Novas gravações envolvem ministro na compra de votos
Bolsas de São Paulo e Rio têm queda, puxada por ações da telebrás
Brasil Online 14/05/97 20h13
De São Paulo
O
esquema de compra de votos de deputados federais a favor da emenda da
reeleição começa a enredar o governo. Novas gravações obtidas pela Folha
envolvem o ministro das Comunicações, Sérgio Motta. Revelam ainda como o
deputado João Maia (PFL-AC) vendeu seu voto. Nas gravações, Maia diz
que recebeu R$ 200 mil para votar a favor da emenda que pode permitir a
reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Jefferson Rudy/Folha Imagem
Deputado João Maia, ex-PFL |
O deputado revela ainda que a barganha pelo voto previa receber R$ 200
mil do governo federal e outros R$ 200 mil do governo do Estado do Acre.
O dinheiro usado na operação, segundo Maia, foi providenciado pelo
governador do Amazonas, Amazonino Mendes (PFL), e pelo ministro Sérgio
Motta (PSDB).
O ministro das Comunicações disse que vai interpelar judicialmente os deputados João Maia e Ronivon Santiago (que
depôes na tarde de quarta á Comissão de Sindicância da Câmar e negou
que tenha recebido dinheiro; para o deputado, as fitas teriam sido
"montadas") para que confirmem ou neguem as informações de que ele
teria participação no esquema de compra de votos, mencionado por ambos
em fitas obtidas pela Folha. As declarações do ministro foram feitas nesta quarta em coletiva de imprensa no Ministério.
Motta alegou não ter "telhado de vidro" e considerou uma "irresponsabilidade" a denúncia feita pela Folha.
"Não há afirmação concreta, são sempre palavras no condicional,
conversas evasivas, superficiais entre pessoas de procedimento
duvidoso", disse.
O ministro se recusou a responder qualquer pergunta porque, segundo ele,
não tinha nada para ser debatido. "Não há denúncia concreta", repetiu.
Na opinião de Motta, a manchete do jornal era "enganosa, tendenciosa,
caluniosa, com nítidas e estranhas intenções políticas". "Não há na
matéria nenhuma informação ou dado concreto que justifique uma frase
afirmativa como a contida na manchete", afirmou. O ministro disse que "o
Brasil retratado na série de reportagens da Folha foi varrido do panorama do governo".
Sérgio Motta, apesar de dizer que a fita não continha denúncias
concretas, informou que vai esperar a comissão de sindicânica da Câmara e
eventualmente a Justiça encerrar as apurações e tomar as conclusões
devidas. "Se ainda sobrar alguma dúvida a meu respeito, vou tomar as
medidas judiciais cabíveis."
Preço do votoR$ 200 mil segundo Maia e Ronivon |
O ministro afirmou que a reportagem causou prejuízos ao Brasil no
mercado internacional e à imagem do país. "Quero dizer que o ministério
está trabalhando normalmente e os cronogramas serão mantidos". As bolsas
de São Paulo e Rio tiveram fortes quedas, puxadas para baixo pelas
ações da Telebrás. No plano político, o governo teve uma vitória: a
Comissão de Constituição e Justiça do Senado rejeitou emendas ao projeto
reeleitoral. O governo quer que a emenda da reeleição seja votada em
primeiro turno no Senado na próxima quarta-feira, dia 21.
A agenda de Motta era um mistério até a confirmação da coletiva. Mas
fontes próximas ao governo dizem que ele conversou com o presidente
Fernando Henrique Cardoso, não se sabe se por telefone ou pessoalmente
no Palácio do Planalto.
O presidente Fernando Henrique Cardoso, em entrevista à Rádio Eldorado
AM pela manhã, disse que se ficar provado o envolvimento de qualquer
autoridade neste caso, ela será demitida. "Não estou prejulgando mas
qualquer pessoa que estiver envolvida será imediatamente desligada do
governo", afirmou. O presidente contou ter conversado por telefone com o
ministro a respeito do caso. "Ele me disse que não tem nada a ver com
isso."
FHC se disse indignado como "qualquer homem de bem deste país". Segundo
o presidente, este tipo de negociação fisiológica "não cabe mais no
Brasil".
Outro que saiu em defesa de Motta foi o líder do governo no Senado,
Élcio Álvares (PFL-ES). "Uma acusação vaga com referência a um
noticiário não é uma acusação. Motta tem reafirmado seu perfil de homem
honesto. Ele luta, pede, insiste, mas sempre com razões éticas", afirmou
Elcio Alvares.
Governistas ignoram apelos
para suspender emenda
para suspender emenda
Apesar de todas as suspeitas, a Comissão de Constituição e Justiça do
Senado recusou um requerimento do senador José Eduardo Dutra (PT) para
que a discussão fosse suspensa até as apurações sobre o caso serem
concluídas. O parecer do senador Francelino Pereira foi discutido e
aprovado no início da tarde.
