'Lula é o melhor para governo paulista em 2014', diz marqueteiro João Santana
FERNANDO RODRIGUES
DE BRASÍLIA
DE BRASÍLIA
Mais político e engajado do que nunca esteve, o marqueteiro preferido
pelo PT desde 2006, João Santana, declara que o melhor nome do partido
para disputar o governo de São Paulo é o do ex-presidente Luiz Inácio
Lula da Silva.
"É uma pena o nosso candidato imbatível, Lula, não aceitar nem pensar
nesta ideia de concorrer a governador de São Paulo. Você já imaginou uma
chapa com Lula para governador tendo Gabriel Chalita, do PMDB, como
candidato a vice?", disse Santana, em tom irônico, numa longa entrevista
à Folha.
Para o marqueteiro, a presidente Dilma Rousseff será reeleita em 2014 já
no primeiro turno -- se ocorrer, será algo inédito para um petista em
disputas pelo Planalto.
Sobre o prefeito eleito de São Paulo, Fernando Haddad, faz uma previsão:
"Tem tudo para ser presidente da República, em 2022 ou 2026". Antes
disso, talvez seja a vez de Eduardo Campos, do PSB.
Na conversa, o marqueteiro de 59 anos relatou como foi a calibragem da
estratégia que deu ao PT a Prefeitura de São Paulo neste ano. Não podia
atacar os outros candidatos no início da campanha, pois Haddad "não
tinha musculatura para bater nem para herdar eleitores" de adversários.
Em anos passados, Santana falava com um certo distanciamento do petismo.
Hoje, assume-se mais como um profissional engajado com a causa
partidária. "Por ter muita afinidade com o PT e esse campo político, eu
acho muito difícil, eu diria impossível, fazer uma campanha presidencial
para o PSDB", diz. Fica à vontade para criticar as outras legendas.
"Há um processo de desgaste e de deterioração política do PSDB. Viraram
uma versão anacrônica da UDN: denuncistas e falsos moralistas. Pode
acontecer ao PSDB o que aconteceu ao DEM. O DEM está sendo engolido pelo
PSD, de [Gilberto] Kassab. Se não se renovar, o PSDB pode ser engolido
pelo PSB, de Eduardo Campos."
Responsável pelo marketing na reeleição de Luiz Inácio Lula da Silva (em
2006) e na eleição de Dilma (2010), Santana trata a oposição com um
certo desdém: "Se a eleição fosse hoje, novembro de 2012, Dilma ganharia
no primeiro turno. Se fossem candidatos de oposição Aécio Neves e
Eduardo Campos não teriam, somados, 10% dos votos".
É cético até com o movimento que na internet fala em lançar o atual
presidente do STF, Joaquim Barbosa, para o Planalto. "É uma pessoa
inteligente e saberá tomar a decisão certa. Caso se candidatasse [a
presidente] poderia ter um final de carreira melancólico. Não se
elegeria, faria uma campanha ruim e teria uma votação pouco expressiva".
A propósito do STF e do julgamento do mensalão, diz se sentir "no dever"
de fazer uma observação aos ministros da mais alta Corte de Justiça do
Brasil: "O julgamento do mensalão levou ao paroxismo a teatralização de
um dos Poderes da República. O excesso midiático intoxica. É um veneno.
Se os ministros não se precaverem, eles podem ser vítimas desse excesso
midiático no futuro. E com prejuízos à instituição. O ego humano é um
monstro perigoso, incontrolável. O mensalão é o maior reality show da
história jurídica não do Brasil, mas talvez do planeta".
*
A seguir, trechos da entrevista concedida por Santana em 19 de novembro, no apartamento onde vive em Salvador:
Folha - Quais campanhas fez em 2012?
João Santana - Eu e a minha equipe tivemos a sorte de fazer em
2012 algo inédito no marketing político internacional: coordenar, num
mesmo ano, três campanhas presidenciais vitoriosas. Conseguimos ajudar a
virar uma eleição dificílima na República Dominicana, onde Danilo
Medina ganhou depois de ter estado 30 pontos atrás de seu oponente.
Participamos da vitória de Chávez, que enfrentou alguns problemas
conjunturais, além de uma pressão internacional desmesurada E ajudamos
na vitória do presidente José Eduardo dos Santos, em Angola, que teve
75% dos votos. Mas de tudo o que me deu mais alegria foi a vitória de
Fernando Haddad na eleição para prefeito de São Paulo. Tanto pelo
desafio que significou, como pelo que a vitória de um líder jovem, da
qualidade de Haddad, vai significar para S. Paulo e para o Brasil. Mas
como nem tudo é alegria, perdemos a eleição de Patrus Ananias para
prefeito de Belo Horizonte. Ou seja, fizemos cinco campanhas e ganhamos
quatro neste ano.
Essas campanhas todas têm candidatos de um campo político muito
definido. O sr. teria dificuldade para fazer uma campanha para, digamos,
um candidato do PSDB a presidente do Brasil?
Do ponto de vista técnico, não. Mas do ponto de vista
político-emocional, sim. No Brasil está acontecendo, aos poucos, algo
que no mercado internacional já era: uma espécie de especialização por
partidos. Os partidos têm os seus próprios consultores políticos e
marqueteiros. Por ter muita afinidade com o PT e esse campo político, eu
acho muito difícil, eu diria impossível, fazer uma campanha
presidencial para o PSDB.
Mas e no plano internacional?
Por ter trabalhado majoritariamente para o PT, e a partir das conexões
que se estabelecem entre campos políticos afins, eu comecei a ser
convidado para fazer campanhas para partidos políticos de esquerda na
América Latina e na África. Meu nome acabou ficando muito associado,
sobretudo na imprensa internacional, a esse tipo de consultoria.
De quantas campanhas presidenciais o sr. já participou? É correta a
informação de que também participou da eleição de Ollanta Humala, no
Peru?
