Luis Nassif

Proibir contribuições de pessoas jurídicas contraria a própria concepção dos partidos

Por Fernando G Trindade
Comentário ao post "Financiamento privado de campanha: STF a um passo de uma decisão histórica"
Nassif está errado. É um contra-senso admitir que os partidos são formados na sociedade civil, que são pessoas jurídicas de direito privado (art. 17 da CF) e proibir, em termos absolutos, que os sujeitos dessa sociedade (inclusive as pessoas jurídicas) participem do financiamento dos candidatos e partidos que nela existem.


Uma tal proposta só tem lógica política sob o pressuposto de que os partidos políticos são entes estatais ou paraestatais, como era até 1988, mas que não pode ser compatibilizado com a concepção pluralista do processo político acolhida pela Constituição Federal (art. 1º, V).
A propósito, todos sabemos que os partidos políticos surgem para representar e legitimar interesses existentes na sociedade; daí, falar-se em base social dos partidos. E ocorre que, no limite, a proibição absoluta de contribuições de pessoas jurídicas aos partidos e candidatos contraria essa concepção.
Se o partido político representa setores, parcelas da sociedade, seu financiamento (inclusive eleitoral) deve ser feito também por essas parcelas da sociedade. Recordemos, a propósito, que o art. 5º, inciso XVII, da Lei Maior preceitua ser plena a liberdade de associação para fins lícitos. Ora, a plenitude do direito de associação implica o direito de participar do financiamento da associação de que se participa.
Importante também consignar que a proibição da participação das pessoas jurídicas no financiamento dos partidos contribui para velar, esconder a relação dos partidos com os setores da sociedade cujos interesses representa, obscurecendo, assim, as relações entre a esfera pública e a esfera privada da sociedade, quando o que se deve favorecer é a publicidade dessas relações.
Aliás, a busca mesma por recursos na sociedade civil, em princípio, é positiva, à medida que leva o partido a com ela interagir, o que é fundamental para, inclusive, aumentar a sua representatividade e a sua inserção social.
Aqui cabe a indagação: nas campanhas eleitorais do período autoritário, quando as empresas privadas estavam proibidas de financiar os partidos e candidatos, aquela proibição teve eficácia ou as empresas financiavam os partidos e candidatos mediante os famosos caixas dois? É certo que financiavam. Portanto, parece-nos que o rigor que havia na legislação anterior à vigente era apenas aparente, uma vez que a sua letra era severa, mas não produzia eficácia social, fracassando quanto ao fim que buscava alcançar.
Por outro lado, a permissão de financiamento de empresas tem contribuído para aproximar o mundo legal do financiamento das campanhas do seu mundo real, ao possibilitar alguma publicidade quanto ao seguinte: primeiro, que empresas contribuem para quais candidatos e partidos; segundo, qual o montante das contribuições. É certo que não é o suficiente, é certo que permanecem as contribuições ocultas, mas, de qualquer sorte, diversamente do passado, há hoje um mínimo de transparência quanto a esses aspectos.
Por tudo isso, temos convicção de que o financiamento das campanhas eleitorais também por agentes privados é fundamental no Estado de Direito.
Na verdade, tal espécie de proibição revela uma concepção ‘politicista’, uma ilusão de fundo idealista do processo político, que acredita na possibilidade de a disputa política se dar apenas entre os partidos políticos no sentido estrito, no Parlamento ou fora dele.
No caso do PT, tal ilusão é até mais grave. O partido ainda nem terminou de ‘pagar a conta’ por acreditar na quimera da neutralidade dos estamentos da elite do aparelho do Estado (caso do chamado mensalão) e já quer entrar em outra furada, que pode lhe causar muito estrago no futuro imediato.
Já dá para antever que partido e que candidatos vão ser o alvo preferencial do ‘jornalismo investigativo’ e do exército de procuradores e promotores e policiais federais que irão fazer a ‘operação pente fino’ sob o pretexto de ‘cumprir a lei’ e reprimir o financiamento de pessoas jurídicas nas campanhas.
De outra parte, apesar da nossa opinião favorável à contribuição de empresas privadas a partidos políticos, o nosso entendimento é o de que deve permanecer na lei a preocupação de se reprimir, nos pleitos, o abuso do poder econômico.