Para Carlos Melo e José Paulo Martins, petista mostrou segurança, enquanto tucano errou ao se colocar como ‘mais estatista do que o PT’
André Mascarenhas, do estadão.com.br
SÃO PAULO – Cientistas políticos convidados pelo Radar Político para assistir ao debate da TV Record concordaram na análise de que a petista Dilma Rousseff “cresceu” ao longo dos últimos debates, enquanto o tucano José Serra se perdeu na tentativa de parecer um político carismático. Na avaliação de Carlos Melo, do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper), e José Paulo Martins, da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo, o encontro desta segunda-feira, 25, começou tenso, com todos os ataques de ordem ética concentrados no primeiro bloco para aproveitar o pico da audiência.
“Ele foi muito mais agressivo, mas não golpeou a ponto de ela ficar grogue”, disse Melo ao avaliar a primeira parte da atração. Para Martins, os candidatos apostaram em mais do mesmo. “O que vêm agora? Tudo o que já era esperado veio no primeiro bloco”, questionou.
Para os cientistas políticos, a estratégia era atingir um maior número de pessoas antes que os televisores começassem a ser desligados, com o avançar das horas. “No primeiro bloco você tem que mostrar um certo ímpeto”, analisou Melo.
Segundo o cientista político do Insper, Serra estava “mais agressivo do que nos outros debates”. “Ele não tem outra alternativa a não ser roubar os votos dela. Mas é arriscado atacar”, acrescentou Martins, para quem o eleitor identifica o problema da corrupção em governos do PT e do PSDB.
Foi, inclusive, essa a avaliação de Melo quando os casos mais recentes envolvendo os dois candidatos surgiram no debate, ainda no primeiro bloco. “Quem com Erenice fere, com Paulo Preto será ferido”, brincou o analista do Insper, após Serra citar as suspeitas de tráfico de influência envolvendo a ex-ministra da Casa Civil Erenice Guerra. O ataque foi prontamente respondido por Dilma, que lembrou o suposto desvio de recursos de caixa dois da campanha tucana pelo ex-diretor da Dersa Paulo Petro.
Privatizações. No segundo bloco, ganhou força o tema privatizações, que foi puxado pelo próprio tucano, numa clara estratégia de se manter no ataque. Na análise dos cientistas políticos, a tentativa de Serra de criticar uma suposta privatização do pré-sal pelo PT soou esquizofrênica, uma vez que vai contra as bandeiras históricas do PSDB.
“Serra vestiu a carapuça e agora quer ser mais realista que o rei, mais estatista que o PT”, resumiu Melo. “Vai contra a base social do PSDB”, acrescentou. Na opinião do analista, a estratégia não agrega votos a Serra pois “a base social do PT já está com Dilma”.
Evolução. Na avaliação dos dois cientistas políticos, o debate desta segunda consolidou a evolução de Dilma ao longo dos últimos debates. “Eu diria que a novidade é a segurança da Dilma”, disse Martins. “Mas acho que as pesquisas ajudam um pouco”, acrescentou.
Ainda segundo eles, a tentativa de Serra de soar carismático não funciona. “O problema é que o Serra tem um perfil… Ele é a figura racional por excelência. Quando ele faz esse discurso muito emocional, você não o reconhece”, disse Melo, para quem “Dilma tem milhões de defeitos, mas é impressionante como ela aprende rápido”.
Estilo ‘bateu, levou’ pode afastar eleitores
Análise: Marcelo de Moraes – O Estado de S.Paulo
Numa disputa que teve mais de 34 milhões de eleitores se abstendo, anulando suas escolhas ou votando em branco no primeiro turno, chega a ser surpreendente que os candidatos à Presidência utilizem o penúltimo debate na televisão para abusar da troca de acusações.
A menos de uma semana da eleição, a petista Dilma Rousseff e o tucano José Serra optaram por não deixar nenhum ataque sem resposta. Mesmo que, para isso, precisassem abrir mão de aprofundar suas ideias sobre temas centrais, como política cambial, carga tributária, segurança pública. Em compensação, não faltaram acusações mútuas de serem mentirosos e de terem aliados envolvidos com escândalos.
