Carta Maior
Decano do STF falta sessão sobre cassações após descoberta embaraçosa
Celso de Mello alegou problema de saúde para não comparecer à sessão do
STF desta quarta-feira. Ele foi surpreendido com a descoberta de um voto
seu sobre questão idêntica à que seria tratada hoje e poderia
determinar a cassação de três parlamentares envolvidos no julgamento do
mensalão. Diante da ausência, o presidente da Corte, Joaquim Barbosa,
decidiu adiar a sessão do julgamento do mensalão e julgar outras
questões.
Brasil 247
(*) Matéria publicada originalmente no Brasil 247
Brasília - A decisão sobre a perda de mandato dos três deputados condenados na Ação Penal 470 deve demorar pelo menos mais um dia para sair. Único ministro que ainda não votou sobre o tema no julgamento — que tem a discussão empatada em 4 a 4 –, o decano Celso de Mello alegou problemas de saúde para não comparecer à sessão desta quarta-feira. Diante da ausência, o presidente da Corte, Joaquim Barbosa, decidiu adiar a sessão do julgamento do mensalão e julgar outras questões.
Na última sessão do julgamento, realizada na segunda-feira passada, Mello se colocou ao lado dos ministros que defenderam que a suspensão dos direitos políticos, decretada pelo STF, tem como decorrência natural a perda do mandato. Suas intervenções na discussão deram a entender que ele acompanharia o presidente da Corte e relator do processo, Joaquim Barbosa, mas Mello não chegou a votar sobre o tema.
Num voto proferido em 1995, contudo, o decano defendeu que apenas o Congresso tinha o direito de cassar o mandato de um parlamentar. Acórdão datado de 31 de maio daquele ano, trazido à tona pelo usuário Stanley Burburinho através do Twitter, revela o voto do ministro no caso de cassação de um vereador.
Eis o que Celso de Mello disse à época: “(…) É que o congressista, enquanto perdurar o seu mandato, só poderá ser deste excepcionalmente privado, em ocorrendo condenação penal transitada em julgado, por efeito exclusivo de deliberação tomada pelo voto secreto e pela maioria absoluta dos membros de sua própria Casa Legislativa”.
Ao longo do julgamento da Ação Penal 470, conhecida como ‘mensalão’, o ministro sempre defendeu que a corte suprema tem o direito de cassar o mandato de um parlamentar condenado com trânsito em julgado – sem mais direito a recursos -, seguindo a tese do relator Joaquim Barbosa.
Quando votar, será que ele irá mudar sua posição? Irá desdizer o que disse há 17 anos?
No Congresso, todos os partidos, incluindo os da oposição, como o PSDB, defendem que a prerrogativa de cassar parlamentares é do Poder Legislativo – e não do Judiciário. Hoje, ao meio-dia, os ministros Ricardo Lewandowski e Carmen Lúcia, foram homenageados com a mais alta comenda do Congresso Nacional.
Leia, abaixo, o voto proferido por Celso de Mello há 17 anos, disponível aqui.
“A norma inscrita no art. 55, § 2o, da Carta Federal, enquanto preceito de direito singular, encerra uma importante garantia constitucional destinada a preservar, salvo deliberação em contrário da própria instituição parlamentar, a intangibilidade do mandato titularizado pelo membro do Congresso Nacional, impedindo, desse modo, que uma decisão emanada de outro poder (o Poder Judiciário) implique, como conseqüência virtual dela emergente, a suspensão dos direitos políticos e a própria perda do mandato parlamentar.”
“(…) É que o congressista, enquanto perdurar o seu mandato, só poderá ser deste excepcionalmente privado, em ocorrendo condenação penal transitada em julgado, por efeito exclusivo de deliberação tomada pelo voto secreto e pela maioria absoluta dos membros de sua própria Casa Legislativa.”
Não se pode perder de perspectiva, na análise da norma inscrita no art. 55, § 2o, da Constituição Federal, que esse preceito acha-se vocacionado a dispensar efetiva tutela ao exercício do mandato parlamentar, inviabilizando qualquer ensaio de ingerência de outro poder na esfera de atuação institucional do Legislativo.”
“Trata-se de prerrogativa que, instituída em favor dos membros do Congresso Nacional, veio a ser consagrada pela própria Lei Fundamental da República.
