Paulo Moreira Leite vai no cerne da questão. A roubalheira realizada pelo PSDB no estado de São Paulo só veio à tona porque a Siemens resolveu abrir o jogo.
Foram quase 20 anos de relação promíscua entre Rede Globo, Folha, Estadão, Veja e assemelhados da velha mídia.
PSDB lavava as mãos da velha mídia em contratos publicitários e contratava serviços e produtos.
Grupo Abril encheu as escolas paulistas de seus produtos a partir das relações promíscuas e escondendo a roubalheira do PSDB.
Globo da mesma forma, fez contratos com o governo paulista e prefeitura de São Paulo.
Folha e Estadão jogavam as suas porcarias dentro das escolas a custa do dinheiro público, que financiava o silêncio em relação à roubalheira nos contratos e licitações realizadas pelo PSDB no governo e na prefeitura paulista.
No entanto, as multinacionais fiscalizadas pelos seus respectivos governos em fraudes, resolveram abrir o jogo e as propinas que pagavam para o PSDB.
Calcula-se bilhões desviados das obras do metrô e dos trens paulistas.
O povo paulista cansado, enfrentando filas, serviços precários no transporte público de São Paulo.
Enquanto isso o PSDB roubava os cofres paulistas com a leniência permissiva e vergonhosa da Rede Globo, Folha, Veja e Estadão
Esta mídia velha se locupletava com o dinheiro público, realizando contratos vantajosos com os governos do PSDB (inundando as escolas e os professores com o seus lixos - jornais, revistas, etc.)
Veja a matéria abaixo de Paulo Moreira Leite - jornalista insuspeito.
Paulo Moreira Leite
Diretor da Sucursal da ISTOÉ em
Brasília, é autor de "A Outra História do Mensalão". Foi correspondente
em Paris e Washington e ocupou postos de direção na VEJA e na Época.
Também escreveu "A Mulher que Era o Outro General da Casa".
A blindagem tucana
O esquema de autoproteção só foi vencido por uma multinacional alemã, a Siemens, que tomou a decisão de pedir um acordo de leniência
Ainda
é cedo para procurar equivalências entre o esquema financeiro que deu
origem ao mensalão petista e o esquema que está por trás dos negócios
sombrios que envolvem duas décadas de gestão tucana em São Paulo.
O que já se pode assegurar é que em matéria de autoproteção o esquema tucano mostrou-se muito mais eficiente.
A
blindagem tucana era tão bem sucedida que só foi vencida por uma
multinacional alemã, a Siemens, que tomou a decisão de pedir um acordo
de leniência junto às autoridades brasileiras, confessando duas décadas
de práticas condenáveis, apresentando nomes, cargos e endereços.
Foi essa iniciativa, que envolve uma das maiores empresas do mundo, que mudou a história.
As
primeiras denuncias sobre o propinoduto tucano remetem a 1998 e, como
se vê, jamais foram apuradas nem investigadas como se deveria.
Adormeceram em inquéritos que não esclareceram todas as provas e
indícios. A imprensa nunca mostrou o mesmo apetite para explicar o que
acontecia.
Se
há algo realmente novo a ser apurado hoje consiste em perguntar por que
havia tantos indícios e pouco se investigou, ao contrário do que se fez
no mensalão petista.
Num
país que hoje debate até erros e possíveis abusos ocorridos no
julgamento do mensalão, que traiam a vontade de punir os acusados de
qualquer maneira, ninguém irá acusar o procurador Antônio Carlos
Fernandes, nem seu sucessor Roberto Gurgel nem o relator Joaquim Barbosa
de fazer corpo mole, certo?
A recíproca não é verdadeira.
Mesmo
reportagens pioneiras sobre o propinoduto, como a de Gilberto
Nascimento, que em 2009 mostrou tanta coisa que hoje deixa tanta gente
boquiaberta em relação ao PSDB paulista, não causaram ruído nem
preocupação. Neste período, denuncias parciais sobre o caso entravam e
saíam dos jornais, de forma esporádica e superficial.
