Viomundo
publicado em 19 de dezembro de 2012 às 20:32
Amaury e o primeiro petardo (foto LCA)
por Luiz Carlos Azenha
Na semana seguinte às eleições municipais em que Fernando Haddad
derrotou José Serra em São Paulo, episódios estranhos começaram a
acontecer em torno do premiado repórter Amaury Ribeiro Jr., autor do
livro Privataria Tucana, o best seller que vendeu 150 mil cópias.
Primeiro, ele foi procurado por telefone por um homem de Guarulhos
que prometeu documentos relativos à Operação Parasita, da polícia
paulista, que investigou empresas que cometiam fraudes na área da
saúde. Foi marcada uma reunião, mas a fonte se negou a entrar no local
de trabalho de Amaury. Quando se encontraram pessoalmente, do lado de
fora, a história mudou: o homem ofereceu a Amaury a venda de material
secreto que teria como origem o despachante Dirceu Garcia.
No inquérito da Polícia Federal que apura a quebra de sigilo de
dirigentes do PSDB, aberto durante a campanha eleitoral de 2010, Dirceu é
a única testemunha que acusa Amaury de ter participado da violação.
“Novamente, estão querendo armar contra mim”, diz Amaury. “Mas desta vez
a trama foi toda gravada por câmera de segurança”.
Em seguida, outra situação nebulosa, desta vez supostamente para atingir a Editora Geração Editorial, que publicou o Privataria Tucana.
Um “ganso” da polícia paulista marcou encontro com o diretor de
comunicação, William Novaes, com o objetivo de entregar um dossiê que
incriminaria vários políticos tucanos, entre eles o ex-senador Tasso
Jereissati.
O encontro, do qual Amaury também participou, foi gravado por câmeras
ocultas. Amaury acredita que o objetivo era entregar à editora material
falso que pudesse ser usado para desqualificar seu livro. Diante da
recusa, a mesma suposta “fonte”, que responde a vários processos por
estelionato, ligou para a editora dias depois dizendo que Amaury corria
risco de vida.
“Acredito que eles pretendiam me acusar de obstruir o processo em
andamento, o que poderia até resultar em minha prisão”, avalia o
repórter.
Na mesma semana, narra Amaury, o ex-sub-procurador da República, hoje advogado José Roberto Santoro, que segundo a revista Veja tem ligações com o tucano José Serra, procurou a direção do jornal O Tempo, de Minas Gerais, para intermediar um encontro com a direção do jornal Hoje em Dia, onde Amaury mantém coluna semanal.
O objetivo, segundo o repórter, seria reclamar de uma nota publicada
na coluna de Amaury relativa a uma mineradora de Minas e ao
ex-governador do Espírito Santo, Paulo Hartung. Mas, de acordo com
Amaury, no encontro Santoro não reclamou objetivamente do conteúdo da
coluna. “Ele ficou falando mal de mim, tentando levar à minha demissão e
quando foi advertido pelos diretores do jornal aumentou ainda mais o
tom de voz, como se estivesse numa crise histérica”, diz o repórter. A
coluna continua a ser publicada.
Qual seria a explicação para esta sequência de eventos?
Amaury sustenta: “Está ocorrendo um verdadeiro complô, articulado
provavelmente por tucanos, com apoio de setores da Polícia Federal e do
Ministério Público Federal. O objetivo é derrubar primeiro o Lula e
depois atingir a presidenta Dilma”.
Aqui, é importante lembrar que, na campanha de 2010, Amaury foi
acusado pela mídia de integrar um grupo de inteligência a serviço da
campanha de Dilma Rousseff, aquele que teria violado o sigilo fiscal de
tucanos. O repórter nega: “Estão querendo requentar um assunto velho,
que sumiu das páginas dos jornais logo depois das eleições de 2010. Pelo
jeito vai voltar já pensando em 2014. Talvez estejam pensando em me
usar para chegar na Dilma”.
Amaury estranha que o processo sobre a violação do sigilo de tucanos
tenha voltado a andar uma semana depois das eleições de 2012, quando
foram chamados para depor o jornalista Luiz Lanzetta e o secretário
particular do diretor de redação do Correio Braziliense e do Estado de Minas, Josemar Gimenez.
