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quarta-feira, 1 de junho de 2016

Danilo Martuscelli,da UFFS: acabou o efeito manada do impeachment. E a lógica antipopular da gestão Temer só tende a agravar a crise

‘Efeito manada’ que levou ao impeachment acabou, diz cientista político
Para Danilo Martuscelli, da UFFS, a empolgação que abriu caminho para aprovação do afastamento de Dilma já desapareceu, e a lógica antipopular da gestão Temer só tende a agravar a crise
Mauricio Puls 01/06/2016 11:30, atualizada às 01/06/2016 15:08 - Brasileiros

Manifestantes protestam contra o presidente interino Michel Temer – Foto: Camila Boehm/Agência Brasil
O cientista político Danilo Martuscelli, da UFFS (Universidade Federal da Fronteira Sul), entende que o “efeito manada” que empolgou a votação da admissibilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff tem perdido força: à medida que cresce a resistência nas ruas, “fica feio sair na foto ao lado de um governo impopular”, o que tem estimulado os políticos oportunistas a “pular do barco”. Mas ele observa que as perspectivas de reverter o afastamento de Dilma não estão muito claras.

Martuscelli observa que o governo interino de Michel Temer (PMDB) segue uma lógica antipopular e recessiva que só tende a agravar a crise política e econômica. Ele observa que o grupo do ministro José Serra (PSDB) “está tentando ganhar espaço no interior do governo interino, valendo-se do desgaste de algumas peças-chave da base política de Temer”, como os senadores Romero Jucá e Renan Calheiros.

O professor da UFFS assinala ainda que “nossa frágil democracia representativa vem sendo substituída pela ditadura da toga”, que é politicamente muito mais regressiva, pois os integrantes do Judiciário e do Ministério Público nem sequer contam “com o respaldo do voto popular”: o País se tornou refém de “uma pequeníssima minoria situada no aparelho Judiciário, que se sente autorizada a ignorar a decisão das urnas”.



Em menos de 20 dias, Temer foi obrigado a demitir dois ministros em razão da divulgação de conversas. Como você interpreta esses vazamentos?

Os vazamentos dos áudios têm desarticulado politicamente o governo interino e têm revelado, ao mesmo tempo, toda a arquitetura do golpe. O ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado chegou a afirmar que, se as investigações da Lava Jato continuassem, sobrariam uns seis parlamentares no Congresso Nacional. Isso é grave e é um sintoma de que muitos dos deputados e senadores devem ter sido favoráveis à admissibilidade do impeachment da presidente Dilma Rousseff por estarem com rabo preso com algum esquema de corrupção. Desde a votação na Câmara não param de ser divulgados casos de corrupção envolvendo parlamentares pró-impeachment, ou mesmo seus familiares. Barrar as investigações da Lava Jato é a palavra de ordem mais forte nessas gravações.

O Ministério Público e o Judiciário têm seguido uma dinâmica autônoma, alheia à esfera política, ou existem sinais de que alguns setores desses poderes querem enfraquecer o Executivo ou mantê-lo sob tutela?

Os órgãos responsáveis pela aplicação da lei sempre se apresentam como instâncias alheias à política, mas, de fato, fazem política a todo momento. O que chama a atenção na conjuntura mais recente, especialmente na atual crise, é a sobrepolitização do Judiciário. A nossa frágil democracia representativa vem sendo substituída pela ditadura da toga, que é algo politicamente mais regressivo, pois nem sequer conta com o respaldo do voto popular para suas decisões. Se há sinais de que o Ministério Público Federal e o Judiciário estão promovendo ações para enfraquecer o Executivo, isso não nos deve levar a concluir que tais órgãos contribuirão para a consolidação da democracia no país, já que até agora tais instâncias, com o apoio da mídia corporativa, de uma maioria de ocasião no Congresso Nacional e de amplos setores do empresariado, só contribuíram para golpear a democracia e a presidente eleita pelo voto popular. Enfim, estamos ficando cada vez mais reféns das decisões tomadas por uma pequeníssima minoria situada no aparelho do Judiciário, que se sente autorizada a ignorar a decisão das urnas.

Temer assumiu o poder prometendo cortes no Orçamento e grandes mudanças na Constituição, mas já elevou a previsão do déficit fiscal, parou de falar em CPMF e parece ter deixado a reforma da Previdência para depois. As contradições entre os diversos segmentos sociais que apoiaram o impeachment podem imobilizar o governo?

Antes de mais nada, é preciso lembrar que numa das últimas pesquisas eleitorais para presidente da República, Temer aparecia com apenas 1% a 2% das intenções de voto. Temos, portanto, um presidente interino muito impopular. No dia que assumiu a Presidência ele quis adotar o mesmo lema que os empresários adotaram na crise do “mensalão”: “Chega de falar em crise, vamos trabalhar”. Ocorre que, diferentemente de 2005, vivemos agora sob a combinação explosiva de uma crise econômica comum a crise política. Em nenhum dos dois planos o presidente interino tem dado mostras de que será capaz de superar o quadro atual. Temer nomeou meia dúzia de ministros envolvidos com casos de corrupção; dois ministros já tiveram que deixar os cargos por fazerem parte do esquema de inviabilizar as investigações da Lava Jato; ele próprio é ficha-suja e está inelegível por oito anos; o Congresso Nacional começa a acenar contra alguns pontos de sua política de governo; diretores da CGU colocaram o cargo à disposição em repúdio ao ex-ministro Silveira; cerca de 700 funcionários do BNDES prestaram homenagem ao Luciano Coutinho, ex-diretor do banco; nas ruas, várias são as manifestações reivindicando o “Fora Temer”, organizadas por artistas, estudantes, sem-terra, sem-teto, sindicalistas, ativistas feministas e LGBT etc. Está difícil não pensar em crise, especialmente quando se observa a lógica antipopular e recessiva do ajuste fiscal que o governo interino está tentando implementar. Isso sem contar os ataques aos direitos civis e políticos que estão no horizonte político da base do governo.

Ainda não saiu nenhuma pesquisa sobre a aprovação ao governo Temer, mas há vários sinais de que ela é baixa. A direita abandonou as ruas, enquanto a resistência popular contra o golpe está crescendo. Senadores como Cristovam e Romário emitem sinais de que poderão votar contra o impeachment. Quais são as perspectivas de reverter o afastamento de Dilma?

O efeito manada que empolgou a votação da admissibilidade do impeachment da presidente Dilma tem perdido força. A resistência ao governo tem contribuído bastante para isso. Na medida em que cresce mais essa resistência nas ruas, fica feio sair na foto ao lado de um governo impopular e ser rotulado como golpista. Nessas condições, a primeira iniciativa a ser tomada por alguns oportunistas de plantão é pular fora do barco. Entendo que as perspectivas de reverter o afastamento de Dilma não estão muito claras. Mesmo que consiga revertê-lo, não sei qual será a capacidade de articulação política que a presidente terá para governar.

De imediato, penso que é preciso observar as ações que vem sendo tomadas pelo PSDB, em especial pelo grupo comandado pelo ministro interino José Serra. É possível operar com a hipótese de que o grupo de Serra está tentando ganhar espaço no interior do governo interino, valendo-se do desgaste de algumas peças-chave da base política de Temer, o que inclui o nome do senador Aécio Neves. Mas há também uma ação por fora do governo, que busca a anulação da chapa Dilma-Temer. A recente eleição de Gilmar Mendes para a presidência do TSE pode ser um trunfo importante neste processo.
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