A
situação se modificou quando ISTOÉ permaneceu duas semanas consecutivas
nas bancas, com duas capas dedicadas ao assunto. As reportagens de Alan
Rodrigues, Pedro Marcondes de Moura e Sergio Pardellas trouxeram
revelações importantíssimas e consolidadas sobre as entranhas do cartel
de empresas que administrava o esquema.
ISTOÉ
faz muito bem em lembrar, na edição que acaba de chega às bancas, a
existência de dezenas de inquéritos e investigações iniciadas e
encerradas sem maiores consequências. A revista mostra que ninguém pode
alegar que não sabia de nada.
O
dado político é simples. Se o mensalão petista tivesse sido apurado e
investigado no mesmo ritmo do propinoduto tucano, que levou quinze anos
para ganhar a estatura atual, apenas em 2020 teríamos uma CPI para ouvir
as denúncias de Roberto Jefferson. Em vez de ser retirado à força da
Casa Civil, José Dirceu quem sabe tivesse sido promovido a candidato
presidencial, em 2010, e em 2013, como sonhavam tantos petistas, pudesse
estar sentado na cadeira de Dilma Rousseff. Ou talvez Lula tivesse
escolhido Antonio Palocci como sucessor.
Em
qualquer caso, a palavra mensalão ainda não faria parte do vocabulário
dos brasileiros. Joaquim Barbosa até poderia ter virado ministro do
Supremo – afinal, desde a posse Lula queria colocar um ministro negro no
STF – mas dificilmente teria acumulado tanta popularidade em função de
um julgamento que talvez só fosse ocorrer, quem sabe, em 2027.
Seguindo
nessa pequena ficção científica, também seria curioso perguntar quais,
entre os líderes do PSDB, quais teriam sido levados ao banco dos réus.
Teriam
direito a um julgamento isento ou teríamos aplicado a teoria do domínio
do fato? Ou, a exemplo do mensalão PSDB-MG, teriam sido todos levados a
um tribunal de primeira instância? Os juízes se divertiriam fazendo
piadinhas sobre os tucanos e seus discursos éticos?
Basta colocar rostos e nomes nos dois escândalos para compreender que nunca teriam o mesmo desfecho, certo?
Até
agora, nem a Assembléia Legislativa nem o Congresso conseguiram
assinaturas para abrir uma CPI. É um recorde, quando se lembra que,
entre 2005 e 2006, funcionavam três CPIs para tratar do mensalão.
O
governador Geraldo Alckmin decidiu montar uma comissão para acompanhar
as investigações. Imagine se Lula tivesse feito a mesma coisa, em 2005.
No mínimo teria sido acusado de usar o “aparelho petista” para
influenciar os trabalhos do Congresso e da Justiça, certo?
A semelhança entre os escândalos não se encontra nos personagens, nem em seus compromissos políticos.
A
semelhança reside no caráter do Estado brasileiro, na sua fraqueza para
se proteger de interesses privados que procuram alugar e controlar o
poder político.
É um drama que está na origem do mensalão petista e ajuda a entender a prolongada e impune existência do propinoduto tucano.
Depois
de ensinar que a história ocorre uma vez como tragédia e uma segunda,
como farsa, Karl Marx nos lembrou que os homens não atuam sob condições
ideais, que aprendem nos livros de boas maneiras nem nos cursos de
civismo, mas atuam sob condições dadas, que herdaram de seus
antepassados.
O
discurso moralista gosta de atribuir a corrupção à falta de escrúpulos
de nossos políticos, o que é uma visão ingênua e perigosa.
Não
há dúvida de que pessoas inescrupulosas podem enriquecer com o dinheiro
dos esquemas políticos. (Também há pessoas inescrupulosas que
enriquecem na iniciativa privada, na próxima esquina, no primeiro
botequim e até em aniversário de criança, vamos combinar).
