Katarina Peixoto
Ato pela legitimidade do processo eleitoral, em apoio a Dilma Rousseff, reuniu milhares de pessoas e recompôs uma frente democrática desfeita há mais de 20 anos, no Rio Grande do Sul.
Quem esteve no Hotel Plaza San Rafael na quinta-feira, dia 14 de outubro, pôde ver e ouvir quem lutou e reconstruiu o país depois da longa noite da ditadura militar. A percepção que ficou, do encontro poderoso, foi que estão todos juntos, de novo, desta vez pela unidade política do país.
“Nós estamos todos aqui; nós, que já disputamos eleições uns contra os outros, olhando nos olhos uns dos outros, de uma maneira honrada, porque fizemos disputas honradas, políticas, ao longo de nossas vidas”, lembrou Tarso Genro, do PT, governador eleito do Rio Grande do Sul e coordenador da campanha de Dilma Rousseff no RS, a todos da platéia e aos membros da mesa heterogênea que se formou, em defesa da democracia e da candidata à Presidenta. Quem conhece as caras que frequentam essas agendas de campanha sabe que não é exagero algum dizer que o que aconteceu ontem em Porto Alegre foi um acontecimento histórico.
O que se viu foi a reconstituição de uma grande frente democrática, contra o ódio, o obscurantismo e a irracionalidade, e em defesa da Política. Dentre as duas mil pessoas havia sobretudo caras novas, que não se conheciam, militantes heterogêneos, homens e mulheres de diversas trajetórias, juventudes de partidos como PMDB e PTB. Acontecimento inédito pelo menos para quem é, hoje, membro da juventude de algum partido, que não viveu sob a ditadura, que não lutou pelo direito de votar. Para os que cresceram na luta pela redemocratização do país, parecia uma viagem ao passado, ao anos 80-84, à luta pelas diretas, pela legalidade rompida em 64. Para todos os demais, era um momento de clareza, que se via em cada face, em cada sorriso e na tez de gravidade que portavam.
Aldo Pinto, membro histórico dos trabalhistas que ganharam abrigo sob a frente do MDB, pegou o microfone e defendeu Dilma. Mendes Ribeiro Filho, deputado federal eleito pelo PMDB, cuja rivalidade com o PT no RS dispensa apresentações, fez uma demonstração de força política e eleitoral, apresentando prefeitos do PMDB responsáveis pela campanha de Dilma nos seus municípios e a juventude do PMDB. O tom de recusa da volta ao passado que “quase destruiu o país” e de recusa do que foi identificado como uma histórica “agenda paulista” liberal de periferia, para (ou seja, contra) o país ganhou força, ecoando os avisos históricos de Aldo Pinto:
“Não podemos deixar de eleger uma gaúcha presidenta da República”, disse Ribeiro Filho, arrancando aplausos entusiasmados dos milhares presentes.
Sérgio Zambiasi, senador pelo PTB fez o discurso mais surpreendente da noite. Ao senador coube o lembrete às mulheres da ameaça que a campanha de Serra passou a representar. “Amanhã serão vocês as vítimas dessa campanha sórdida”, alertou, para defender que estava nas mãos delas não permitir que a intolerância ameaçasse sua integridade. Foi ovacionado, o senador, por improváveis aplausos de militantes até outro dia adversários ferozes. O atual prefeito de Porto Alegre, José Fortunati – PDT -, ex-petista, denunciou estarrecido a quantidade de emails difamatórios que vinha recebendo, e afirmou, indignado, que nunca em toda a sua vida política tinha visto uma campanha tão sórdida.
Sordidez, obscurantismo, covardia, ameaça à democracia, divisão do país, exclusão dos mais pobres e ruptura política foram os termos comuns a todos da grande mesa que se (re) formou. Havia muitos, mas muitos prefeitos naquele salão. Em determinada altura chegaram os pastores evangélicos. Uma menina pega o microfone e canta uma música que compôs para a Dilma. Estava todo mundo junto, de novo, contra a ditadura, quer dizer, contra as mesmas forças da ditadura. Raul Pont, presidente estadual do PT, deputado estadual e ex-prefeito de Porto Alegre deu uma aula de conjuntura, apontou o caminho da campanha no estado e teve de ouvir, do deputado do PMDB, aos risos: “Quem diria, hein, Raul, que estaríamos aqui, nós dois juntos. Que bom que nós dois crescemos”. Gargalhada geral. O clima era de de ânimo, vigor e clareza sobre o que está em jogo.
Então Tarso pegou o microfone e deu o mais grave dos informes, convocando a uma resposta cívica e pluripartidária, em defesa da legitimidade do processo eleitoral. Disse que as escolhas do consórcio da candidatura Serra estavam flertando com uma possibilidade de ruptura política no país, de ponto de não reconstituição. A sordidez e a covardia, parasitando o obscurantismo religioso estavam sendo perigosamente convidadas ao processo eleitoral, ameaçando a racionalidade e embotando o discernimento.
O governador eleito falou em golpe político, o qual pode instaurar uma conjuntura de ódio pior que a pré-64, porque menos clara e menos política. O problema de convidar a extra-política para a arena da política é que a extra-política, sobretudo a religiosa, não conhece limites e não aceita quando lhe dizem que a festa acabou. E é aí que a Política e só a Política pode aprumar as coisas, de volta.
Tarso então chamou para uma marcha, em defesa da democracia neste domingo, no Brique da Redenção, a partir das 10hs, em Porto Alegre.
Pela legalidade, contra a ditadura, pela redemocratização, contra o neoliberalismo, pelo povo pobre, contra o ódio, o machismo, o racismo, a homofobia e o obscurantismo. Contra a privatização, porque o Pré-Sal é nosso. Pela Universidade, contra o desmonte da pesquisa e das políticas do governo Lula de extinção da miséria. Cada um com sua bandeira, porque todos estão juntos, de novo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário