Do Correio do Brasil
O pior pesadelo do presidente do
Supremo Tribunal Federal (STF), Joaquim Barbosa, que tem dado repetidas
mostras de interesse pela vida política, começa a se transformar em
realidade nas próximas horas, em Roma. O ex-diretor do Banco do Brasil
Francisco Pizzolato fará chegar às mãos de seus advogados italianos o
relatório de perto de mil páginas, que o Correio do Brasildivulga, com
exclusividade, no qual apresenta provas de que o dinheiro que deu origem
à Ação Penal 470 no STF origina-se em uma empresa privada e não de um
ente público, como afirma o relatório de Barbosa.
Para ocultar este fato, que coloca por
terra o argumento que levou os réus na AP 470 ao Complexo Penitenciário
da Papuda, segundo o dossiê apresentado por Pizzolato, que tem
cidadania italiana, o então procurador-geral da República Antonio
Fernando de Souza e o ministro Joaquim Barbosa criaram, em 2006, e
mantiveram sob segredo de Justiça dois procedimentos judiciais paralelos
à Ação Penal 470. Por esses dois outros procedimentos passaram parte
das investigações do chamado caso do ‘mensalão’.
O inquérito sigiloso de número 2474
correu paralelamente ao processo do chamado ‘mensalão’, que levou à
condenação, pelo STF, de 38 dos 40 denunciados por envolvimento no caso,
no final do ano passado, e continua em aberto. E desde 2006 corre na
12ª Vara de Justiça Federal, em Brasília, um processo contra o
ex-gerente executivo do Banco do Brasil, Cláudio de Castro Vasconcelos,
pelo exato mesmo crime pelo qual foi condenado no Supremo Tribunal
Federal (STF) o ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil, Henrique
Pizzolato.
Esses dois inquéritos receberam provas
colhidas posteriormente ao oferecimento da denúncia ao STF contra os
réus do ‘mensalão’ pelo procurador Antônio Fernando, em 30 de março de
2006. Pelo menos uma delas, “o Laudo de número 2828, do Instituto de
Criminalística da Polícia Federal, teria o poder de inocentar
Pizzolato”, afirma o dossiê.
Dinheiro da Visanet
Ainda segundo o relatório que
Pizzolato apresentará, em sua defesa, na corte italiana, um tribunal de
exceção foi montado no Brasil com o único objetivo de desmoralizar o
então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em uma clara tentativa de
apeá-lo do poder antes do tempo. Embora o estratagema tenha funcionado
ao contrário, com mais um mandato popular surgido das urnas ao líder
petista, que em seguida elegeu a sucessora, Dilma Rousseff, o STF seguiu
adiante e conseguiu que o ex-ministro José Dirceu e o deputado José
Genoino (PT-SP) fossem conduzidos à prisão.
Pizzolato relata, em detalhes, as
operações realizadas na campanha política de 2002 e suas ações na
diretoria de Marketing do Banco do Brasil. No dossiê, ele contesta os
documentos acatados como verdadeiros na AP 470.
“Observem bem a data em que foi
escrita a carta mentirosa do “tucano” (Antonio Luiz Rios, ex-presidente
da Visanet que hoje trabalha como consultor para a Rede Globo de
Televisão) e dirigida aos peritos da PF, foi em 02 de fevereiro de 2006,
período em que os advogados não tinham acesso a nenhum documento. E
esta carta mentirosa do “tucano” ditou, influenciou e/ou moldou todos os
pareceres, perícias e fundamentalmente a própria “denúncia” da
Procuradoria Geral da República e do Ministério Público Federal
(PGR/MPF), bem como a argumentação do relator Joaquim Barbosa que por
sua vez “convenceu” o plenário do STF. Ninguém, repito, absolutamente
ninguém, nem o PGR/MPF e nem o relator, deram-se ao trabalho de observar
a regra básica de uma relação de mercado, o respeito ao contrato. Pois
existia um contrato que normatizava a relação da Visanet com seus
sócios, os diversos bancos, sendo o maior acionista da VISANET, o
Bradesco”.
