O médico cubano, o Facebook e a massa
A foto do profissional de saúde sendo vaiado foi vista nesta
terça-feira por milhões de pessoas na rede social, de forma espontânea.
Não há campanha de TV que tenha a mesma eficácia.
por Lino Bocchini
por Lino Bocchini
A foto de Jarbas Oliveira, da Folhapress, em que médicas de Fortaleza
vaiam um médico cubano, circulou o Brasil ontem e sua repercussão
fizeram pelo Mais Médicos e a vinda dos profissionais de saúde
estrangeiros mais do que qualquer campanha em horário nobre da TV
poderia fazer. Manifestar-se publicamente de forma contrária à vinda de
médicos estrangeiros em geral –e de Cuba em particular-- ficou mais
difícil depois daquele clique.
Explico o motivo.
Comprada por CartaCapital, a imagem
foi postada em nossa página no Facebook e, até as 13h desta
quarta-feira, já tinha sido compartilhada mais de 20 mil vezes,
“curtida” outras 8 mil vezes e comentada por 4 mil pessoas. A cada vez
que alguém interage com um conteúdo no Facebook, ele aparece em sua
“time line”, e acaba sendo visto por parte de seus contatos. O Facebook
fornece ao administrador de páginas corporativas -como a de CartaCapital-
o total de pessoas “impactadas” pelo post. Ou seja, em quantas na time
line de quantas pessoas aquela informação foi vista. Neste caso, foram
1,5 milhão de pessoas.
O fenômeno ocorreu em algumas páginas pessoais. Na minha mesmo, onde postei uma foto da capa
do jornal que tirei com meu celular, os números são semelhantes aos da
página da revista, então faz sentido supor que um número semelhante de
pessoas foram impactadas. O paraense Marcus Pessoa postou em sua página
pessoal uma montagem simples,
ladeando a foto da Folhapress e uma imagem PB de Little Rock (EUA), de
1957, que mostra uma estudante negra chegando para seu primeiro dia de
aula sem separação racial –e sendo hostilizada por colegas brancas. Mais
de 30 mil pessoas compartilharam. Na página do Brasil 247 a onda foi
ainda mais forte. Ao ser o primeiro veículo a escrever sobre o assunto e
postar rapidamente na rede no começo da manhã, mais de 200 mil
compartilharam o post. Certamente alguns milhões de pessoas viram esse conteúdo ontem ao longo do dia em sua tela.
Além do enorme impacto positivo na opinião pública quanto a vinda dos
médicos estrangeiros, fica claro o potencial do Facebook enquanto
comunicação de massa, pelo menos no Brasil. Os números batem a audiência
da maioria dos telejornais, e ainda vêm acompanhados de um juízo de
valor, de opinião. E isso, como se diz, “agrega valor”, especialmente
num ambiente de posições exacerbadas –e muitas vezes pouco equilibradas.
O poder da criação de Mark Zuckerberg é bastante útil para gerar
contrapontos aos grandes veículos de comunicação e disputar o imaginário
e a opinião da população. Segundo dados do próprio Facebook, há 76
milhões de contas ativas no Brasil. Ok, outras dezenas de milhões de
pessoas estão fora, mas praticamente a totalidade dos profissionais de
comunicação e da parcela mais jovem da nação está diariamente se
informando e formando sua opinião pelo que veem em sua "time line". Isso
não é pouca coisa. Falar que 10 milhões de pessoas debateram o assunto
ontem na rede social é estimativa modesta, e o número real é
praticamente impossível de ser aferido mesmo pela empresa.
O Facebook como ferramenta de comunicação, tornando cada um ao mesmo
tempo emissor de informação e comentarista pode ser interessante, ainda
mais levando-se em consideração que quase toda nossa mídia tradicional
trabalha dentro de uma mesma linha ideológica. No caso do médico cubano,
escancarou o viés racista da ação, o que é obviamente bom.
Esse protagonismo do Facebook enquanto pauteiro geral da nação,
influenciando grandes veículos, blogs e até conversas de boteco ou no
almoço da firma, contudo, é perigoso. Haja visto o caminho que os
protestos de junho ameaçaram tomar em um determinado momento. Ainda mais
porque muita gente enxerga Facebook como se fosse um serviço público.
Pessoalmente tenho críticas a certas políticas da empresa, como o veto a
qualquer tipo de nudez e a proteção tênue da privacidade dos usuários.
Mas trata-se de uma empresa privada, com interesses comerciais claros e
que dita as regras que bem entender, desde que não desrespeite a
legislação dos países em que atua. A função primordial do Facebook é dar
lucro, e não pra prestar um serviço livre e gratuito à população.
Extraído do blog Esquerdopata
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