Chego a este momento da vida, com 60 anos de existência e 40 dedicados ao ensino, carregando a maturidade de quem já atravessou muitos mundos, olhares e encontros. Foram milhares de alunos, das infâncias às universidades, que, assim como eu, aprenderam e ensinaram em uma longa travessia de suas vidas.
Mas hoje, mais do que nunca, percebo que o verdadeiro caminho não é
simplesmente ensinar conteúdos, nem formar sujeitos apenas para o mundo do
trabalho, mas formar consciências
livres, críticas, despertas, tanto no mundo quanto para além dele.
É nessa busca que me aproximo, com profunda reverência, do Gnosticismo, essa antiga corrente
espiritual que afirma que o
conhecimento salvador (gnose) é o caminho da libertação interior. Os
evangelhos de Maria Madalena, Tomé e Felipe, tidos como apócrifos, me provocam
profundamente, porque anunciam uma espiritualidade que não depende de
instituições nem dogmas. Apontam, antes, para o sagrado que habita em cada ser, e que só pode ser acessado por meio do autoconhecimento e da consciência
desperta.
Essa postura ressoa fortemente com a máxima de Sócrates – "Conhece-te a ti mesmo e conhecerás o universo
e os deuses" e também com minha trajetória como educador que,
inspirado por Paulo Freire,
compreende a educação como prática de liberdade, diálogo e transformação.
E nesse processo, me vejo também alinhado com a visão de Vygotsky, para quem a consciência se
forma na interação com o mundo, com os outros e com a linguagem. A mediação é o
que nos humaniza e nos eleva.
Todas essas dimensões – espiritual, filosófica, pedagógica – convergem
em minha busca mais profunda: ser um
ser pensante, ético, sensível, lúcido e inteiro.
E é nesse ponto do caminho que sinto minha alma se aproximar do que o
filósofo Baruch de Espinosa
chamou de Deus, não um ser fora do
mundo, mas o próprio tecido divino da natureza, da vida e da razão. Um
Deus que não julga, não pune, não exige adoração, mas se manifesta em tudo que existe, em tudo que vive e em tudo que pensa.
Assim como respondeu Einstein
ao ser perguntado se acreditava em Deus:
“Acredito no Deus de Espinosa,
que se revela na harmonia do que existe, e não em um Deus que se preocupa com
destinos e ações dos homens.”
Essa concepção profunda, ética e bela de Deus está expressa naquilo que
considero uma verdadeira oração da liberdade:
🌿 Mensagem
de Deus, segundo Baruch Spinoza
“Pare de ficar rezando e batendo no peito!
O que quero que faça é que saia pelo mundo e desfrute a vida.
Quero que goze, cante, divirta-se e aproveite tudo o que fiz pra você.
[...]
Não me procure fora. Não me achará.
Procure-me dentro de você. É aí
que estou, batendo em você.”
Essas palavras ecoam em mim como um chamado, não à crença cega, mas à vivência consciente. Um chamado à
alegria de existir, ao respeito pela vida e ao cuidado com o mundo. Um chamado
que convida a ensinar com o coração
livre e a viver com o espírito acordado.
Talvez por isso, neste momento, sinto-me mais preparado para ensinar.
Não porque detenha verdades absolutas, mas porque me libertei da necessidade de
possuí-las. Hoje, prefiro as perguntas,
os silêncios, os gestos, os encontros.
Sim, tenho medo. Medo de estar errado, medo de parecer uma farsa. Mas
sei que quem teme isso, normalmente é
quem mais busca ser verdadeiro.
E por isso sigo.
Não como quem carrega certezas, mas como quem
cultiva sentidos.
Não como quem aponta caminhos, mas como quem
caminha junto.
Não como mestre, mas como semeador de consciências.
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