O legislador constituinte, ao dispensar esse especial e diferenciado tratamento ao parlamentar da União, certamente teve em consideração a necessidade de atender ao postulado da separação de poderes e de fazer respeitar a independência político-jurídica dos membros do Congresso Nacional.”
Volume 13 Número 1 – Janeiro/Março 2002
Acórdãos
Resoluções
ACÓRDÃO No 179.502-6*
Recurso Extraordinário no 179.502-6
São Paulo
Relator: Ministro Moreira Alves.
Recorrente: Pedro Martinez de Souza.
Recorrido: Genilson Senche.
Condição de elegibilidade. Cassação de diploma de candidato eleito vereador, porque fora ele condenado, com trânsito em julgado, por crime eleitoral contra a honra, estando em curso a suspensão condicional da pena. Interpretação do art. 15, III, da Constituição Federal.
Em face do disposto no art. 15, III, da Constituição Federal, a suspensão dos direitos políticos se dá ainda quando, com referência ao condenado por sentença criminal transitada em julgado, esteja em curso o período da suspensão condicional da pena.
Recurso extraordinário conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em conhecer do recurso e lhe dar provimento, vencidos os Ministros Maurício Corrêa, Marco Aurélio, Octávio Gallotti e Presidente (Sepúlveda Pertence), que dele não conheciam.
Brasília, 31 de maio de 1995.
Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, presidente – Ministro MOREIRA ALVES, relator.
__________
Publicado no DJ de 8.9.95.
(…)
VOTO
O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Com a superveniência da nova ordem constitucional em 1988, operou-se, no que concerne à privação da cidadania por efeito de condenação penal transitada em julgado, uma substancial transformação. É que, ao contrário do que dispunha o art. 149, § 3o, da revogada Carta Federal de 1969, o vigente estatuto fundamental não mais reclama, para efeito de imediata incidência da norma inscrita em seu art. 15, III, a ulterior edição de lei complementar. Essa relevante circunstância torna lícito afastar a jurisprudência desta Suprema Corte que, sob a égide da anterior Constituição, proclamava que a norma pertinente à suspensão dos direitos políticos, resultante de condenação criminal com trânsito em julgado, por não se revestir de auto-aplicabilidade, pressupunha, no que se refere à privação temporária de direitos políticos, processo próprio então não regulamentado em lei complementar (RTJ 61/581 – RTJ 82/647).
(…)
O vínculo de incongruência normativa entre o art. 15, III, e o art. 55, § 2o, ambos da Constituição, ressaltado no debate desta causa, subsume-se, no caso, ao conceito teórico das antinomias solúveis ou aparentes, na medida em que a alegada situação de antagonismo é facilmente dirimível pela aplicação do critério da especialidade, resolvendo-se o aparente conflito, desse modo – e tal como acentuado pelo relator – em favor da própria independência do exercício, pelo parlamentar federal, de seu ofício legislativo. É que o congressista, enquanto perdurar o seu mandato, só poderá ser deste excepcionalmente privado, em ocorrendo condenação penal transitada em julgado, por efeito exclusivo de deliberação tomada pelo voto secreto e pela maioria absoluta dos membros de sua própria Casa Legislativa.
A norma inscrita no art. 55, § 2o, da Carta Federal, enquanto preceito de direito singular, encerra uma importante garantia constitucional destinada a preservar, salvo deliberação em contrário da própria instituição parlamentar, a intangibilidade do mandato titularizado pelo membro do Congresso Nacional, impedindo, desse modo, que uma decisão emanada de outro poder (o Poder Judiciário) implique, como conseqüência virtual dela emergente, a suspensão dos direitos políticos e a própria perda do mandato parlamentar.
Não se pode perder de perspectiva, na análise da norma inscrita no art. 55, § 2o, da Constituição Federal, que esse preceito acha-se vocacionado a dispensar efetiva tutela ao exercício do mandato parlamentar, inviabilizando qualquer ensaio de ingerência de outro poder na esfera de atuação institucional do Legislativo.
Trata-se de prerrogativa que, instituída em favor dos membros do Congresso Nacional, veio a ser consagrada pela própria Lei Fundamental da República.
O legislador constituinte, ao dispensar esse especial e diferenciado tratamento ao parlamentar da União, certamente teve em consideração a necessidade de atender ao postulado da separação de poderes e de fazer respeitar a independência político-jurídica dos membros do Congresso Nacional.