Mas
o dinheiro dos partidos, que circulou nos dois casos, é fruto da
natureza distorcida e abrutalhada de nosso regime político, onde a
democracia foi acompanhada por uma libertinagem de alta tolerância nas
regras financeiras, sob medida para que o Estado pudesse ser capturado e
alugado pelas potencias privadas.
Numa
sociologia rápida, pode-se dizer que, com o fim da ditadura militar, a
turma do alto da pirâmide passou a utilizar o sistema privado de
financiamento de campanha como um contrapeso para enfrentar demandas
populares.
Num
regime democrático, a questão social não pode ser um caso de cadeira de
dragão no DOI-CODI, não é mesmo? Tenta-se, então, amaciar o pessoal de
cima.
É
por isso, e não por outra coisa, que sempre se tratou com palavras de
horror fingido todo esforço para regulamentar verbas de campanha e mesmo
para impedir que eleitores de R$ 1 bilhão de votos pudessem se impor
sobre um regime que, no papel, prevê a regra de que l homem = 1 voto.
Neste aspecto, as confissões dos executivos da Siemens contém ensinamentos úteis a todos.
Um
dos mais preciosos é o diário de um gerente, que detalha as negociações
para a construção da linha 5 do metrô paulista. Fica claro, ali, que as
empresas privadas são senhoras da situação. Negociam acordos, partilham
obras, serviços e, é claro, verbas. Interessado no metrô, uma obra mais
do que necessária, tanto para a população como para seus planos
políticos, o governo – o titular, na época, era Mário Covas – está
reduzido a impotência absoluta.
Não
tem força política para impor aquilo que a lei manda, que é a
concorrência impessoal e absoluta entre as partes. Não lhe passa pela
cabeça denunciar suas práticas à Justiça.
Em
tempos de privatização acelerada, novidade que o PSDB ajudava a trazer
ao país na época, junto com controles de gastos que proibiam qualquer
gasto maior, não se cogita a possibilidade de entregar um investimento
tão grandioso ao Estado.
Nessa
situação o governo é forçado a ceder ao cartel de falsos concorrentes e
adversários de araque, sob o risco de enfrentar ações judiciais,
protestos e investigações que irão paralisar os investimentos.
É
assim que o governador, chamado de “cliente” no diário, manda dizer que
quer que “eles se entendam”. O “cliente” também avisa que após o acordo
entre os concorrentes, irá recusar reclamações e queixas futuras.
Num
artigo sobre o caso, a colunista Maria Cristina Fernandes, do Valor,
recorda que, com o passar dos anos, os governos petistas também fizeram a
mesma coisa, instalando no ministério dos Transportes – armazém de
gastos de vulto -- partidos com “notória especialização nos contratos da
política.”
Essa situação cinzenta tem uma finalidade. Quer-se impedir o surgimento de novos entraves a investimentos necessários ao país.
Bobagem querer enxergar o que se passa nos bastidores com olhares simplórios do simples moralismo.
O
país necessita de investimentos para criar empregos e se desenvolver.
As obras de infraestrutura, como metrô, se destinam a superar uma
omissão histórica. A questão é política e envolve a definição de regras
que permitam a democracia brasileira recuperar sua soberania, mantendo o
dinheiro dos interesses privados longe da política e dos políticos. Seu
lugar é a economia e não o Estado.
Nós
sabemos que a necessidade de uma reforma política é apoiada por 85% dos
brasileiros. Ela pode proibir o uso de dinheiro privado no
financiamento político, cortando o laço material que se encontra na
origem de tudo. Um escândalo desse tamanho pode ser de grande utilidade
neste debate.
Quem
dizia que o debate sobre reforma eleitoral era desculpa do adversário
tem a oportunidade de assumir uma postura honesta e encarar a
discussão. Não se trata de uma guerra de propineiros x mensaleiros mas
de um esforço para emancipar a democracia de outros interesses além da
soberania popular.
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