É uma informação equivocada. Fui convidado por Humala, fui ao Peru na
pré-campanha, fiz um estudo preliminar, mas não pude nem quis fazer a
campanha dele. Ela foi feita por Valdemir Garreta e Luis Favre. Eu e
minha equipe já vencemos seis eleições presidenciais : a reeleição de
Lula, a eleição de Dilma, Maurício Funes, em El Salvador, Danilo Medina,
na República Dominicana, José Eduardo dos Santos, em Angola, Hugo
Chávez, na Venezuela. Há cerca de 15 anos, naquela época ainda
trabalhando com Duda Mendonça, perdemos a campanha presidencial de
Eduardo Duhalde, na Argentina.
Em 2008, o sr. perdeu na disputa para a Prefeitura de São Paulo com
Marta Suplicy. Agora, com Fernando Haddad, ganhou. Quais são as
semelhanças e as diferenças entre as duas campanhas?
Em 2008, Marta era oposição e havia um sentimento de continuidade. Este
ano, ao contrário, havia um sentimento de mudança e renovação. Outra
coisa: Marta sempre foi a melhor candidata do PT para um primeiro turno.
E a pior para um segundo turno. Já Fernando Haddad era o pior candidato
que o PT tinha para um primeiro turno e o melhor para um segundo turno.
Em 2008, teria sido possível reverter o quadro para que Marta não perdesse?
Em tese, sempre é possível. Para isso, precisaríamos ter conseguido
amenizar o desejo de continuidade e, também, a rejeição à candidata. E
quem sabe se ela tivesse um marqueteiro melhor... E não eu [risos].
Houve um comercial em 2008 que foi considerado preconceituoso contra
Gilberto Kassab, perguntando se ele era casado e se tinha filhos. O que
se passou?
Foi um erro técnico, não uma agressão moral. Não havia, sinceramente,
intenção de agredir, como a imprensa interpretou. Mas sei que tem coisas
na vida que se cristalizam e só o tempo pode desfazer. Ou não. O fato é
o seguinte: existia uma insegurança no eleitor por não conhecer bem
Kassab. O comercial alinhou uma série de perguntas que surgiam nos
grupos de pesquisa qualitativa. Depois de pronto, testamos em grupos de
pessoas de renda C e D. Nos testes, o comercial se mostrou eficaz e sem
duplo sentido.
Mas o sr. não acha que houve, no mínimo, uma falha grave?
Eu falhei, como comunicador, porque não podia ter produzido um material
capaz de causar um efeito imprevisto. Nunca havia acontecido isso comigo
e nem voltou a acontecer.
Felizmente não houve danos à campanha, pois não se registrou a mínima queda da candidata, por causa do comercial. Já tive oportunidade de pedir desculpas públicas ao prefeito e vou lhe revelar um fato.
Felizmente não houve danos à campanha, pois não se registrou a mínima queda da candidata, por causa do comercial. Já tive oportunidade de pedir desculpas públicas ao prefeito e vou lhe revelar um fato.
Qual?
No início deste ano, quando ainda se cogitava que o prefeito pudesse
apoiar Haddad, eu atendi um telefonema, na República Dominicana, e era
Kassab. Ele pediu uma conversa. Marcamos para alguns dias depois, e eu
abri o encontro dizendo que não poderia começar qualquer tipo de
conversa com ele sem me referir ao tema. Senti surpresa nele por eu
provocar o assunto. E ele teve uma reação muito elegante: disse que
admirava meu trabalho, acreditava na minha versão e que estava tudo
superado.
Neste ano, Marta Suplicy queria ter sido a candidata do PT em São
Paulo. Mas foi preterida por Lula, que indicou Fernando Haddad. Se o
nome do PT tivesse sido Marta ela teria vencido?
Poderia vencer, mas teria de ser uma estratégia completamente diferente
da de Haddad. E com mais dificuldades. Acho que já respondi isso quando
disse que Haddad era o pior candidato para um primeiro turno e o melhor
para um segundo turno. E que Marta, apesar de seus méritos, era
exatamente o contrário. Como até hoje tem sido impossível ganhar uma
eleição na cidade de São Paulo num único turno, Haddad tinha mais
chance. Acho que a escolha foi correta.
Houve um momento em que muitos petistas acharam que Fernando Haddad não tinha mais chance?
Desde o início, eu acreditava profundamente na vitória de Haddad. Teve
um momento em que acho que só eu continuei acreditando. Havia dúvidas,
até no próprio Haddad, o que é natural. Uma campanha é vitoriosa quando
reúne quatro características-chave: 1) ter um bom candidato com boas
propostas; 2) ter um campo político forte, com bons apoiadores; 3) ter
uma boa estrutura de comunicação; 4) estar afinado com a conjuntura.
Fernando Haddad tinha essas quatro características. Por essa razão,
venceu. É possível ganhar com apenas duas ou três dessas quatro. Mas não
ganha jamais com uma só ou sem nenhuma.
Celso Russomanno tinha quantas dessas características?
Só uma delas, que era estar afinado com a conjuntura. Ele também
encarnava o novo e o desejo de mudança. Espelhou isso durante um certo
período, mas não tinha nenhuma das outras três características.
Mas por que ele liderou as pesquisas durante boa parte da campanha?
Era quase que uma morte anunciada. Tínhamos um grande desafio: encontrar
a arma certa e a hora certa de atacar Russomanno. Isso inquietava todo
mundo. Uma coisa que nós técnicos aprendemos é que o tempo psicológico
de uma eleição é muito diferente do tempo cotidiano das pessoas. Ainda
mais numa eleição concentrada como no modelo brasileiro. No marketing
político é importante ter sangue frio para conviver bem com o tempo de
decisão do eleitor. O eleitor não é um ser humano normal. Seu relógio
interno é diferente. A ansiedade dos políticos não convive bem com isso.
Mas e se Russomanno não tivesse apresentado a proposta de bilhete único com tarifa cobrada conforme a distância percorrida?
