Penso que há muita mais desinformação do que informação sobre Belo Monte. O governo precisa urgentemente fazer um pronunciamento sobre a matriz energética, o seu plano energético para evitar que esse país entre novamente em um apagão.
O consumo das famílias brasileiras tem aumentado, consequentemente o Brasil vai precisar gerar mais energia.
E penso é que importante indagar de onde está vindo a energia para sustentar um crescimento de 5% ao ano em média da economia
Por Paulo Godoy – VALOR
Obras de hidrelétricas voltaram a ser paralisadas ou ameaçadas. Há um roteiro padrão: pleitos e interesses de autoridades governamentais, movimentos sociais e políticos ou ainda organizações não governamentais, encampados por agentes do Ministério Público ou pelas instâncias primárias do poder Judiciário, sob a alegação de haver prejuízo irreparável ao interesse público, de ser necessário defender os direitos da população local ou de existir arbitrariedades perpetradas por empreendedores ou por agentes públicos ambientais. Nem sempre, infelizmente, essa fotografia é tão nítida assim.
Há casos recentes. As atividades no canteiro de obras da hidrelétrica de Belo Monte, de 11.233 megawatts (MW) foram paralisadas pela Justiça em setembro e novamente autorizadas por instâncias superiores em novembro. As obras da usina Colíder (MT/PA, 342 MW) e de Teles Pires (MT/PA, 1.820 MW) sofreram ações de embargo e pressão dos promotores de Justiça. Nos Estados, dezenas de pequenas centrais hidrelétricas se arrastam pela burocracia do licenciamento ambiental, demorando até cinco anos para obter a licença. Paralelamente, cresce a movimentação para impedir que aproveitamentos hidrelétricos recebam as licenças ambientais prévias, fundamentais para que eles sejam inseridos no próximo leilão de energia, agendado para 20 de dezembro. Há dez projetos inscritos até o momento, com potência total de 2.160 MW.
Mesmo com posse de autorizações, construção de usinas continua sofrendo pressões e paralisações
As razões para as paralisações e pressões são variadas. Em muitas ocasiões, instituições contrárias aos projetos aproveitam oportunismos e brechas na legislação para postergar os empreendimentos. Felizmente, algumas dessas fendas foram fechadas recentemente com a publicação de portarias que padronizam procedimentos no licenciamento ambiental e com a aprovação de um projeto de lei que regulamenta as competências comuns da União, Estados e municípios nas questões ambientais.
Outro problema merece atenção. Os gestores públicos que autorizam o prosseguimento de estudos e empreendimentos estão sendo progressivamente alvo de ameaças e processos administrativos e judiciais, com o intuito de intimidá-los, o que é uma extrapolação do poder constitucional que os promotores públicos foram incumbidos. Isso ocorreu muitas vezes nos últimos anos e novamente agora, na tentativa de suspender a licença de instalação da usina de Teles Pires. Uma coisa é inibir a improbidade e os atos que prejudicam a sociedade; outra é tentar inibir o funcionário público pela coerção, em um nítido movimento de abuso de poder.
A elaboração de estudos ambientais e os processos de obtenção das licenças são complexos e exigentes. As usinas percorreram por anos os trâmites do licenciamento ambiental, nos quais receberam licenças prévias ou de instalação após realizarem investigações e investirem milhões de reais. Mesmo de posse de autorizações oficiais e legais, predomina a insegurança jurídica. As ameaças prosseguem durante toda a fase de construção. As pressões, em muitos casos, visam a mais recursos, já que as obras de infraestrutura costumam estar localizadas em regiões nas quais prevalecem a desorganização social, a ausência do Estado, a anomia governamental, a falta de fiscalização dos direitos civis, a carência de serviços públicos e a prevalência de atividades comerciais ilegais ou predatórias. Muitas demandas, inúmeras pressões, pedidos sem fim.
Claudio Belli/Valor/Claudio Belli/Valor
Os órgãos fiscalizadores argumentam que é preciso suspender obras para evitar graves riscos à saúde e à qualidade de vida de populações que, por décadas, têm convivido com esses graves problemas aos olhos das autoridades. Os investimentos e as obras, quando anunciados ou aprovados, passam a ser vistos como uma oportunidade para solucionar ou dirimir carências seculares e, assim, torna-se interessante que o processo de licenciamento ambiental e de cumprimento das condicionantes não se esgote e seja perpetuado.
O andamento das obras fica sempre condicionado, então, à aceitação de novos pedidos. Esse roteiro, infelizmente, está institucionalizado no Estado brasileiro e o propósito maior é tentar transferir para os empreendedores a responsabilidade de solucionar problemas complexos que extrapolam impactos ambientais e sociais causados pelo empreendimento e que receberam, ao longo das últimas décadas, pouca ou nenhuma atenção efetiva do poder público local.
O Estado brasileiro decidiu, poucos anos atrás, aproveitar o potencial de geração de energia renovável existente no país. Essa decisão foi lastreada pela necessidade de ampliar a capacidade de produção de energia numa escala capaz de atender a demanda da economia e da sociedade brasileira, sob os conceitos da sustentabilidade ambiental e da modicidade tarifária. Com base nessa visão, projetos de hidrelétrica passaram a ganhar participação nos leilões de energia.
As obras de infraestrutura, indubitavelmente, são correias transmissoras de geração de riqueza, de bem-estar social e de serviços públicos essenciais. Mesmo assim, causam impactos no meio ambiente, como qualquer ação humana, seja pública ou privada. O processo de licenciamento ambiental, no qual todos os agentes públicos e privados, organizados ou não, participam e opinam, garante que os impactos sejam pesquisados, analisados e mensurados, que ações mitigadoras e compensatórias sejam instituídas, fiscalizadas e cumpridas. Se obrigações anteriores são descumpridas, a licença ambiental seguinte não é emitida.
É sabido que, no passado, obras foram construídas sem atenção ao meio ambiente e às demandas sociais locais, refletindo o arcabouço regulatório e o pensamento da sociedade daquela época. Ambos evoluíram. É o momento de avançar novamente. As instituições de fiscalização e controle precisam deixar de utilizar o conflito como ferramenta de trabalho, ampliar o escopo de funcionamento e mirar o quanto elas contribuem ou prejudicam o desenvolvimento do Brasil. O país, assim, pode romper com um movimento institucionalizado de ações protelatórias e garantir, de forma sustentável, os investimentos na infraestrutura brasileira.
Paulo Godoy é presidente da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (Abdib)
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