Essa é, portanto, a ratio subjacente ao preceito consubstanciado no art. 55, § 2o, da Carta Política, que subtrai, por efeito de sua própria autoridade normativa, a nota de imediatidade que, tratando-se de cidadãos comuns, deriva, exclusivamente, da condenação penal transitada em julgado.
Esse sentido da norma constitucional em questão tem sido acentuado, sem maiores disceptações, pela doutrina, cujo magistério proclama que, nessa particular e específica situação (CF, art. 55, VI), a privação dos direitos políticos somente gerará a perda do mandato legislativo, se a instituição parlamentar, em deliberação revestida de natureza constitutiva, assim o decidir em votação secreta e sempre por maioria absoluta, consoante enfatiza José Afonso da Silva:
“Fácil agora é verificar que são casos de cassação de mandato dos congressistas os previstos no art. 55, I, II e VI, que dependem de decisão da Câmara ou do Senado, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa. É que aí se instaura um processo político de apuração das causas que justificam a decretação da perda do mandato, isto é, da cassação deste pela Casa a que pertencer o imputado. Trata-se de decisão constitutiva”.
(Curso de Direito Constitucional positivo, p. 509, 10. ed., 1995, Malheiros.)
Igual entendimento é perfilhado por Manoel Gonçalves Ferreira Filho que, ao interpretar a cláusula constitucional veiculadora de proteção ao mandato parlamentar inscrita no art. 55, § 2o, da Carta Política, observa:
“(…) Aqui é disciplinada a perda do mandato por infração às incompatibilidades, por violação ao decoro e em razão de condenação criminal.
O procedimento previsto reclama provocação da respectiva Mesa, ou de partido político representado no Congresso Nacional.
Importa num contraditório que assegure ao interessado ampla defesa.
Redunda numa decisão a ser tomada pela Casa respectiva, numa votação secreta, que só determina a perda do mandato se a tanto for favorável a maioria absoluta dos integrantes da Câmara.
Desses traços resulta que a Casa julga a conduta do interessado, podendo recusar a perda do mandato se entender essa conduta justificada, no caso concreto, dadas as suas circunstâncias ou peculiaridades”.
(Comentários à Constituição brasileira de 1988, v. 2-57, 1992, Saraiva.)
Vê-se, daí, e ao contrário do que possam sustentar alguns, que inexiste a alegada ocorrência de conflito antinômico entre as regras constitucionais mencionadas.
Sendo assim, e ao acompanhar o voto do em. relator, peço vênia para conhecer e dar provimento ao presente recurso extraordinário.
É o meu voto.
Brasília - A decisão sobre a perda de mandato dos três deputados condenados na Ação Penal 470 deve demorar pelo menos mais um dia para sair. Único ministro que ainda não votou sobre o tema no julgamento — que tem a discussão empatada em 4 a 4 –, o decano Celso de Mello alegou problemas de saúde para não comparecer à sessão desta quarta-feira. Diante da ausência, o presidente da Corte, Joaquim Barbosa, decidiu adiar a sessão do julgamento do mensalão e julgar outras questões.
Na última sessão do julgamento, realizada na segunda-feira passada, Mello se colocou ao lado dos ministros que defenderam que a suspensão dos direitos políticos, decretada pelo STF, tem como decorrência natural a perda do mandato. Suas intervenções na discussão deram a entender que ele acompanharia o presidente da Corte e relator do processo, Joaquim Barbosa, mas Mello não chegou a votar sobre o tema.
Num voto proferido em 1995, contudo, o decano defendeu que apenas o Congresso tinha o direito de cassar o mandato de um parlamentar. Acórdão datado de 31 de maio daquele ano, trazido à tona pelo usuário Stanley Burburinho através do Twitter, revela o voto do ministro no caso de cassação de um vereador.
Eis o que Celso de Mello disse à época: “(…) É que o congressista, enquanto perdurar o seu mandato, só poderá ser deste excepcionalmente privado, em ocorrendo condenação penal transitada em julgado, por efeito exclusivo de deliberação tomada pelo voto secreto e pela maioria absoluta dos membros de sua própria Casa Legislativa”.
Ao longo do julgamento da Ação Penal 470, conhecida como ‘mensalão’, o ministro sempre defendeu que a corte suprema tem o direito de cassar o mandato de um parlamentar condenado com trânsito em julgado – sem mais direito a recursos -, seguindo a tese do relator Joaquim Barbosa.
Quando votar, será que ele irá mudar sua posição? Irá desdizer o que disse há 17 anos?