Foi a descoberta da arma certa. E não fui eu que descobri esta arma, foi
o próprio Haddad. Ela estava escondida, sumida dentro de um arremedo de
programa de governo. O que fizemos foi dar o formato. Mas levamos muito
dias de testes e simulações até chegarmos ao ponto ideal. Aí, também
era a hora certa.
Por que não fez logo de início a desconstrução de Russomanno?
Não podíamos fazer fora do tempo. O grande laço que envolvia Russomanno
com o seu eleitor era afetivo, emocional. Se nós partíssemos para uma
agressão de natureza moral ou de desconstrução genérica, dizendo que ele
era incompetente, haveria reação forte. O eleitor ia se sentir também
agredido.
E qual o problema?
Naquele momento Fernando Haddad não era conhecido, não tinha musculatura
para bater nem para herdar os eleitores que pudessem deixar Russomanno.
Se houvesse votos se despregando de Russomanno, iriam beneficiar
primeiro a Gabriel Chalita, do PMDB. Ou o Serra. E nós teríamos muita
dificuldade de recuperar esses votos. Quando o voto pula de um lugar
para outro, tende a se prender mais nessa segunda parada.
E como o sr. calibrou a estratégia para saber o momento exato de desconstruir Russomanno?
Foi uma decisão conjunta. Mas prevaleceu meu argumento de que era
preciso, primeiro, aumentar o nível de conhecimento de Haddad, em quatro
níveis diferentes: que ele era um bom candidato, que tinha boas
propostas, que era o nome de Lula e de Dilma e que era do PT.
Só depois de ampliar esse nível de conhecimento é que seria possível tentar atrair os eleitores de Russomanno?
Claro. É aí que foi preciso ter sangue frio. Só uma coisa me angustiava:
eu já havia descoberto, de maneira empírica, nas eleições
presidenciais, que é mais fácil fazer chegar com rapidez informações
eleitorais em determinadas localidades pequenas no interior do Nordeste
do que na extrema periferia da cidade de São Paulo.
Como se dá esse fenômeno?
As pessoas estão menos expostas à propaganda eleitoral quando moram nas
extremidades da cidade de São Paulo. Isso ocorre por causa da
dificuldade de locomoção e da hora que chegam em casa. Ficam menos
expostas aos comerciais, e em especial, ao horário eleitoral. É
diferente com as pessoas que moram nas pequenas e médias cidades no
Norte e no Nordeste. Lá, elas dormem cedo e quase todos assistem
religiosamente a propaganda política. Essa coisa me dava frio na
barriga. Por isso regionalizamos, mais que ninguém, nossas propostas no
rádio, na TV e em outros meios. Usamos panfletos, telemarketing, redes
sociais e o trabalho muito bom de cabos eleitorais.
E José Serra? Quais das quatros características necessárias para vencer ele tinha?
Só uma. A comunicação dele era boa. O resto era ruim. Em termos
eleitorais, Serra era um mau candidato a prefeito de São Paulo, e,
paradoxalmente, era o melhor candidato do seu campo político. Essa é uma
equação fatal, pois aponta fragilidade nos dois polos mais importantes
de uma eleição.
O PSDB não poderia ter buscado um "Fernando Haddad"?
Poderia, mas entre os nomes disponíveis que o PSDB tinha, não havia
nenhum com a característica de Haddad. A isso se juntou a má avaliação
do governo Kassab -- embora esse não tenha sido o ponto mais negativo de
Serra.
Qual foi?
Foi imaginar que o trauma da renúncia dele já estava superado. Não
estava. Foi a renúncia à Prefeitura de São Paulo em 2006 que derrotou o
Serra.
Mas como foi possível esse tema ter voltado com essa intensidade se
Serra já havia feito campanhas para o governo de São Paulo e para
presidente?
O próprio Serra repetia isso na campanha. Que havia deixado a
Prefeitura, mas os eleitores haviam dado a ele o governo de São Paulo.
Mas há uma questão muito simples... No hipotálamo, na nossa cabeça,
existem algumas salas temáticas de tortura. Quando você cai ali dentro,
não tem salvação. Numa analogia visceral, você pode até perdoar alguém
que matou um ente querido seu, mas dificilmente perdoará se tiver de
conceder o perdão na sala ou no quarto em que aconteceu o crime. Ou
depois de ter visto cenas do crime.
Ou seja, ao disputar a Prefeitura, Serra reavivou todo o episódio da renúncia de forma mais intensa?
Exato. Uma coisa é ser candidato a governador ou a presidente. O
estímulo do voto para cada um desses cargos é diferente. O processo
mental do voto é muito sofisticado, sutil, complexo, às vezes
misterioso. Serra quis voltar para o mesmo lugar que um dia havia
deixado. Justamente no momento em que as pessoas tinham uma percepção de
que Kassab, o sucessor indicado por ele, tinha fracassado. Criou-se uma
memória horrível. Esse foi o fator principal da derrota de Serra. Se
ele estivesse se candidatando a senador, poderia ganhar. A governador,
quem sabe. Mas a prefeito, não. Jamais. E a nossa campanha potencializou
essa lembrança.
Ele não teria como se vacinar contra essa estratégia usada pelo sr.?
É muito difícil. Essa lembrança da renúncia dele torturava as pessoas.
Agora, esse desgaste também se dá no plano político geral. E não atinge
só a ele, mas também ao PSDB.
Não foi também um pouco de preconceito geracional?
Acho que não. Esse aspecto geracional não se aplica de maneira linear.
Essa coisa do "novo" foi mal interpretada. Algumas pessoas imaginaram
que o novo do Haddad significasse só a idade dele. A coisa mais nova que
existe na política brasileira é Dilma Rousseff, que é um brotinho de 64
anos.
Sua tese é que há um desgaste do PSDB que atrapalhou também Serra?
