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segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Sim, nós temos o nosso 11 de setembro.

Tento imaginar a dor das famílias estadunidenses que perderam os seus entes queridos. E tento imaginar a dor das famílias iraquianas e dos afegãos pela perda dos seus. E fica ainda a imaginar as milhares de famílias japonesas que perderam tudo e tiveram o DNA alterado pela radioatividade. E tento imaginar o quanto, nós latino-americanos, sofremos com as ditaduras obscenas sustentadas pelos corvos estadunidenses. 

Não consigo porque dói, dói muito, principalmente por enxergar a hipocrisia no trato desse tema: terrorismo para uns e assassinatos para outros desfaçados de ajuda humanitária. 

O 11 de setembro latino-americano

Enquanto os meios de comunicação de todos os quadrantes davam ampla repercussão aos 10 anos do 11 de setembro, com raras exceções alguns veículos recordavam outro 11 de setembro, o do Chile, quando um golpe de extrema direita derrubou o então Presidente constitucional Salvador Allende, com o apoio dos Estados Unidos e do Brasil.


Trinta e oito anos depois, o ideário de um país mais justo, com atendimento digno nas áreas de educação e saúde, segue vigente no Chile, o que indica que o pensamento de Allende, que quando jovem era líder estudantil, segue vigente.

Uma nova geração, nascida bem depois daquela fatídica data de 11 de setembro de 1973, está ocupando as ruas de Santiago e de outras cidades chilenas para dizer que não aceitam mais pagar preços extorsivos em verdadeiros shopings centers que se tornaram as universidades.

Sebastian Piñera andou tentando enganar os estudantes com paliativos que não atacam o principal, ou seja, a participação efetiva do Estado na área da educação. Desde a ditadura de Augusto Pinochet e mesmo nos governos democráticos da Concertación foram dados os máximos incentivos para a iniciativa privada lucrar com o ensino. Criaram-se então mostrengos, que de educacionais só têm o nome.


No encontro que tiveram com Piñera, os líderes estudantis demonstraram grande maturidade e que sabem o que querem. Rebateram os argumentos do Presidente e o deixaram de boca aberta quando leram alguns compromissos internacionais ratificados pelo Chile e que, segundo os estudantes, não estavam sendo cumpridos e que tinham a ver com tudo que pleiteavam.

O representante da Federação Mapuche de Estudantes sem rodeios foi logo lembrando, por exemplo, do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da Organização das Nações Unidas e do Convênio 169 da Organização Internacional do Trabalho. Piñera não esperava por isso e nem estava preparado para rebater os argumentos, demonstrando ser um Presidente despreparado e que tinha sido eleito devido a falência da Concertación e a capacidade, com muito dinheiro, de enganar o povo. Só mesmo os ricos sabiam que ele se elegeria para manter e ampliar privilégios em detrimento da maioria.
Os jovens entenderam perfeitamente que só poderão ter algum futuro se ocorrerem mudanças e o Estado voltar a dar as cartas no setor, neutralizando os empresários que só pensam no lucro fácil. Como Piñera tem grandes compromissos com o setor empresarial, a tática utilizada pelo Presidente era de enganar incautos, o que os estudantes nunca foram. Aí armou-se o impasse, obrigando os estudantes voltarem às ruas inclusive no 11 de setembro.

Aqui no Brasil ainda há partidos políticos que defendem e privatização do ensino. No Estado e município do Rio de Janeiro, usando artifícios, os governos tentam estabelecer a prédica privatista, tanto na área da saúde como na da educação. Contam com aliados no Parlamento e na mídia de mercado e entre os tais sabichões analistas de sempre.

O Chile deve servir de lição para estes grupos que embora tentem não aparecer como tal, professam o ideário neoliberal, o mesmo que levou o país andino à situação atual em que os ricos ficam cada vez mais ricos e os pobres descem ladeira abaixo.

Em termos de canais de televisão, vale uma referência à TV e a Agência Brasil, duas mídias públicas que mandaram uma enviada especial, Monica Yanakiew, para acompanhar os acontecimentos no Chile e os seus desdobramentos. É importante este destaque sobretudo pelo fato de as demais emissoras estarem praticamente em tempo integral jornalístico no 11 de setembro de Nova York. Muito bem analisado por Rui Martins aqui no Direto da Redação.

No mais, enquanto na Líbia prossegue a caça a Muammar Khadafi, agora até a Interpol atrás, no Rio de Janeiro caiu a ficha do Complexo do Alemão. Sergio Cabral e o secretário de Segurança José Mariano Beltrame passaram quase um ano enaltecendo o novo tempo na região e de repente, não mais do que de repente, tudo voltou à estaca zero.

Os últimos acontecimentos naquela área da cidade deixaram claro que tudo não passava de um jogo de marketing sem sustentação. O Rio de Janeiro vivia a ilusão de que a política de segurança de Cabral mudou a cara da cidade. Propaganda enganosa. E o Exército, absolutamente sem preparo para lidar com situações do gênero, mesmo com a experiência ganha no Haiti, onde reprimiu os pobres de Capacete Azul, está chafurdando no Complexo do Alemão.

E vale sempre lembrar que o Exército brasileiro, agindo como age, segue a recomendação do Pentágono que quer ver as Forças Armadas da América Latina ocupando-se com casos de polícia.

Em vez de efetivos militares, a segurança deveria se voltar para métodos de inteligência no combate ao crime, para não falar da presença social do Estado nas áreas carentes. Mas como isso demora e a Copa do Mundo está batendo às portas, repressão em cima das áreas pobres próximas aos locais onde serão realizados os jogos é necessária. Esta é a verdadeira face da política de segurança do farsante Sergio Cabral.


Mário Augusto JakobskindÉ correspondente no Brasil do semanário uruguaio Brecha. Foi colaborador do Pasquim, repórter da Folha de São Paulo e editor internacional da Tribuna da Imprensa. Integra o Conselho Editorial do seminário Brasil de Fato. É autor, entre outros livros, de América que não está na mídia, Dossiê Tim Lopes - Fantástico/IBOPE Direto da Redação

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