Lanzetta trabalhou na campanha de Dilma e foi acusado de ser o chefe
do suposto núcleo de inteligência. Quanto a Josemar, Amaury trabalhou em
O Estado de Minas, onde deu sequência à apuração dos fatos que resultaram no livro Privataria Tucana.
O repórter enfatiza sempre que baseou o livro em documentos públicos
obtidos em juntas comerciais e cartórios, na CPI do Banestado e no
Exterior.
Aqui, pausa para uma bomba: segundo Amaury, o presidente do PSDB,
Sergio Guerra, entrou na Justiça de Brasília com uma ação em que pede a
retirada de circulação do livro, alegando que o Privataria Tucana
causa danos morais a caciques do partido. O pedido foi feito durante a
campanha de 2012 mas até hoje a Justiça não se pronunciou.
“Com certeza, o livro provocou muitos estragos nas eleições. Com
certeza continuará provocando. O curioso é que eles nunca respondem
especificamente às acusações ou documentos mostrados no livro”, diz
Amaury.
Ele também estranha que o procurador-geral da República, Roberto
Gurgel, que recebeu dezenas de livros pelos Correios, de leitores
indignados com o conteúdo, não tenha aberto um procedimento para apurar
as denúncias. Amaury entregou parte dos documentos utilizados no Privataria à Polícia Federal, que até hoje não abriu inquérito.
Além disso, apesar de o deputado federal e ex-delegado da PF
Protógenes Queiroz (PCdoB-SP) ter conseguido o número de assinaturas
necessárias à abertura da CPI da Privataria, o presidente da Câmara,
Marco Maia (PT-RS), parece ter sentado sobre o assunto.
NOVO LIVRO
Desde o lançamento do Privataria Tucana, Amaury fala em escrever a sequência. O livro já tem nome: Privataria 2, o Grande Complô.
Viomundo: Amaury, do que tratará o livro?
Amaury: Vou mostrar como funciona o núcleo de inteligência do PSDB,
que domina até hoje setores da Polícia Federal e do Ministério Público
Federal. Eles se movimentam para desarticular o ex-presidente Lula e
futuramente a presidenta Dilma. Quero mostrar porque o PT não reage. No
caso da CPI do Cachoeira, tinha a faca e o queijo na mão para investigar
melhor a relação entre o bicheiro e a revista Veja.
Viomundo: Você tem explicação para o recuo do relator Odair Cunha (PT-MG)?
Amaury: O PT parece abafar todos os casos. Suspeito que é por um
motivo simples. Herdou e deu continuidade a esquemas dos tucanos. No
caso do Odair Cunha, devemos lembrar que o ex-sócio dele, que é da
região de Boa Esperança, em Minas Gerais, se tornou diretor de Furnas e
controla verbas e cargos. Será que tem o rabo preso e os tucanos
descobriram?
Viomundo: E a CPI da Privataria, agora sai?
Amaury: Acho que não sai. Tudo indica que o PT tenha herdado o
esquema promíscuo que os tucanos tinham com as empresas de
telecomunicações. Diante da nova denúncia do Marcos Valério, que diz que
a Brasil Telecom teria doado 7 milhões de reais ao PT, o partido vai
ficar totalmente desmoralizado se a CPI não for aberta. Se não for
aberta, vai ficar bem claro que eles temem que as investigações atinjam o
próprio PT.
Viomundo: O líder do PT na Câmara, Jilmar Tatto, chegou a
convidar o ex-presidente FHC para falar sobre a lista de Furnas. Mas foi
desautorizado pelo líder do PT no Senado, Walter Pinheiro. Afinal, essa
lista de Furnas é falsa, como afirmam os tucanos?
Amaury: O laudo da perícia da Polícia Federal diz que é verdadeira. A
lista mostra doações de campanha feitas por um esquema montado em
Furnas para vários caciques do PSDB, dentre os quais Aécio Neves,
Geraldo Alckmin e José Serra. O caso foi denunciado na Justiça federal
do Rio de Janeiro pela procuradora Andrea Bayão Ferreira, que em seu
relatório diz não ter dúvidas da existência do esquema, que era
abastecido por empresas fornecedoras de Furnas. Mas a Justiça Federal
transferiu o caso para a Justiça estadual do Rio de Janeiro, apesar de
Furnas ser uma estatal federal. É outro caso no qual o procurador Gurgel
não tomou qualquer providência. Será que ele faria o mesmo se fosse um
esquema petista?