Em nove capítulos, Pizzolato também
revela que, em março de 2006, quando ainda presidia o STF o ministro
Nelson Jobim, a CPMI dos Correios divulgou um relatório preliminar
pedindo o indiciamento de 126 pessoas. Dez dias depois, em 30 de março
de 2006, o procurador-geral da República já estava convencido da culpa
de 40 deles. A base das duas acusações era desvio de dinheiro público
(que era da bandeira Visa Internacional, mas foi considerado público,
por uma licença jurídica não muito clara) do Fundo de Incentivo Visanet
para o Partido dos Trabalhadores, que teria corrompido a sua base aliada
com esse dinheiro. Era vital para essa tese, que transformava o
dinheiro da Visa Internacional, aplicado em publicidade do BB e de mais
24 bancos entre 2001 e 2005, em dinheiro público, ter um petista no
meio. Pizzolato era do PT e foi diretor de Marketing de 2003 a 2005.
Barbosa decretou segredo de Justiça
para o processo da primeira instância, que ficou lá, desconhecido de
todos, até 31 de outubro do ano passado. Faltavam poucos dias para a
definição da pena dos condenados, entre eles Pizzolato, e seu advogado
dependia de Barbosa para que o juiz da 12ª Vara desse acesso aos autos
do processo, já que foi o ministro do STF que decretou o sigilo.
O relator da AP 470 interrompera o
julgamento para ir à Alemanha, para tratamento de saúde. Na sua
ausência, o requerimento do advogado teria que ser analisado pelo
revisor da ação, Ricardo Lewandowski. Barbosa não deixou. Por telefone,
deu ordens à sua assessoria que analisaria o pedido quando voltasse.
Quando voltou, Barbosa não respondeu ao pedido. Continuou o julgamento.
No dia 21 de novembro, Pizzolato recebeu a pena, sem que seu advogado
conseguisse ter acesso ao processo que, pelo simples fato de existir,
provava que o ex-diretor do BB não tomou decisões sozinho – e essa,
afinal, foi a base da argumentação de todo o processo de mensalão (um
petista dentro de um banco público desvia dinheiro para suprir um
esquema de compra de votos no Congresso feito pelo seu partido).
No dia 17 de dezembro, quando o STF
fazia as últimas reuniões do julgamento para decidir a pena dos
condenados, Barbosa foi obrigado a dar ciência ao plenário de um agravo
regimental do advogado de Pizzolato. No meio da sessão, anunciou
“pequenos problemas a resolver” e mencionou um “agravo regimental do réu
Henrique Pizzolato que já resolvemos”. No final da sessão, voltou ao
assunto, informando que decidira sozinho indeferir o pedido, já que “ele
(Pizzolato) pediu vistas a um processo que não tramita no Supremo”.
O único ministro que questionou o
assunto, por não acreditar ser o assunto tão banal quanto falava
Barbosa, foi Marco Aurélio Mello.
Mello: “O incidente (que motivou o agravo) diz respeito a que processo? Ao revelador da Ação Penal nº 470?”
Barbosa: “Não”.
Mello: “É um processo que ainda está em curso, é isso?”
Barbosa: “São desdobramentos desta Ação Penal. Há inúmeros procedimentos em curso.”
Mello: “Pois é, mas teríamos que
apregoar esse outro processo que ainda está em curso, porque o
julgamento da Ação Penal nº 470 está praticamente encerrado, não é?”
Barbosa: “É, eu acredito que isso deve ser tido como motivação…”
Mello: “Receio que a inserção dessa
decisão no julgamento da Ação Penal nº 470 acabe motivando a
interposição de embargos declaratórios.”
Barbosa: “Pois é. Mas enfim, eu estou indeferindo.”
Segue-se uma tentativa de Marco
Aurélio de obter mais informações sobre o processo, e de prevenir o
ministro Barbosa que ele abria brechas para embargos futuros, se o tema
fosse relacionado. Barbosa reitera sempre com um “indeferi”, “neguei”. O
agravo foi negado monocraticamente por Barbosa, sob o argumento de que
quem deveria abrir o sigilo de justiça era o juiz da 12ª Vara. O
advogado apenas consegui vistas ao processo no DF no dia 29 de abril,
quando já não havia mais prazo recurssório.
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