Todas as emendas propostas pelos senadores foram rejeitadas pelo
relator. Assim, se aprovado pelo plenário do Senado, o projeto de emenda
constitucional estará pronto para a sanção presidencial. Se sofrer
modificações terá de voltar à Câmara, conforme determina o regimento do
Congresso.
Na terça, a Folha havia revelado um esquema de compra de votos
de deputados na época da votação da emenda constitucional da reeleição,
em janeiro passado.
Participaram do negócio, pelo menos, cinco deputados
federais
do Acre e dois governadores -tudo isso segundo os deputados
João Maia e Ronivon Santiago (PFL), este último o que
protagonizou as revelações de terça.
A história contada por João Maia confirma o conteúdo das fitas
com conversas gravadas de Ronivon Santiago sobre a venda de
votos a favor da reeleição.
Os diálogos foram gravados sem que os deputados soubessem.
Algumas das conversas gravadas com João Maia são posteriores
às de Ronivon Santiago.
Em outras gravações com Santiago também consta a acusação
contra o ministro Sérgio Motta.
Os dois deputados, João Maia e Ronivon Santiago, foram expulsos pelo PFL nesta quarta.
Maia, ex-militante do PT, que foi processado junto com Luiz
Inácio Lula da Silva pelo regime militar nos anos 80, relata assim a
origem do dinheiro que aceitou em
troca de seu voto: "Aquele dinheiro era o dinheiro do
Amazonino. Que o Amazonino
mandou trazer, por ordem do... do... menino aqui, do
Serjão".
E mais: "Pelo que eu sei bem é o seguinte: eram os (R$) 200
(mil)
do Serjão, via Amazonino, que era a cota federal, aí do
acordo...
Ele falou, pra todo mundo, aí, meio mundo, aí".
João Maia conta em outro trecho: "Esse dinheiro do Amazonino
era o dinheiro que já estava aí. Você entendeu? Que o Serjão já
tinha acertado. Mas, como ele soube, quer dizer, acabou pegando
o dinheiro do Amazonino para pagar o cheque dele. Quer dizer,
no fundo, a gente dançou em 200 paus aí nessa brincadeira".
Esse cheque a que João Maia se refere é um pagamento que ele
receberia pelo voto a favor da reeleição. O cheque -não fica claro
o valor, se R$ 100 mil ou R$ 200 mil- foi entregue por Eládio
Cameli, irmão do governador do Acre, Orleir Cameli.
O cheque nunca foi usado. Nos dias que antecederam a votação
do primeiro turno da emenda da reeleição na Câmara dos
Deputados, em 28 de janeiro, deputados acertaram a devolução
dos cheques em troca de dinheiro vivo.
De acordo com as gravações, a votação
da emenda da reeleição foi precedida por uma grande operação
de aliciamento de deputados por parte dos governistas no
Congresso.
Segundo João Maia, a ponta do esquema era o deputado
Pauderney Avelino, na época da votação um membro do
PPB-AM -hoje está no PFL.
"Esse dinheiro é do Amazonino. Promessa do Pauderney aqui. No
nosso corredor aqui, falou em 200 paus. Via Serjão" revela o
deputado João Maia na fita gravada a que a Folha teve acesso.
Depois desse contato inicial, havia uma segunda etapa. No caso
de João Maia, segundo ele próprio, essa fase incluiu uma
conversa com o então presidente da Câmara dos Deputados, Luís
Eduardo Magalhães (PFL-BA).
Oposição quer
instalar CPMI
instalar CPMI
Na terça-feira, o deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) anunciou no
plenário da Câmara dos Deputados que estava recolhendo assinaturas de
parlamentares favoráveis a uma CPMI (Comissão Parlamentar Mista de
Inquérito) sobre o caso.
Uma CPMI difere de uma CPI em dois aspectos: envolve todo o Congresso e
pode ser convocada "sem entrar na fila". Como a CPI, tem poderes para
quebrar o sigilo bancário e telefônico de qualquer pessoa envolvida nos
casos investigados. Como afirmou Chinaglia ao Brasil Online, "eu
acho que é importante ir além de uma Comissão de Sindicância só
da Câmara (que foi convocada pelo presidente da Câmara, Michel Temer, na
manhã da terça; uma CS não pode quebrar o sigilo bancário e telefônico)
e chamar os senadores para investigar uma denúncia que diz respeito à
instituição como um todo".
Até as 13h20 desta quarta, o deputado já conseguira 123 assinaturas.
São necessários 171 deputados e 27 senadores para convocar uma
CPMI.Chinaglia acredita que consegue completar as assinaturas na Câmara
ainda hoje.
Às 14h, os partidos de oposição na Câmara e no Senado
vão lançar um movimento de mobilização para que seja instalada a CPI da
Reeleição. Consultado nesta manhã sobre o tema, o presidente da Câmara,
Michel Temer, disse que preferia esperar o resultado da sindicância.
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