FHC é citado por três jornalistas quanto ao seu envolvimento com a espionagem dos EUA
Livro que relata envolvimento de FHC com a CIA esgota edição
7/1/2014 9:05
Por Redação - do Rio de Janeiro
Por Redação - do Rio de Janeiro
Está esgotado nas duas maiores livrarias do Rio o livro da escritora Frances Stonor Saunders Quem pagou a conta? A CIA na Guerra Fria da cultura,
no qual o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso é acusado,
frontalmente, de receber dinheiro da agência norte-americana de
espionagem, para ajudar os EUA a “venderem melhor sua cultura aos povos
nativos da América do Sul”.
O exemplar, cujo preço varia de R$ 72 a R$
75,00, leva entre 35 e 60 dias para chegar ao leitor, mesmo assim, de
acordo com a disponibilidade no estoque. O interesse sobre a obra da
escritora e ex-editora de Artes da revista britânica The New Statesman, no Brasil, pode ser avaliado ao longo dos cinco anos de seu lançamento.
Quem pagou a conta?, segundo os editores, recebeu “uma ampla
cobertura pela mídia quando foi lançado no exterior”, em 1999. Na obra,
Frances Stonor Saunders narra em detalhes como e por que a CIA, durante
a Guerra Fria, financiou artistas, publicações e intelectuais de centro
e centro-esquerda, num esforço para mantê-los distantes da ideologia
comunista. Cheia de personagens instigantes e memoráveis, entre eles o
ex-presidente brasileiro, “esta é uma das maiores histórias de corrupção
intelectual e artística pelo poder”.
“Não é segredo para ninguém que, com o término da Segunda Guerra
Mundial, a CIA passou a financiar artistas e intelectuais de direita; o
que poucos sabem é que ela também cortejou personalidades de centro e de
esquerda, num esforço para afastar a intelligentsia do comunismo e
aproximá-la do American way of life. No livro, Saunders detalha
como e por que a CIA promoveu congressos culturais, exposições e
concertos, bem como as razões que a levaram a publicar e traduzir nos
Estados Unidos autores alinhados com o governo norte-americano e a
patrocinar a arte abstrata, como tentativa de reduzir o espaço para
qualquer arte com conteúdo social. Além disso, por todo o mundo,
subsidiou jornais críticos do marxismo, do comunismo e de políticas
revolucionárias. Com esta política, foi capaz de angariar o apoio de
alguns dos maiores expoentes do mundo ocidental, a ponto de muitos
passarem a fazer parte de sua folha de pagamentos”.
As publicações Partisan Review, Kenyon Review, New Leader e Encounter
foram algumas das publicações que receberam apoio direto ou indireto
dos cofres da CIA. Entre os intelectuais patrocinados ou promovidos pela
CIA, além de FHC, estavam Irving Kristol, Melvin Lasky, Isaiah
Berlin, Stephen Spender, Sidney Hook, Daniel Bell, Dwight MacDonald,
Robert Lowell e Mary McCarthy, entre outros. Na Europa, havia um
interesse especial na Esquerda Democrática e em ex-esquerdistas, como
Ignacio Silone, Arthur Koestler, Raymond Aron, Michael Josselson e
George Orwell.
O jornalista Sebastião Nery, em 1999, quando o diário conservador carioca Tribuna da Imprensa
ainda circulava em sua versão impressa, comentou em sua coluna que não
seria possível resumir a obra em tão pouco espaço: “São 550 páginas
documentadas, minuciosa e magistralmente escritas”, afirmou.
Dinheiro para FHC
“Numa noite de inverno do ano de 1969, nos escritórios da Fundação
Ford, no Rio, Fernando Henrique teve uma conversa com Peter Bell, o
representante da Fundação Ford no Brasil. Peter Bell se entusiasma e lhe
oferece uma ajuda financeira de US$ 145 mil. Nasce o Cebrap (Centro
Brasileiro de Análise e Planejamento)”. Esta história, que reforça as
afirmações de Saunders, está contada na página 154 do livro Fernando Henrique Cardoso, o Brasil do possível,
da jornalista francesa Brigitte Hersant Leoni (Editora Nova Fronteira,
Rio, 1997, tradução de Dora Rocha). O “inverno do ano de 1969″ era
fevereiro daquele ano.
Há menos de 60 dias, em 13 de dezembro, a ditadura militar havia
lançado o AI-5 e elevado ao máximo o estado de terror após o golpe de
64, “desde o início financiado, comandado e sustentado pelos Estados
Unidos”, como afirma a autora. Centenas de novas cassações e suspensões
de direitos políticos estavam sendo assinadas. As prisões, lotadas. O
ex-presidente Juscelino Kubitcheck e o ex-governador Carlos Lacerda
tinham sido presos. Enquanto isso, Fernando Henrique recebia da poderosa
e notória Fundação Ford uma primeira parcela para fundar o Cebrap. O
total do financiamento nunca foi revelado. Na Universidade de São Paulo,
por onde passou FHC, era voz corrente que o compromisso final dos
norte-americanos girava em torno de US$ 800 mil a US$ 1 milhão.
Segundo reportagem publicada no diário russo Pravda, um ano após o lançamento do livro no Brasil, os norte-americanos “não estavam jogando dinheiro pela janela”.
