Mensagem contra a xenofobia
Autor(es): Paulo Silva Pinto
Correio Braziliense - 07/10/2011
Em visita à cidade natal do pai, onde recebeu tratamento de celebridade, Dilma defende a importância da convivência entre povos diferentes para a construção de uma nação. Presidente inicia hoje na Turquia a última etapa da viagem à Europa
Gabrovo — A viagem da presidente Dilma Rousseff à Bulgária atingiu ontem o ápice emocional com a visita à cidade onde nasceu o seu pai, distante 220 km de Sófia, a capital búlgara. No centro do país, em meio às montanhas do Bálcãs, Gabrovo é a terra natal de Petar Roussev, que emigrou para o Brasil na década de 1940 e passou a ser conhecido por Pedro Rousseff. Ele estudou na escola Aprilov, a mais antiga do país, que ontem serviu de cenário para o discurso da filha.
A presidente preocupou-se em não se limitar aos laços pessoais com a cidade e o país. Referiu-se à história do pai como exemplo de tolerância na convivência de povos diferentes. "O Brasil é um país que soube acolher imigrantes de todo o mundo", disse ela, que em seguida lembrou a importância de pessoas de fora da Bulgária para a construção do país, citando especificamente imigrantes da Líbia.
Em países europeus, existe grande discriminação contra imigrantes, sobretudo os africanos. Minorias étnicas também enfrentam problemas. Neste mês, no sul da Bulgária, conflitos com ciganos provocaram a morte de duas pessoas.
O presidente da Bulgária, Georgi Parvanov, propôs que a escola implante um curso de português. Dilma disse que quer também que seja criado um curso de búlgaro em Brasília, para aproximar os dois povos. Ela sabe falar apenas uma palavra em búlgaro: obrigado.
Ainda na escola, Dilma atribuiu "a visão de mundo generosa de seu pai" à educação que recebeu, e afirmou que com ele aprendeu a se interessar por outros povos. Em entrevista a jornalistas na saída da escola, a presidente disse que a passagem pela Bulgária consolidou sua imagem sobre a riqueza da diversidade do Brasil. "A visita aprofunda a minha consciência de que o Brasil é um país fantástico. Um homem sai daqui 80 anos atrás, imigrante, num mundo cheio de xenofobia. Isso não é usual." Em seguida completou: "Um país em que a filha de um imigrante de primeira geração se elege presidente da República é um país que tem o compromisso de olhar o mundo e as mulheres como iguais". Para Dilma, essa característica faz do Brasil a nação do futuro, "não naquele sentido de que o Brasil um dia ia ser grande".
Diploma (E) e certidão de nascimento do pai de Dilma, Pedro Rousseff. Retrato (D) de Vana Roussev, tia da presidente, de quem recebeu o segundo nome
Emoção
Dilma disse que se emocionou ao passar pelas ruas da cidade natal do pai. "Achei muito bonita e o pessoal muito parecido com os brasileiros na afetividade, no jeito de se aproximar." Durante o discurso na escola, Dilma afirmou que aquele momento era um dos mais emocionantes em sua vida, comparável ao que sentiu quando se despediu das companheiras na prisão, durante o regime militar; ao nascimento da filha; à chegada do neto; e à eleição como presidente da República. "Agora, mais uma vez, me emociono profundamente aqui em Gabrovo", disse ela, com a voz embargada. Mais tarde, na entrevista, a presidente ficou confusa e não conseguiu formular frases — ela tinha um discurso escrito, mas preferiu falar sem ler, olhando o texto apenas quando era feita a tradução.
Não foi só Dilma que ficou emocionada. A cidade parou para vê-la. Nas sacadas, ou nas ruas, estavam quase todos os 58 mil habitantes. "Se voltar a Caratinga já é emocionante, imagine voltar a Gabrovo, e como presidente", brincou o escritor Ziraldo, que integrava a comitiva oficial, referindo-se à cidade mineira onde nasceu. "Gabrovo e Piracicaba (SP) têm salões de humor, em que são premiados cartunistas, entre os mais antigos do mundo ainda ativos", disse Ziraldo.
Na escola e na rua, Dilma recebeu cumprimentos. Um dos que conseguiram se aproximar da presidente foi Cristofen Ivanov, de 82 anos, professor aposentado da escola, que vestia uma camisa amarela e portava uma bandeira do Brasil.
Encontro com parentes
Depois do discurso na escola, Dilma seguiu para o cemitério, acompanhada de uma prima. Lá, visitou o túmulo do meio-irmão Luben Kamen Roussev, que morreu em 2007, quando ela estava prestes para viajar à Bulgária e conhecê-lo — os dois nunca se encontraram.
Depois de ir ao cemitério, a presidente encontrou-se com as primas com quem havia jantado na quarta-feira: Vesela Kolev e Toshla Kovacheva, respectivamente filha e mãe, moradoras de Gabrovo, além de Tsana Kamenova e Ralitsa Neguentsova. Estava também presente o primo Tzonyu Kornazhev, morador de Sófia.
A prima Tsana contou que todas choraram no encontro, menos Dilma. O primo Kornazhev disse que explicou a Dilma várias relações na família. "Acho que foi útil." Ele ganhou um cartão de visitas em que se lê "Dilma Rousseff, presidente da República", com o endereço do Palácio do Planalto. No verso, estava anotado a mão um número de telefone celular. No museu da cidade, onde houve o encontro, foi montada uma exposição com fotografias de antepassados de Dilma. Havia também o diploma de seu pai e o registro de nascimento.
Pela manhã, a presidente visitou o castelo Tsavets, em Veliko Tornovo, que, na Idade Média, era a capital do reino onde hoje está a Bulgária. À tarde, depois do encontro com a família, Dilma embarcou para Ancara, na Turquia, etapa final desta viagem.
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