Há um processo de desgaste e de deterioração política do PSDB. O pior
para um partido não é estar fora do poder, mas é não saber ser oposição.
Os tucanos não souberam ser oposição. Em vez de aumentar o vigor
propositivo ou apresentar uma alternativa ao modelo de desenvolvimento,
viraram uma versão anacrônica da UDN: denuncistas e falso moralistas. E
também não fez uma renovação de quadros.
E como isso pode evoluir?
Pode acontecer ao PSDB o que aconteceu ao DEM. O DEM está sendo engolido
pelo PSD, de Kassab. Se não se renovar, o PSDB pode ser engolido pelo
PSB, de Eduardo Campos. E não digo isso com alegria, porque acho ruim
para o Brasil. A democracia brasileira, diferentemente de outras, pode
ter seu sistema de poder apoiado em quatro ou cinco grandes partidos,
competitivos, capazes de produzir rotatividade no governo e variação de
modelos.
O PSB para canibalizar o PSDB, nessa sua hipótese, teria de sair do campo governista?
Ou não. É tudo um exercício de raciocínio sobre o que está acontecendo. O
DEM é um exemplo. Estava ferido de morte quando foi tomado pelo PSD.
Mas e as vitórias regionais do DEM, como a conquista da prefeitura de Salvador?
Ganhar Salvador não faz a menor diferença para o DEM. Eu hoje imagino
que é mais lógico que o prefeito eleito de Salvador, ACM Neto, saia do
DEM do que queira ou tenha força para ressuscitar o partido. O DEM vive
um ciclo terminal.
O que o PSDB deveria fazer para estancar esse processo de deterioração que o sr. descreve?
Primeiro, ficar mais perto do povo. Não conseguiu até hoje perder o
sotaque de alta classe média paulistana. Não por acaso, em qualquer
pesquisa o PSDB aparece como o partido dos ricos. Por quê? Porque nunca
dialogou verdadeiramente com o povo. Seja por descuido, desdém ou porque
quando esteve no poder não desenvolveu uma prática social profunda.
E quando se fala nas semelhanças entre PT e PSDB?
Esta é uma grande balela. É o contrário. O PT é um partido de extração
popular fortíssima. Tem um líder como o Lula. Tem uma opção clara e
concreta pelos mais pobres. Tem uma das políticas sociais mais avançadas
do mundo. O PSDB não tem nada disso.
Onde se encaixa o PSD?
A definição de Kassab de que o PSD não é um partido de esquerda nem de
direita nem de centro pode funcionar como um artifício, um módulo de
transição. Mas não resiste ao tempo nem ao choque com o real. Permite,
apenas, que no início ele faça alianças à direita e à esquerda. De uma
maneira muito mais ampla e inteligente do que o PSDB conseguiu fazer. O
PSDB conseguiu só alianças com a direita de um tempo para cá.
E o PPS, que sempre está com os tucanos?
O PPS é muito pequeno e é a exceção que confirma a regra.
Mas o PSD não pode ficar muito tempo nesse equilíbrio improvável?
É um espaço precário e temporário. Depois terá de ir, para um lado ou
para o outro. Será forçado a uma definição. E a definição dele é ir para
o espectro da direita.
O sr. sempre reclama das decisões da Justiça Eleitoral. Mas o problema são os juízes ou a Lei Eleitoral?
A legislação eleitoral tem muitos anacronismos. Um dos mais sérios,e
pouco discutido, é o poder de um juiz, de forma autocrática, censurar um
candidato. Poder tirar, sumariamente, do ar um comercial que ele julgue
ofensivo. Poder, também, conceder ou não direito de resposta, às vezes,
com alta carga de subjetividade. Levado ao extremo este é um dos
últimos resquícios da censura no Brasil, um cerceamento a liberdade de
expressão. Trata-se da censura ao pensamento político de uma pessoa que
pode, em poucos dias, se tornar presidente, ou governador de estado. Não
é um poder exagerado?
Aí eu faço uma sugestão. Escolas de direito poderiam pedir a todas as
campanhas os seus arquivos com os pedidos de direito de resposta, os
comerciais que foram tirados do ar, as defesas que foram feitas, as
sentenças, quando foi concedido o direito de resposta. Há muita coisa
polêmica que vai surgir. Mas é necessário levantar tudo para que o
debate seja feito em termos objetivos. Outro aspecto é o tempo que se
gasta nesses processos. Muitas vezes um juiz dá uma decisão provisória e
há um atraso enorme até a decisão final.
O PT se aliou ao PP, de Paulo Maluf, para ter mais tempo de TV na disputa paulistana. Foi uma ação correta?
Foi uma decisão acertada a aliança com o PP de Maluf, que no resultado
final ajudou mais do que prejudicou. Pode nem mesmo ter ganho os votos
malufistas, mas funcionou no geral, pois nos ajudou naquilo que mais
precisávamos que era tornar o candidato mais conhecido. Nós não ganhamos
apenas dois minutos a mais. Deixamos de perder quatro, pois se não
pegássemos, o Serra iria pegar.
E o mensalão, que impacto teve?
Teve um efeito circunstancial. Alguns comerciais que tentavam juntar o
Fernando Haddad ao caso. A gente sentia que por umas 48 horas havia um
efeito, que depois evaporava. Era como uma lesão no atleta de futebol.
Às vezes, a perna fica roxa, mas não significa que quebrou ou que a
inutilizou.
Por que o efeito foi circunstancial se o partido de Fernando Haddad
esteve no centro do episódio? O eleitor não dá atenção para esse tipo de
desvio moral?
Por uma razão muito simples: Fernando Haddad não estava, de nenhuma
maneira, envolvido no episódio. E durante toda sua vida não sofreu
nenhuma denúncia por conduta irregular. Serra, inclusive, engoliu isto a
seco num debate.
O sr. está dizendo que toda a exposição do mensalão na TV se resumiu a esse impacto circunstancial?