“Fernando Henrique já tinha serviços prestados. Eles sabiam em quem
estavam aplicando (os dólares)”. Na época, FHC lançara com o economista
chileno Faletto o livro Dependência e desenvolvimento na América Latina,
em que ambos defendiam a tese de que países em desenvolvimento ou mais
atrasados poderiam desenvolver-se mantendo-se dependentes de outros
países mais ricos. Como os Estados Unidos”. A cantilena foi repetida por
FHC, em entrevista concedida ao diário conservador paulistano Folha de S. Paulo, na edição da última terça-feira, a última de 2013.
Com a cobertura e o dinheiro dos norte-americanos, FHC tornou-se, segundo o Pravda,
“uma ‘personalidade internacional’ e passou a dar ‘aulas’ e fazer
‘conferências’ em universidades norte-americanas e européias. Era ‘um
homem da Fundação Ford’. E o que era a Fundação Ford? Uma agente da CIA,
um dos braços da CIA, o serviço secreto dos EUA”.
Principais trechos da pesquisa de Saunders:
1 – “A Fundação Farfield era uma fundação da CIA… As fundações
autênticas, como a Ford, a Rockfeller, a Carnegie, eram consideradas o
tipo melhor e mais plausível de disfarce para os financiamentos…
permitiu que a CIA financiasse um leque aparentemente ilimitado de
programas secretos de ação que afetavam grupos de jovens, sindicatos de
trabalhadores, universidades, editoras e outras instituições privadas”
(pág. 153).
2 – “O uso de fundações filantrópicas era a maneira mais conveniente
de transferir grandes somas para projetos da CIA, sem alertar para sua
origem. Em meados da década de 50, a intromissão no campo das fundações
foi maciça…” (pág. 152). “A CIA e a Fundação Ford, entre outras
agências, haviam montado e financiado um aparelho de intelectuais
escolhidos por sua postura correta na guerra fria” (pág. 443).
3 – “A liberdade cultural não foi barata. A CIA bombeou dezenas de
milhões de dólares… Ela funcionava, na verdade, como o ministério da
Cultura dos Estados Unidos… com a organização sistemática de uma rede de
grupos ou amigos, que trabalhavam de mãos dadas com a CIA, para
proporcionar o financiamento de seus programas secretos” (pág. 147).
4 – “Não conseguíamos gastar tudo. Lembro-me de ter encontrado o
tesoureiro. Santo Deus, disse eu, como podemos gastar isso? Não havia
limites, ninguém tinha que prestar contas. Era impressionante” (pág.
123).
5 – “Surgiu uma profusão de sucursais, não apenas na Europa (havia
escritorios na Alemanha Ocidental, na Grã-Bretanha, na Suécia, na
Dinamarca e na Islândia), mas também noutras regiões: no Japão, na
Índia, na Argentina, no Chile, na Austrália, no Líbano, no México, no
Peru, no Uruguai, na Colômbia, no Paquistão e no Brasil” (pág. 119).
6 – “A ajuda financeira teria de ser complementada por um programa
concentrado de guerra cultural, numa das mais ambiciosas operações
secretas da guerra fria: conquistar a intelectualidade ocidental para a
proposta norte-americana” (pág. 45).
Espionagem e dólares
Não há registros imediatos de que o ex-presidente tenha negado ou
admitido as denúncias constantes nos livros de Sauders e Leoni. Em julho
do ano passado, no entanto, o jornalista Bob Fernandes, apresentador da
TV Gazeta, de São Paulo, publicou artigo no qual repassa o
envolvimento do ex-presidente com os serviços de espionagem dos EUA, sem
que tivesse precisado, posteriormente, negar uma só palavra do que
disse. Segundo Fernandes, “o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso diz
que ‘nunca soube de espionagem da CIA’ no Brasil. O governo atual cobra
explicações dos Estados Unidos”.
“Vamos aos fatos. Entre março de 1999 e abril de 2004, publiquei 15
longas e detalhadas reportagens na revista CartaCapital. Documentos,
nomes, endereços, histórias provavam como os Estados Unidos espionavam o
Brasil.Documentos bancários mostravam como, no governo FHC, a DEA,
agência norte-americana de combate ao tráfico de drogas, pagava
operações da Polícia Federal. Chegava inclusive a depositar na conta de
delegados. Porque aquele era um tempo em que a PF não tinha orçamento
para bancar todas operações e a DEA bancava as de maiores dimensão e
urgência”, garante Fernandes.
Ainda segundo o jornalista, o mínimo de “16 serviços secretos dos EUA
operavam no Brasil. Às segundas-feiras, essas agências realizavam a
‘Reunião da Nação’, na embaixada, em Brasília”.
Bob Fernandes, que foi redator-chefe de CartaCapital, trabalhou nas revistas IstoÉ (BSB e EUA) e Veja, foi repórter da Folha de S.Paulo e do Jornal do Brasil,
afirma ainda que “tudo isso foi revelado com riqueza de detalhes:
datas, nomes, endereços, documentos, fatos. Em abril de 2004, com a
reportagem de capa, publicamos os nomes daqueles que, disfarçados de
diplomatas, como é habitual, chefiavam CIA, DEA, NSA e demais agências
no Brasil. Vicente Chellotti, diretor da PF, caiu depois da reportagem
de capa Os Porões do Brasil, de 3 de março de 1999. Isso no governo de FHC, que agora, na sua página no Facerbook, disse desconhecer ações da CIA no país”.
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