JOSÉ DIRCEU
Duas pesquisas recentes sobre a confiança da população nas instituições revelaram aquilo que já poderíamos desconfiar: os brasileiros estão insatisfeitos com a imprensa tradicional
Duas pesquisas recentes sobre a confiança da população nas instituições
revelaram aquilo que já poderíamos desconfiar: os brasileiros estão
insatisfeitos com a imprensa tradicional. Foram dois institutos
diferentes atestando a queda da credibilidade da grande mídia, o que
reforça a necessidade de refletirmos e questionarmos as razões deste
fato.
Segundo pesquisa do Datafolha, o percentual de pessoas que "confiam
muito" na imprensa caiu de 31% para 22%. Já a proporção daqueles que
"confiam um pouco" teve queda leve, de 51% para 50%. Por outro lado, a
taxa daqueles que "não confiam" de jeito nenhum nos jornais subiu de 18%
para 28%, um percentual maior do que os que "confiam muito". Assim,
poderíamos dizer que só um a cada cinco brasileiros confia plenamente na
imprensa. A ampla maioria ou não confia ou confia com reservas.
Comparado a outras instituições, o desempenho da imprensa é pior do que o
da Presidência em todos os níveis, ficando acima apenas de "Congresso" e
"Políticos". Se por um lado a grande imprensa, inclusive o jornal que
faz parte do mesmo grupo do instituto, não omitiu os dados, por outro
sua divulgação não veio acompanhada de comentários e análises que
pudessem dar conta de esclarecer, ou ao menos especular – algo que os
jornalões são pródigos em fazer – as causas de tamanho descrédito.
Acostumados a tratar leitores como ineptos, talvez, tenham acreditado
que a omissão passaria despercebida.
Já o outro levantamento, feito pela Escola de Direito de São Paulo
(FGV), elaborou um ranking das instituições brasileiras mais confiáveis,
o qual mostrou que a imprensa escrita conta com a confiança de 46% dos
entrevistados, portanto, menos da metade. Esse mesmo ranking e pesquisa
apontaram ainda a insatisfação da população com o Judiciário - 64%
avaliam o Judiciário como nada ou pouco honesto e 61% o consideram nada
ou pouco independente – e com a polícia: 63% dos brasileiros estão pouco
ou muito insatisfeitos com a polícia, com percepção negativa maior
entre os mais pobres. Mas, por ora, vamos nos ater à questão da
imprensa.
Apesar de os jornais não se perguntarem, não é difícil entender que a
desconfiança da população em relação aos grandes veículos tradicionais
de comunicação decorre da partidarização dos mesmos, o que fica evidente
nas coberturas políticas editorizalizadas que realizam diuturnamente,
especialmente contra o governo federal, o ex-presidente Lula e o Partido
dos Trabalhadores. As eleições municipais realizadas neste ano e a
cobertura da Ação Penal 470, por exemplo, renderam e continuam rendendo
exemplos acabados de que a grande imprensa, embora não assuma , tem um
lado e o defende, se preciso for, criando ela mesma os fatos.
Investindo-se do direito moral de relatar o que quer que seja,
independentemente do testemunho, subjuga a inteligência de seu público,
inventando declarações, definindo ela mesma a pauta da oposição e
colocando seus espaços – concentrados, é bom que se ressalte – a serviço
da desinformação, quando não da calúnia. Comportando-se como partido
político, se descredencia para a crítica e mostra que sua mediação dos
"fatos" não é confiável.
O funcionamento desta instituição – a mídia –, na forma como tem se dado
no Brasil, abala o pacto implícito de credibilidade que tem com seu
público. Não a neutralidade – já que os meios de comunicação podem, sim,
refletir as preferências daqueles que os sustentam –, mas a farsa da
suposta neutralidade é o que faz desse seu jogo algo tão prejudicial à
democracia e à liberdade de expressão que tanto defende.
Por tudo isso, é preciso debater publicamente os expedientes utilizados
pela grande imprensa e as razões da perda de sua credibilidade. A
sociedade, que já se mostra descontente, certamente tem muito a
esclarecer e a acrescentar a essa discussão.
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