império Americano,
fundado sobre a supremacia do dólar, do petróleo e da força militar,
encontra-se diante de um movimento tectônico silencioso.
A
desdolarização não é uma simples mudança financeira, ela é um sintoma de um
mundo que não gira mais em torno de Washington. Assim como os bárbaros que um
dia marcharam sobre Roma, hoje temos coalizões, moedas alternativas e novos
polos de poder econômico desafiando a velha ordem.
A
história não se repete, mas rima.
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