Sim. Mas eu gostaria de fazer uma observação adicional. Nós todos somos
atores políticos e sociais. O teatro, os ritos são indissociáveis da
política e, por consequência, da Justiça, que é um ente político. Os
meios modernos de comunicação levaram esta teatralização ao paroxismo. E
o julgamento do mensalão levou ao paroxismo a teatralização de um dos
Poderes da República. O que isso trouxe de bom ou de ruim, o tempo dirá.
Mas sem querer dar conselhos, é bom lembrar uma coisa para os ministros
membros do STF: o excesso midiático intoxica. É um veneno. Se os
ministros não se precaverem, eles podem ser vítimas desse excesso
midiático no futuro. E com prejuízos à instituição.
Como?
Mesmo sendo transparente, uma Corte deve ter um certo recato. Você já
imaginou se todos os governos transmitissem ao vivo as suas reuniões
ministeriais? Se houvesse uma câmera ao vivo transmitindo de dentro dos
gabinetes do presidente e dos ministros? Você acha que essa
transparência seria benéfica ou maléfica? O governo seria mais
democrático por se expor dessa forma? Ou um governo mais fragilizado?
Mas o sr. acha que deve ser interrompida a transmissão das sessões do STF pela TV?
Não estou dizendo isso. Mas apenas que os ministros, como atores, tenham
a dimensão do que isso significa. Administrar a Justiça com
transparência não significa, necessariamente, fazer um reality show.
Qualquer pessoa precisa se precaver com a atuação. Até um cirurgião,
quando filmado, pode ter interferência na sua atuação.
Como podem sofrer os ministros do STF pela exposição extremada?
O ego humano é um monstro perigoso, incontrolável. Toda vez que você é
levado a uma superexposição sua tendência é sempre sobreatuar. Essa é a
questão central.
O sr. está comparando o julgamento do mensalão a um reality show?
O mensalão é o maior reality show da história jurídica não do Brasil,
mas talvez do planeta. Não existe uma Corte Suprema no mundo que tenha
transmissão ao vivo. Os ministros estão preparados para julgar. Mas
estão preparados para essa superexposição? Aliás, qual é o ser humano
que está preparado para uma situação dessas? Eu costumo dizer aos
candidatos em campanha: tome cuidado quando você está ali, sob aquela
luz, porque você está exposto. Tome cuidado com a sua cabeça e sobre
como reagir com o sucesso. Se você não reagir bem à exposição midiática e
ao sucesso, você pode trazer problemas para você, para sua família e
para a instituição que você representa.
O julgamento do mensalão teria um resultado diferente se não tivesse transmissão ao vivo pela TV?
Às vezes, eu acho que sim. E acredito que a transmissão ao vivo
potencializou os efeitos da pressão feita pela mídia antes do
julgamento. Não estou dizendo que seja só ruim, só negativo. Mas é um
fato que precisa ser conhecido e eu como especialista em comunicação me
sinto no dever de dizer.
Numa declaração recente, o publicitário Washington Olivetto disse que
só gosta "de anunciar coisas que as pessoas possam devolver se não
gostarem". Disse também: "Minha ideologia criativa, que se baseia na
verdade bem contada, não combina com o marketing político". O sr.
concorda?
A comunicação e o marketing político causam um certo estranhamento e uma
má compreensão entre os próprios políticos e entre os profissionais de
comunicação. Não estou me referindo especificamente a Olivetto, mas
alguns, por baixo entendimento da política, sofrem de um falso conflito
moral -- além de uma pretensa superioridade estética. Muitos acham que é
mais nobre fazer propaganda para bancos, operadoras de cartões de
crédito, plano de saúde, telefônicas (que atendem mal e até escorcham os
seu clientes), do que para políticos. É uma questão de ponto de vista.
E sobre trabalhar com produtos que possam ser devolvidos?
Um político não é um produto. O político é um líder, um condutor, é um
gestor. Se fosse para fazer uma analogia com o mercado, mesmo que
inapropriada, seria melhor compará-lo com um investimento. Um título de
prazo fixo que a pessoa compra e depois pode recomprar ou não. E a
democracia é o modelo que tem o melhor e mais eficiente sistema de
devolução: o voto. Ele funciona melhor do que qualquer Procon da vida.
É purismo achar que a política possa prescindir do marketing?
É mais que purismo. É burrice. É um equívoco pensar assim, porque a
política nunca prescindiu de técnicas de persuasão desde a sua origem,
no tempo das cavernas.
Não seria melhor colocar os políticos na TV, ao vivo, um questionando o outro e sem marketing?
E se isso gerasse um tédio, um desencanto, um desinteresse ainda maior pela politica?
Ainda assim, não seria melhor que os debates fossem menos amarrados pelo marketing?
Os debates podem ser melhorados. Mas não pense que o marketing deixará
de influenciar um debate com menos regras. No período anterior a esse
encontro haverá uma fase grande de treinamento. Será feito por pessoas
da política e do marketing. As técnicas de debate, de retórica e mesmo
de expressão facial terão influência do marketing. Haverá um trabalho
maior de "coaching" no bastidor, de linha argumentativa, de construção
de discurso. Isso é feito pelo marketing. Como foi feito a vida inteira
pelos consultores, conselheiros das monarquias e das antigas repúblicas.
Querem vender o marketing como um mal dos tempos modernos. Não é. É um
comportamento que vem de séculos. Ele só vai se aperfeiçoando ou se
instrumentalizando a partir da infraestrutura física que se tem, dos
meios de comunicação, da forma de fazer política.
Por que não foi realizado o debate na internet na eleição paulistana?
Primeiro, por problemas de agenda. Segundo, por uma relação
custo-benefício: a influência da internet é ainda muito restrita nas
campanhas eleitorais no Brasil.
Quando a internet será influente?
Não sei. Mas vai ocorrer. A internet vai modificar a comunicação
política como a própria forma de fazer política. Mas não há ainda essa
influência. Eu já errei muito em palpites sobre a internet na política.