Viomundo: E essa história do mensalão tucano, anda?
Amaury: Mais uma vez houve tratamento diferenciado ao PSDB. No caso
do mensalão tucano, houve desmembramento das investigações, encaminhadas
à Justiça de Minas. No STF só serão julgados os reús com foro
privilegiado. Vai ficar mais difícil montar o quebra-cabeças que
facilitaria a condenação, como foi o caso do mensalão petista. As
teorias do Gurgel não teriam vingado se tivesse havido desmembramento
também no mensalão petista. No caso dos tucanos, houve.
Viomundo: Lula nunca falou sobre a Operação Porto Seguro,
aquela que desvendou um esquema de tráfico de influência nas agências
reguladoras e que teria a participação de Rosemary Nogueira. A mídia
explorou o que define como “relações íntimas” entre o ex-presidente
Lula e Rosemary. O que te pareceu o caso?
Amaury: São denúncias sérias, que devem ser apuradas. Mas outra vez a
imprensa, a Polícia Federal e o Ministério Público dão tratamento
desigual a petistas e tucanos. Devemos lembrar que o ex-presidente
Fernando Henrique Cardoso acreditava ter tido um filho com uma
jornalista da Globo e a imprensa não só calou a respeito durante quase
duas décadas como ajudou a abafar o caso. Uma concessionária pública, a
Globo, transferiu a mãe do menino para a Espanha. Conheço bem essa
história. Nunca toquei no assunto por se tratar da vida pessoal. Mas
diante do cinismo da imprensa estou pensando em incluir no livro algumas
revelações sobre como era o esquema para sustentar mãe e filho na
Europa. É jornalistacamente relevante por se tratar de dinheiro de caixa
dois, de financiamento de campanha. Tenho uma testemunha que sabe de
tudo.
Viomundo: Você não poupa nem a PF, que vem trabalhando como nunca?
Amaury: O governo é petista, mas há um núcleo tucano na PF, tanto que
a presidente da República só ficou sabendo da Operação Porto Seguro
depois que ela foi deflagrada. O ministro da Justiça apareceu na TV com
aquela cara de bobo, ficou vendido. Vale lembrar que o início das
investigações se deu pelas mãos do serviço de inteligência do PSDB, que
cooptou testemunhas para levar o caso adiante. Meu livro vai contar os
detalhes de como isso aconteceu. Vai também desnudar as relações
promíscuas entre integrantes do Ministério Público e da Polícia Federal
com o alto tucanato. Como vou sustentar, é mesmo um grande complô.
Viomundo: Mas se a Rosemary foi exonerada no dia seguinte à
operação da PF, Dilma não sabia de nada antecipadamente? Há especulação
de que ela deixou andar justamente para eliminar um núcleo de corrupção
que herdou do governo Lula…
Amaury: Essa é a grande pergunta, até hoje não foi respondida. Pretendo responder no livro.
Viomundo: Já que estamos no campo das especulações, e a boataria sobre a saída de Dilma do PT para o PDT?
Amaury: Seria um suicídio político. No PDT há uma briga de vida e
morte entre a família Brizola e o ex-ministro Carlos Lupi. Só faria
sentido ela sair do PT se o Lula fosse candidato em 2014, o que o atual
quadro político não indica.
Viomundo: E essas gravações que você fez, do pessoal que tentou armar contra você, vão entrar no livro?
Amaury: Com certeza, mas antes vou entregar todo o material à Polícia
Federal e à Justiça. Quero deixar claríssimo que eles escolhem os casos
para investigar e punir. Como eles até agora não tomaram providências,
pretendo entrar com representações na PF e no Ministério Público pedindo
a apuração das denúncias contidas no Privataria Tucana. Quero ver eles sentarem em cima do assunto. Pelo jeito só vai me restar fazer denúncias fora do Brasil por meio da ICIJ, International Consortium of Investigative Journalists,
entidade que tem sede nos Estados Unidos e representação em dezenas de
paises. Fui o primeiro repórter brasileiro a integrar a entidade e estou
pensando em acioná-la se as autoridades brasileiras não tomarem
providências.
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