É uma estratégia perigosa e de resultado imprevisível. Críticas são essenciais em debates. O estilo “bateu, levou”, consagrado durante o governo de Fernando Collor, não. Pior: nivela por baixo as duas candidaturas.
O calor da disputa pode ter tirado o foco dos candidatos. Pode ter tirado algo mais: votos, que podem migrar para abstenção ou anulação.
Ambos vão ao ataque, mas empate persiste
Análise: José Paulo Martins Júnior – O Estado de S.Paulo
É difícil apontar um vencedor do debate de ontem, a exemplo do que ocorreu nos anteriores. Os temas também soaram conhecidos, mas vieram em falas mais duras do que vinha ocorrendo. Por ter começado após as 23 horas, tanto Dilma Rousseff como José Serra procuraram colocar os tópicos que consideram mais importantes e que podem tirar votos do adversário, como os escândalos Erenice Guerra e Paulo Preto, e reafirmaram suas posições em relação ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e à saúde pública.
Foi Serra quem trouxe o tema das privatizações ao debate e acabou articulando um discurso esquizofrênico, tentando se mostrar mais nacionalista que Dilma. A petista, por sua vez, pareceu mais segura que nos debates anteriores – ainda tropeçou em alguns momentos, mas cometeu gafes menos graves. Para cativar eleitores de Marina Silva, ambos fizeram promessas em defesa do meio ambiente. Ontem, Dilma e Serra elevaram o tom de suas falas, mas mantiveram o placar empatado, o que, nesse momento, tem mais gosto de vitória para a petista que para o tucano.
Uma luta de esgrima perigosa
Análise: Marcus Figueiredo – O Estado de S.Paulo
A primeira grande impressão que fica do debate é que eles esgrimiram muito perigosamente, porque Serra resvalou várias vezes na ofensa pessoal. Como bom debatedor, ele não chegou a ofender, mas a ideia era desqualificar Dilma. Repetiu sistematicamente que o que ela apresenta é tudo mentira, fantasioso e irreal. Com isso, a gente perde o debate e o telespectador é o principal prejudicado. O resultado imediato é Dilma acuada e relativamente nervosa, tentando evitar a possibilidade de ofensas pessoais.
Apesar do clima belicoso, a diferença entre os candidatos – e não é o candidato sozinho, porque ele é parte de uma aliança – ficou clara no que se refere à Petrobrás, ao pré-sal e ao MST. Dilma defende transformar a riqueza do pré-sal para financiar o desenvolvimento social. Serra não deixa claro o que fará com esse recursos. Nesse particular, quando o assunto surge, o tucano diz que Dilma estragou a Petrobrás. A segunda diferença é uma frase que parece solta, mas não é. Dilma diz que a questão do MST é social, não de polícia. Serra sugere um tratamento de confronto.
Serra incisivo, Dilma vacinada
Análise: Carlos Melo – O Estado de S.Paulo
Mais um debate, o penúltimo da série; candidatos e público parecem cansados, desgastados. Ainda assim, não é hora para esmorecer, entregar os pontos. José Serra precisava mostrar energia e desconstruir a adversária, que lidera a disputa em todas as pesquisas.
Isso o levou a mostrar-se mais incisivo no primeiro bloco, quando o encontro ainda não entrara pela madrugada e a audiência não era tão pequena. Buscou as questões de moralidade pública – que segundo as pesquisas foram o ponto fraco de Dilma, no primeiro turno. Mas, quem com Erenice fere, com Paulo Preto será ferido. Dilma mostrou-se calma, ligeiramente fria. Tinha vacinas e as usou o tempo todo.
Ultrapassada a fase da moralidade pública, o tucano trouxe à luz a questão da Petrobrás, acusando Dilma e o PT de terem “privatizado” o petróleo para empresas nacionais e “estrangeiras”. Contraditoriamente com sua base social e com a história de seu partido, assumiu um discurso ao feitio do PT, mais realista que o rei, foi mais estatista que Dilma. Soou esquizofrênico.
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