No Congresso, todos os partidos, incluindo os da oposição, como o PSDB, defendem que a prerrogativa de cassar parlamentares é do Poder Legislativo – e não do Judiciário. Hoje, ao meio-dia, os ministros Ricardo Lewandowski e Carmen Lúcia, foram homenageados com a mais alta comenda do Congresso Nacional.
Leia, abaixo, o voto proferido por Celso de Mello há 17 anos, disponível aqui.
“A norma inscrita no art. 55, § 2o, da Carta Federal, enquanto preceito de direito singular, encerra uma importante garantia constitucional destinada a preservar, salvo deliberação em contrário da própria instituição parlamentar, a intangibilidade do mandato titularizado pelo membro do Congresso Nacional, impedindo, desse modo, que uma decisão emanada de outro poder (o Poder Judiciário) implique, como conseqüência virtual dela emergente, a suspensão dos direitos políticos e a própria perda do mandato parlamentar.”
“(…) É que o congressista, enquanto perdurar o seu mandato, só poderá ser deste excepcionalmente privado, em ocorrendo condenação penal transitada em julgado, por efeito exclusivo de deliberação tomada pelo voto secreto e pela maioria absoluta dos membros de sua própria Casa Legislativa.”
Não se pode perder de perspectiva, na análise da norma inscrita no art. 55, § 2o, da Constituição Federal, que esse preceito acha-se vocacionado a dispensar efetiva tutela ao exercício do mandato parlamentar, inviabilizando qualquer ensaio de ingerência de outro poder na esfera de atuação institucional do Legislativo.”
“Trata-se de prerrogativa que, instituída em favor dos membros do Congresso Nacional, veio a ser consagrada pela própria Lei Fundamental da República.
O legislador constituinte, ao dispensar esse especial e diferenciado tratamento ao parlamentar da União, certamente teve em consideração a necessidade de atender ao postulado da separação de poderes e de fazer respeitar a independência político-jurídica dos membros do Congresso Nacional.”
Volume 13 Número 1 – Janeiro/Março 2002
Acórdãos
Resoluções
ACÓRDÃO No 179.502-6*
Recurso Extraordinário no 179.502-6
São Paulo
Relator: Ministro Moreira Alves.
Recorrente: Pedro Martinez de Souza.
Recorrido: Genilson Senche.
Condição de elegibilidade. Cassação de diploma de candidato eleito vereador, porque fora ele condenado, com trânsito em julgado, por crime eleitoral contra a honra, estando em curso a suspensão condicional da pena. Interpretação do art. 15, III, da Constituição Federal.
Em face do disposto no art. 15, III, da Constituição Federal, a suspensão dos direitos políticos se dá ainda quando, com referência ao condenado por sentença criminal transitada em julgado, esteja em curso o período da suspensão condicional da pena.
Recurso extraordinário conhecido e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em conhecer do recurso e lhe dar provimento, vencidos os Ministros Maurício Corrêa, Marco Aurélio, Octávio Gallotti e Presidente (Sepúlveda Pertence), que dele não conheciam.
Brasília, 31 de maio de 1995.
Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, presidente – Ministro MOREIRA ALVES, relator.
__________
Publicado no DJ de 8.9.95.
(…)
VOTO
O SENHOR MINISTRO CELSO DE MELLO: Com a superveniência da nova ordem constitucional em 1988, operou-se, no que concerne à privação da cidadania por efeito de condenação penal transitada em julgado, uma substancial transformação. É que, ao contrário do que dispunha o art. 149, § 3o, da revogada Carta Federal de 1969, o vigente estatuto fundamental não mais reclama, para efeito de imediata incidência da norma inscrita em seu art. 15, III, a ulterior edição de lei complementar. Essa relevante circunstância torna lícito afastar a jurisprudência desta Suprema Corte que, sob a égide da anterior Constituição, proclamava que a norma pertinente à suspensão dos direitos políticos, resultante de condenação criminal com trânsito em julgado, por não se revestir de auto-aplicabilidade, pressupunha, no que se refere à privação temporária de direitos políticos, processo próprio então não regulamentado em lei complementar (RTJ 61/581 – RTJ 82/647).
(…)
O vínculo de incongruência normativa entre o art. 15, III, e o art. 55, § 2o, ambos da Constituição, ressaltado no debate desta causa, subsume-se, no caso, ao conceito teórico das antinomias solúveis ou aparentes, na medida em que a alegada situação de antagonismo é facilmente dirimível pela aplicação do critério da especialidade, resolvendo-se o aparente conflito, desse modo – e tal como acentuado pelo relator – em favor da própria independência do exercício, pelo parlamentar federal, de seu ofício legislativo. É que o congressista, enquanto perdurar o seu mandato, só poderá ser deste excepcionalmente privado, em ocorrendo condenação penal transitada em julgado, por efeito exclusivo de deliberação tomada pelo voto secreto e pela maioria absoluta dos membros de sua própria Casa Legislativa.
A norma inscrita no art. 55, § 2o, da Carta Federal, enquanto preceito de direito singular, encerra uma importante garantia constitucional destinada a preservar, salvo deliberação em contrário da própria instituição parlamentar, a intangibilidade do mandato titularizado pelo membro do Congresso Nacional, impedindo, desse modo, que uma decisão emanada de outro poder (o Poder Judiciário) implique, como conseqüência virtual dela emergente, a suspensão dos direitos políticos e a própria perda do mandato parlamentar.
Não se pode perder de perspectiva, na análise da norma inscrita no art. 55, § 2o, da Constituição Federal, que esse preceito acha-se vocacionado a dispensar efetiva tutela ao exercício do mandato parlamentar, inviabilizando qualquer ensaio de ingerência de outro poder na esfera de atuação institucional do Legislativo.
Trata-se de prerrogativa que, instituída em favor dos membros do Congresso Nacional, veio a ser consagrada pela própria Lei Fundamental da República.
O legislador constituinte, ao dispensar esse especial e diferenciado tratamento ao parlamentar da União, certamente teve em consideração a necessidade de atender ao postulado da separação de poderes e de fazer respeitar a independência político-jurídica dos membros do Congresso Nacional.
Essa é, portanto, a ratio subjacente ao preceito consubstanciado no art. 55, § 2o, da Carta Política, que subtrai, por efeito de sua própria autoridade normativa, a nota de imediatidade que, tratando-se de cidadãos comuns, deriva, exclusivamente, da condenação penal transitada em julgado.
Esse sentido da norma constitucional em questão tem sido acentuado, sem maiores disceptações, pela doutrina, cujo magistério proclama que, nessa particular e específica situação (CF, art. 55, VI), a privação dos direitos políticos somente gerará a perda do mandato legislativo, se a instituição parlamentar, em deliberação revestida de natureza constitutiva, assim o decidir em votação secreta e sempre por maioria absoluta, consoante enfatiza José Afonso da Silva:
“Fácil agora é verificar que são casos de cassação de mandato dos congressistas os previstos no art. 55, I, II e VI, que dependem de decisão da Câmara ou do Senado, por voto secreto e maioria absoluta, mediante provocação da respectiva Mesa ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa. É que aí se instaura um processo político de apuração das causas que justificam a decretação da perda do mandato, isto é, da cassação deste pela Casa a que pertencer o imputado. Trata-se de decisão constitutiva”.
(Curso de Direito Constitucional positivo, p. 509, 10. ed., 1995, Malheiros.)
Igual entendimento é perfilhado por Manoel Gonçalves Ferreira Filho que, ao interpretar a cláusula constitucional veiculadora de proteção ao mandato parlamentar inscrita no art. 55, § 2o, da Carta Política, observa:
“(…) Aqui é disciplinada a perda do mandato por infração às incompatibilidades, por violação ao decoro e em razão de condenação criminal.
O procedimento previsto reclama provocação da respectiva Mesa, ou de partido político representado no Congresso Nacional.
Importa num contraditório que assegure ao interessado ampla defesa.
Redunda numa decisão a ser tomada pela Casa respectiva, numa votação secreta, que só determina a perda do mandato se a tanto for favorável a maioria absoluta dos integrantes da Câmara.
Desses traços resulta que a Casa julga a conduta do interessado, podendo recusar a perda do mandato se entender essa conduta justificada, no caso concreto, dadas as suas circunstâncias ou peculiaridades”.
(Comentários à Constituição brasileira de 1988, v. 2-57, 1992, Saraiva.)
Vê-se, daí, e ao contrário do que possam sustentar alguns, que inexiste a alegada ocorrência de conflito antinômico entre as regras constitucionais mencionadas.
Sendo assim, e ao acompanhar o voto do em. relator, peço vênia para conhecer e dar provimento ao presente recurso extraordinário.
É o meu voto.
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