Em 2016, durante o processo de impeachment, a então presidenta Dilma Rousseff fez um alerta contundente ao Brasil: se o golpe institucional fosse consumado, o país mergulharia no retrocesso social, no desmonte do Estado e na volta da miséria. À época, muitos chamaram de exagero. Disseram que era discurso político. Mas menos de uma década depois, os fatos falam mais alto: a profecia se cumpriu com rigor cirúrgico. E o povo, como sempre, pagou a conta.
O Golpe de 2016: entre o teatro político e o assalto
ao Estado
O impeachment de
Dilma não foi um ato isolado, tampouco um simples ajuste de poder. Foi parte de
uma ofensiva mais ampla de setores do capital financeiro, do rentismo
internacional, da grande mídia empresarial e das elites nacionais para
reconfigurar o Estado brasileiro. O que estava em jogo era a quebra do pacto
social construído a duras penas com a Constituição de 1988 e aprofundado com as
políticas sociais dos anos 2000.
Ao contrário do que
muitos disseram, não foi um “ajuste democrático”. Foi um movimento orquestrado
para desmontar os direitos sociais e trabalhistas, entregar o patrimônio
nacional e submeter o Brasil aos interesses das elites locais e internacionais.
O próprio Joseph Stiglitz,
prêmio Nobel de Economia, classificou o impeachment como um “golpe parlamentar”
a serviço de interesses econômicos.
Um Congresso em Cena de Horror
A sessão do impeachment
na Câmara foi um espetáculo grotesco. Deputados votando “em nome de Deus, da
família e da moral” , enquanto muitos respondiam a processos criminais,
envolviam-se em escândalos e defendiam torturadores. O então deputado Jair
Bolsonaro prestou homenagem ao torturador Brilhante Ustra, símbolo do aparato
repressivo da ditadura militar, em plena tribuna da democracia. Um gesto que se
tornaria prenúncio de um ciclo de autoritarismo e obscurantismo que viria a
seguir.
A cena foi
simbólica: o Brasil estava sendo entregue à barbárie sob o pretexto de
moralidade. E os votos da maioria revelavam não uma indignação ética, mas o
desejo de poder e vingança de uma elite que nunca aceitou um projeto popular no
comando da nação.
Os Traidores e Seus Castigos
Muitos que
protagonizaram o golpe foram, posteriormente, atingidos por escândalos e
derrotas políticas. Michel Temer, que assumiu a Presidência após o impeachment,
foi preso por corrupção e protagonizou um governo desastroso, marcado por
tentativas de compra de apoio parlamentar e reformas impopulares.
Aécio Neves,
símbolo da oposição golpista, foi gravado pedindo dinheiro ao próprio primo e
ameaçando de morte caso houvesse delação. Sua irmã foi presa, e sua reputação
política jamais se reergueu. Eduardo Cunha, o grande articulador do golpe,
também foi preso, cassado e condenado por corrupção. Empresários como os irmãos
Batista (JBS) passaram de financiadores da nova ordem a delatores de um sistema
podre.
No Ceará, o senador
Eunício Oliveira, presidente do Senado durante o impeachment, não se reelegeu.
O deputado Adail Carneiro, que havia almoçado com Dilma antes de votar pelo
impeachment, caiu no ostracismo político.
A chamada “maldição
dos golpistas” foi mais do que simbólica: foi histórica. Mas seus efeitos,
infelizmente, não pararam por aí.
A Queda Livre do Brasil
A eleição de Jair
Bolsonaro em 2018 representou a radicalização do golpe de 2016. Expulso do
Exército por indisciplina, sem histórico legislativo relevante, defensor da
tortura e da ditadura, Bolsonaro chegou ao poder em meio a um cenário de
desinformação, manipulação das redes sociais e apoio de grupos econômicos
interessados no aprofundamento do desmonte do Estado.
Seu governo foi o
ápice do desastre: ataques às universidades, destruição das políticas ambientais,
estímulo ao armamento da população, perseguição a professores, artistas,
jornalistas e cientistas, e, sobretudo, o descaso criminoso com a pandemia da
COVID-19.
Foram mais de 700
mil mortes, muitas evitáveis. Famílias inteiras foram dizimadas pela
negligência do governo, que zombava da ciência, atrasava a compra de vacinas,
promovia medicamentos ineficazes e negociava propina para aquisição de
imunizantes.
No campo econômico,
o desastre foi igualmente brutal: o PIB encolheu, a inflação explodiu, o desemprego
aumentou, o preço dos alimentos disparou. Milhões voltaram à miséria. O Brasil,
que havia saído do Mapa da Fome da ONU, retornou com força. E as filas do osso tornaram-se a imagem cruel
de um país saqueado.
A destruição do Estado e o entreguismo
O governo Bolsonaro
acelerou a privatização de empresas públicas estratégicas, como a Eletrobras, e
desmontou programas sociais como o Bolsa Família, substituído por um “Auxílio
Brasil” improvisado e eleitoreiro. A educação pública foi atacada sistematicamente.
O meio ambiente virou moeda de troca para grileiros e garimpeiros. Povos
indígenas foram dizimados por invasões e descaso.
A geopolítica
brasileira foi rebaixada. O Brasil tornou-se pária internacional. Saiu do
protagonismo latino-americano, abandonou os BRICS e adotou uma política externa
submissa aos EUA de Trump e aos interesses do capital transnacional.
A Luta não acabou
Apesar de tudo, há
resistência. Há memória. Há mobilização popular, intelectual e política. Os
governos golpistas passaram, mas as feridas ainda doem. A reconstrução será
longa e exigirá coragem, verdade e compromisso com a justiça social. O Brasil
precisa, urgentemente, de um novo pacto civilizatório baseado na soberania, na
democracia, na inclusão e no respeito aos direitos humanos.
A profecia de Dilma
se concretizou, mas também permanece como sinal: é possível resistir, é preciso
lembrar, é urgente reconstruir. A história cobra, mas também ensina. E a lição
que fica é clara: não há futuro possível
sem democracia, sem justiça e sem memória.
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