Eu achava que em São Paulo neste ano haveria algo. Mas não ocorreu. Pode
ser que aumente um pouco a influência na eleição presidencial. Mas não
será decisiva ainda por muitos anos. A televisão continuará sendo
preponderante. A arrecadação de fundos para campanha via web vai demorar
no mínimo uma década, e olhe lá.
A internet é eficaz para propaganda negativa?
Um pouco, mas criou-se uma lenda a respeito. A TV ainda é muito mais eficaz também nesse campo da propaganda negativa.
E o uso de redes sociais?
Ainda é limitado na política. Eu quero encarar esse desafio. Estou
montando uma empresa de internet para comunicação política. Ainda estou
amadurecendo, mas será algo para trabalhar com partidos e candidatos,
mas com uma proposta de comunicação na internet de mais longo prazo.
Os prazos rígidos para fazer campanha impedem esse uso mais vigoroso e de longo prazo da internet na política?
Sim e é preciso acabar com essa hipocrisia de que uma pessoa só é
candidata a partir de determinada data. Isso não existe numa democracia.
Quem mais perdeu e mais ganhou nas eleições municipais de 2012?
O PT saiu fortemente fortalecido. O PSB ganhou, mas não na dimensão que
se fala. O PMDB continua o maior. O PSDB se esvaziou um pouco. O fato é
que não houve grandes mudanças do ponto de vista percentual e do
equilíbrio político do ponto de vista quantitativo, não do qualitativo.
Mas o PT sofreu um revés no Nordeste...
O Nordeste nunca foi petista de fato. O Nordeste foi lulista e vai
continuar sendo por muito e muito tempo. E são circunstâncias muito
específicas.
Foi então uma derrota de Lula?
Não. São condições muito específicas. A única eleição na qual Lula interferiu de fato foi São Paulo. Lá, ele ganhou bonito.
Ele interferiu diretamente em Campinas...
Desculpe, em Campinas também. E produziu um efeito sensacional. O Márcio
Pochmann ter ido para o segundo turno foi algo de muita relevância.
O lulismo foi muito usado nesta campanha, com o ex-presidente Lula
gravando comerciais para muitos candidatos e participando de alguns
comícios. Mas o resultado no Nordeste e em Manaus não foi o esperado. A
presidente Dilma também foi a Salvador e a Manaus e o impacto não foi
sentido. Por quê?
O voto municipal passa, quase exclusivamente, pelo que chamamos de
"demandas de vizinhanças". Lula e Dilma sempre souberam disso. Inclusive
eram mais céticos do que a maioria dos seus companheiros com a relação à
magia de seus apoios. Curiosamente, esta sinergia é mais decisiva
quando o candidato é muito desconhecido, como ocorreu com os apoios de
Lula e Dilma a Haddad e Pochmann, em São Paulo e em Campinas, e de
Eduardo Campos a Geraldo Julio, em Recife. Em Manaus e Salvador, a
realidade era completamente diferente.
Por que a presidente Dilma ainda tem uma marca difusa no governo, depois de dois anos no comando?
Você escreveu isso recentemente, mas discordo. Primeiro eu gostaria de
lembrar que análises sobre a falta de marca do governo eram recorrentes
nesse mesmo período para o presidente Lula. Com dois anos de governo de
Lula, os programas sociais já se ampliavam e começava a ocorrer o maior
movimento de ascensão da classes menos favorecidas da nossa história.
Por que em 2006 muitos se surpreenderam com a reeleição de Lula? Porque a
maior parte da mídia não estava percebendo o que se passava.
Da mesma forma, hoje, é um grande equívoco dizer que a presidente não tem ou não está firmando uma marca.
Da mesma forma, hoje, é um grande equívoco dizer que a presidente não tem ou não está firmando uma marca.
Qual será a marca de Dilma?
Já está sendo. Ela está firmando a imagem de grande consolidadora das
políticas sociais, de ampliadora dos direitos da classe média, de
reformadora moral e modernizadora do país. Está se formando a imagem de
uma mulher firme, honesta, que não tem medo de tomar medidas duras. Uma
mulher que não se deixa mandar. Que sabe fazer parcerias e alianças com
setores importantes, especialmente com Lula. Uma presidenta que enfrenta
uma das maiores crises da economia internacional sem titubear. Uma
mulher de raça. Que enfrenta os bancos para abaixar os juros, as
empresas de energia para abaixar a tarifa elétrica. Isso eu não estou
inventando: estou relatando a leitura de estudos profundos de opinião.
Que estudos são esses?
Pesquisas quantitativas e qualitativas. Grupos de painéis setoriais. Por isso tudo ela vai se reeleger, entre outros motivos.
O sr. afirmou que Dilma ocuparia metaforicamente a cadeira da rainha no imaginário do brasileiro. Isso está se passando?
O que eu falei não era profecia. Não sou profeta. Era uma imagem
figurada. Uma metáfora que está se cumprindo simbolicamente. Grandes
camadas da população têm um respeito, uma admiração e um carinho tão
sutil por Dilma que chega até a ser de uma forma majestática. É
diferente daquele amor quase carnal, elétrico, vulcânico que têm por
Lula.
Como se manifesta esse amor?
É uma forma de amor que se manifesta com respeito, reverência. Entre as
mulheres, então, é uma coisa incrível. Elas ainda estão impactadas pela
surpresa de uma mulher estar conduzindo o país da forma que ela está
conduz. Nas mulheres do povo, nas camadas C e D, é recorrente
observações do tipo "quem imaginava que uma mulher seria capaz de
conduzir o país de forma tão firme e competente, hem?".
Com a ascensão de muitos brasileiros para a classe média não mudam os patamares? As demandas?
As mudanças sóciodemográficas alteram algumas demandas, mas as questões
centrais permanecem: melhorar a vida, mais oportunidade, mais serviços
públicos de qualidade, emprego e segurança. Dilma está muito atenta a
isso.
Mas em 2014 o eleitor pode dizer: o PT está no poder há 12 anos e muita coisa ainda está ruim...
Se for assim, o PT também poderá dizer que está no poder há 12 anos e
tudo o que está bom é por causa de sua administração. E vai dizer,
ainda, o que pode melhorar. E como há um desejo de continuidade forte, e
nenhum sinal de fadiga de material, o PT sai vencedor nesse debate.
Por quê?
Primeiro, a imagem de Dilma. Ela está com uma imagem boa e num patamar
raro. E qualitativamente vai melhorar ainda mais. Segundo, o grau de
afinidade dela com o Lula. Terceiro, depois que passou a haver reeleição
para presidente, o brasileiro tende a pensar num ciclo de oito anos
para presidente. E, por último, a oposição não tem candidatos fortes nem
vai ter tempo nem circunstância para construir um projeto competitivo.
E a economia?
Terá um papel importante, porém, não o único. Na hipótese que me parece
completamente improvável de a economia ter sérios abalos, a população
verá Dilma com muito mais capacidade de controlar o timão num momento de
crise do que alguém da oposição.
Como FHC em 1998?
O que eu quero dizer é que com a economia em bom estado, Dilma está
fortalecida. Com uma crise, que não virá, ela também estaria. Porque com
o cardápio de candidatos que está sendo oferecido, as pessoas vão
confiar muito mais nela. Isso não falo da minha cabeça, mas de
simulações que a gente faz. E mais, a percepção da crise internacional é
forte em todas as camadas socioeconômicas do Brasil. O pobre está vendo
todos os dias na TV como estão os Estados Unidos, a Europa.
Dos nomes citados para 2014, quem deve mesmo concorrer?
De todos os que apareceram, só tenho certeza mesmo sobre o nome de Dilma
Rousseff. Ela será candidata e vai ganhar a eleição. Provavelmente no
primeiro turno.
No primeiro turno?
Tem todas as condições. Não será surpresa [risos].
Aécio Neves é competitivo?
Mais para o futuro. Não me parece que vai chegar com força suficiente em 2014.
Eduardo Campos?
Acho que ele é muito inteligente para querer ser candidato. Ele sabe que o melhor momento dele será depois.
Joaquim Barbosa?
Acho também que é uma pessoa inteligente e saberá tomar a decisão certa.
Caso se candidatasse poderia ter um final de carreira melancólico. Não
se elegeria, faria uma campanha ruim e teria uma votação pouco
expressiva. Não tem apelo para ser candidato presidencial.
Joaquim Barbosa não tem apelo?
Certeza absoluta. Mesmo com os pontos positivos que tenha, não tem
perfil de presidente. Não tem preparo político para enfrentar o embate
de uma campanha. Não tem base partidária que lhe forneça uma estrutura
sólida. O povo separa bem as coisas: sabe que uma coisa é ser juiz outra
é ser presidente.
Marina Silva?
É uma boa candidata, mas acho que neste interstício de dois anos ela
perdeu muito espaço. E não conseguiu recompor uma base partidária. Ela
saiu bem da campanha de 2010, mas perdeu o vigor nesses dois anos,
durante os quais poderia ter feito um trabalho mais consistente.
Ciro Gomes? Acabou o ciclo dele?
Não sei nem se ele tem condições de se impor como candidato em seu partido.
E Lula em 2014?
Não quer ser candidato a presidente da República, em 2014. Defende, de toda alma, a reeleição de Dilma.
A presidente está fazendo uma aliança partidária muito ampla para 2014. Deixa poucas opções para o PSDB. Essa é a ideia?
Isso é muito bom se se confirmar em 2014. Porque Dilma vai ter condições
de mostrar muita coisa que ela tem realizado e isso será possível na
campanha eleitoral.
Para esse cenário se consolidar é importante que o PSB e Eduardo Campos se mantenham na aliança dilmista?
O ideal não só para a presidenta Dilma como para Eduardo Campos é que o
PSB fique no campo governista. Ele poderia se transformar num forte
candidato para 2018.
Mas o PT jamais apoiaria para presidente um nome do PSB...
Não sei. Isso aí é o PT que pode responder. Mas que Eduardo Campos seria
um candidato a presidente melhor em 2018 do que seria em 2014, sem
dúvida alguma.
O que Eduardo Campos ganharia esperando até 2018? Não é melhor concorrer em 2014 para acumular capital político?
Depende. Visto de um lado, sim. Visto de outro, não. Se você examinar,
historicamente, entre os candidatos que seguiram essa linha de acúmulo
gradativo de forças só houve um que se saiu bem nesta estratégia, que
foi Lula. Adhemar de Barros [1901-1969] foi um caso patético. Leonel
Brizola [1922-2004] fracassou. Ciro Gomes não teve resultados. Então, é
uma faca de dois gumes. Um candidato jovem que vem pela linha da
renovação torna-se muito mais forte se trabalhar no momento preciso, com
impacto, do que tentar no varejo, aos pouquinhos. Foi o que aconteceu,
positivamente, com Haddad em São Paulo: chegou no momento correto e
causou uma grande surpresa. Por sinal, Fernando Haddad tem tudo para ser
presidente da República, em 2022 ou 2026. É jovem, vai fazer um bom
governo em São Paulo...
Não é muita futurologia?
É... Mas se a política não permite futurologia, as entrevistas permitem.
Fernando Haddad tem hoje 49 anos. Tem tudo para fazer uma grande
administração em S. Paulo. Vai ficar oito anos em São Paulo, porque ele
vai se reeleger. Em 2022, 2026, vai ter um pouco menos ou um pouco mais
de 60 anos.
Esse seu raciocínio é todo construído a favor do projeto da reeleição
de Dilma. Se Eduardo Campos se lançar candidato a presidente em 2014,
ele não força a realização de um segundo turno?
Se a eleição fosse hoje, novembro de 2012, Dilma ganharia no primeiro
turno. Se fossem candidatos de oposição, a Aécio Neves e Eduardo Campos
não teriam, somados, 10% dos votos. Não significa, obviamente, que não
possam melhorar. Mas uma mudança grande só poderia ocorrer caso haja
fortes mudanças no quadro politico, econômico e social. Isso parece
muito pouco provável.
O sr. citou Fernando Haddad como presidenciável. Mas em 2014 tem
eleição para o governo paulista. Haddad pode ser o nome do PT nessa
disputa?
Ele não quer e sabe que seria um erro mortal repetir a mal sucedida
experiência de Serra. O PT não precisará de Haddad para vencer as
eleições. Tem outras nomes para isso.
Qual deve ser o candidato do PT a governador de São Paulo em 2014?
Não sei, é uma decisão do partido. Mas vou fazer uma provocação. É uma
pena o nosso candidato imbatível, Lula, não aceitar nem pensar nesta
ideia de concorrer a governador de São Paulo. Você já imaginou uma chapa
com Lula para governador de São Paulo tendo Gabriel Chalita, do PMDB,
como candidato a vice? E mais do que isso. Já imaginou o que seria, para
o Brasil, Dilma reeleita presidente, Lula governador de São Paulo e
Fernando Haddad prefeito da capital? Daria uma aceleração incrível no
modelo de desenvolvimento econômico e avanço social que o Brasil vem
vivendo.
Lula vai ser candidato?
Ele não aceita. Se isso sair publicado ele vai xingar até a minha quinta geração.
Já conversou com ele a respeito?
Não, mas sei que ele não aceita.
Como sabe que ele não aceita se não conversou com ele?
Sei por conversas com interpostas pessoas.
E qual será o nome do PT para concorrer ao Bandeirantes?
Há vários nomes. Marta Suplicy, Aloizio Mercadante, Alexandre Padilha, José Eduardo Cardozo, Luiz Marinho. Todos muito fortes.
Quem Lula prefere?
A coisa mais difícil do mundo é saber quem Lula deseja antes que ele
queira que as outras pessoas saibam. Há uma necessidade forte de
renovação, uma onda que já passou pela capital. Todos são nomes muito
bons e dentro de um campo de renovação. Agora, me parece que o sempre
novo e cada vez mais novo é Lula. Sua candidatura, em São Paulo,
inclusive não iria contrariar esse sentimento de renovação. Ao
contrário. Seria reforçado pela capacidade que ele tem de se renovar.
Por que nas últimas campanhas surgiram temas moralistas e religiosos?
Antes de mais nada, a indústria da salvação não virou indústria do voto.
Não houve a mínima influência, por exemplo, no voto final em São Paulo.
Eu inclusive fui uma voz solitária na campanha de Dilma em 2010 quando
dizia que o voto religioso não tinha a dimensão que se apregoava.
Quem acha que o voto religioso tem esse peso?
Há dois setores. Na direita, são os líderes religiosos que querem se
transformar em empresários do voto. Na esquerda, são pessoas
saudosistas, egressas dos movimento católicos das décadas de 60 e 70,
que têm um saudosismo sem conexão com a realidade atual.
O marketing eleitoral parece ter se repetido nas últimas eleições. É isso mesmo?
Não. Tem evoluído muito. A ponto de o marketing político brasileiro
estar ganhando mercados no exterior. Nós, assim como os roteiristas de
novela, somos condicionados pelo público que temos de atender. Temos de
ser entendidos e atrair público. Trabalhamos dentro de certas
limitações.
Como assim?
Se eu fosse fazer uma eleição direta para reitor da Unicamp e da USP,
para ser votado pelo mundo acadêmico e pelos estudantes, faria uma
campanha completamente diferente, com temáticas e debates bem diversos.
Ou seja, há uma limitação para atender demandas de um determinado
público-alvo. Mesmo assim, há empresas de marketing político que têm
conseguido se renovar, trazendo linguagens novas.
Como nas novelas?
Assim como a estrutura da novela aprisiona uma narrativa, a estrutura do
programa eleitoral aprisiona também a narrativa política. E o público
que nós temos que atender também nos aprisiona. Mas é equivocado dizer
que os programas eleitorais são extremamente repetitivos. Há quem se
repita por causa dessas condicionantes e por medo de ousar. E outros não
se repetem tanto. Na campanha do Haddad houve uma série de coisas
novas. O primeiro programa nosso eu até brincava internamente dizendo
que bastava repetir nos 45 dias seguintes que ganharíamos a eleição.
Mudaria algo que fez na campanha de Haddad?
Sem nenhuma soberba, nada. Não mudaria nada.
O que fará em 2013?
Tenho vários convites no Brasil e no exterior, para campanhas,
pré-campanhas e consultorias. Mas não posso ainda dizer porque é tudo
muito preliminar.
Fará a campanha de Dilma em 2014?
Espero ser convidado. Teria muito prazer em fazer.
Como está seu projeto de fazer um documentário em vídeo da campanha de 2010?
Eu pretendo fazer no futuro um documentário sobre as várias campanhas
das quais participei. Mas muito do material que tenho contém dados
confidenciais. Então não é algo fácil de ser produzido e não tenho um
prazo para finalizar. O que está em estágio mais avançado é um livro que
estou escrevendo sobre marketing político. A literatura nessa área tem
muito manual de autoajuda, quase sempre escrito por marqueteiros sem
campanha. Outro tipo de obra é o livro autoglorificador, de alguém
relatando seus grandes feitos. E há também os livros acadêmicos, muito
bons, mas sem ter o sabor da prática. Eu quero escrever uma síntese das
minhas experiências e reflexões teóricas. Mas não vou contar nenhuma
história secreta porque não posso ferir meus preceitos éticos de manter a
confidencialidade sobre os meus contratos.
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