A aliança PSB-PSDB e a “nova política” de um governo que usa a motosserra - Viomundo
publicado em 3 de janeiro de 2014 às 13:59
ALIANÇA PSB/PSDB: O QUE, AFINAL, É ESSA “NOVA POLÍTICA”?
por José Luiz Gomes da Silva, cientista político, via e-mail
Dizia o velho Ulisses Guimarães que, em política,
“nunca devemos estar tão distante que não possa se aproximar, nem tão
próximo que não possa se afastar”.
A máxima do saudoso Dr. Ulisses reflete bem as articulações entre os
dois presidenciáveis, Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB).
O projeto de ambos parece-nos muito óbvio, que seria o de levar as
eleições presidenciais de 2014 para o segundo turno, onde ambos já
teriam antecipado a possibilidade de apoio mútuo, consoante quem estiver
melhor na fita naquele momento.
É curioso como, com tanta antecedência, essa costura possa estar tão consolidada.
Na história recente das eleições no país, talvez essa seja a eleição
onde, concretamente, acordos para um eventual segundo turno sejam
amarrados com tanta antecedência.
Neste aspecto, não estão se confirmando as previsões do marqueteiro
oficial do Planalto, João Santana, de que haveria uma autofagia entre os
anões.
Eles iriam se comer no andar de baixo, enquanto Dilma Rousseff continuaria nas nuvens.
O Planalto vem adotando uma estratégia que não sabemos se é a mais
correta em relação ao assunto: a estratégia do “acocha” e “afrouxa”, bem
conhecida daqueles que atuam em sala de aula.
Ora informa que Lula vem morar em Pernambuco para derrotar Eduardo no
seu quintal, ora recomenda cautela, prevendo os arranjos inevitáveis na
eventualidade de um segundo turno.
O comportamento do PT pernambucano não merece comentários.
Ele simplesmente não resiste a um queijo de cabra, produzido em
conhecida fazenda do Cariri paraibano, servido na mansão de Dois Irmãos.
Como já foi posto por alguns analistas, penso ser improvável uma
derrota de Dilma Rousseff nas eleições de 2014, mas, como diriam nossos
avós, cautela e canja de galinha não fazem mal a ninguém.
Melhor seria liquidar essa fatura no primeiro turno.
O assédio e o desespero da direita poderiam provocar uma situação desconfortável.
The Economist, o semanário conservador britânico
anda dedicando páginas e páginas para explicar porque Dilma Rousseff não
deve ser reeleita, esquecendo-se de elencar, deliberadamente, as
grandes conquistas sociais obtidas na Era Lula/Dilma.
Marina vem mantendo alguns encontros com Eduardo Campos.
Ainda não entendi como é que ela não o presenteou com alguns livros básicos sobre essa “Nova Política”.
Recomendaria duas leituras fundamentais do sociólogo espanhol Manuel Castells, “Sociedade em Rede” e “Comunicação e Poder”.
Tivemos o cuidado de ler com atenção as entrevistas concedidas aos
jornais locais pelo prefeito do Recife, Geraldo Júlio, e o governador do
Estado, Eduardo Campos.
São entrevistas que foram devidamente arquivadas para orientarem
nossas avaliações dos governos municipal e estadual daqui para frente.
Em ambas entrevistas, volta ao debate essa “Nova Política” da qual o
governador se diz hoje partidário, traduzida como uma espécie de
plataforma de suas aspirações presidenciais, sobretudo depois do momento
em que vinculou-se a Marina Silva.
Durante a entrevista, Eduardo Campos tergiversou bastante sobre o
assunto, envolto numa peça ficcional, onde não existem práticas
concretas que possam dar suporte à teoria e, a rigor, desconhece-se a
teoria.
O que, afinal, é essa “Nova Política”?
Em certa medida, o termo teria surgido a partir das reflexões do
sociólogo espanhol Manuel Castells, sobre a revolução promovida pelas
redes sociais no que concerne às mobilizações sociais e a falência do
modelo de democracia representativa burguesa, corrompido por expedientes
de tráfico de influência, representação de grupelhos de interesses
corporativos e desvios de recursos públicos, subtraindo as demandas
coletivas em favor de interesses privados escusos.
Castells veio ao Brasil, realizou algumas conferências e o grupo que
orbita em torno da acreana Marina Silva aproximou-se do teórico,
elegendo-o como uma espécie de guru ou ideólogo.
Marina é a contradição em pessoa.
O modelo de desenvolvimento sustentável proposto pelo grupo ligado a ela passa por profundos questionamentos.
Sustentabilidade mesmo só a financeira, uma vez que o grupo conta com apoio de participantes de peso dos banqueiros paulistas.
Manuel Castells é um intelectual envolvido com o movimento de Maio de 68, na França.
Sobretudo no segundo título, Castells disseca o esgotamento do modelo
de democracia representativa, afirmando que a “classe política” passou a
defender seus próprios interesses corporativos, distanciando-se dos
interesses da sociedade como um todo.
Ou seja, criou-se uma cisão entre representantes e representados,
obrigando esses últimos a criarem novos padrões de participação
democrática num mundo globalizado e digitalizado.
Em muitos aspectos, com todos os elogios que se possa fazer ao trabalho de jornalismo do Jornal do Commércio
com a matéria sobre os 80 anos do livro Casa Grande & Senzala, de
Gilberto Freyre, quem, de bom-senso, poderia ignorar o papel das redes
sociais para repercutir negativamente as declarações do ex-secretário de
Defesa Social, Wilson Damázio, culminando com seu pedido de demissão?
[Nota do Viomundo: Para saber mais sobre as declarações de Damázio, secretário indicado por Eduardo Campos, clique aqui]
Isso sim é nova política.
A aliança com Eduardo Campos atendeu estritamente a interesses pragmáticos, nunca programáticos, seja lá o que isso signifique.
O modelo de crescimento adotado no Estado relegou completamente as questões ambientais.
Poderia citar alguns dados aqui, mas isso iria cansar o eleitor minimamente informado.
Trata-se de um Governo motosserra.
Penso, sem nenhum exagero, que os índices de desmatamento de mata
atlântica no Estado hoje seriam comparáveis ao período mais nefasto do
apogeu da economia da cana-de-açúcar.
Quando ele entra no terreno político, aí, então, é que as coisas
descambam de vez, com a sua afirmação de que irá realizar o “Novo” com o
“Velho”.
Certamente ele entregará a missão de realizar a reforma agrária –
atrasada secularmente no país — aos ruralistas liderados pelo senhor
Ronaldo Caiado.
Em artigo recente, o professor Michel Zaidan Filho fala sobre uma
espécie de índice de popularidade construída a partir
de artifícios midiáticos, ancorados em pesquisas sob medida, concebida
apenas com a finalidade de jogar esses índices nas alturas, sem que os
mesmos reflitam a qualidade dos serviços públicos e o atendimento às
demandas reais da população, este sim, um índice republicano para aferir
o desempenho dos gestores públicos.
O resultado disso é que se cria uma grande dicotomia entre os tais
índices de popularidade, artificialmente construídos, e a vida cotidiana
do cidadão, onde não se observam melhorias significativas.
O mesmo se aplica à propalada “Nova Política”, decantada em versos e prosas pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos.
Em entrevista recente, já mencionada, o governador fez uma ginástica
linguística enorme para explicar aos jornalistas que o entrevistaram as
contradições inerentes ao conceito e às suas práticas ou políticas
aliancistas, absolutamente destoantes.
Em dado momento, afirma que irá fazer o “Novo” com o “Velho”, seja lá o que isso possa significar. Aliás, escamotear.
Recentemente, a imprensa noticiou que ele teve um grande encontro com o também presidenciável, o senador Aécio Neves, do PSDB.
O encontro ocorreu no Restaurante Fasano, no Rio, um dos mais “chicos” do pedaço, como diria minha caçulinha Maria Luísa.
Bons de garfos, acostumados às tradicionais culinárias pernambucana e
mineira, certamente não pediram os pratos de Marina Silva,
caracterizados por algumas regras rígidas.
Pelo menos em algum aspecto ela precisa parecer coerente.
Aliás, como brincou um articulista do site “O Cafezinho”, a acreana,
na realidade, do ponto de vista político, foi, literalmente, jantada.
Marina é um poço de contradições até mesmo no que se refere às
questões ambientais, mas, rigorosamente, não estava em seus planos essa
aproximação com os tucanos, um grupo com quem mantém divergências
substantivas, rejeitados no momento em que decidiu juntar-se ao
socialista.
Pois bem. Trata-se de uma aliança consolidada no plano nacional.
A formalização dos acordos aqui em Pernambuco reflete apenas uma
costura de longas datas, onde os partidos mantinham uma espécie de
aliança branca, confirmada pelo grão-mestre tucano na província, ao
afirmar, em entrevista recente, que o PSDB nunca foi oposição ao Governo
Eduardo Campos.
O vereador Raul Jungmann e o senador Jarbas Vasconcelos sabem o que isso significa.
Os cargos do PTB, que desembarca do Governo, devem ir para o PSDB.
A Secretaria de Transportes e o DETRAN estão confirmados.
Um bom marqueteiro — coisa que o Planalto tem — encontrará um
mecanismo de evidenciar para os eleitores esse “fosso de contradições”
em que o candidato Eduardo Campos está se metendo com essa conversa de
botequim sobre a “Nova Política”.
Tenho observado que ele passou a usar uma “linguagem que o povo entende”.
Quando se referiu às providências do Governo Federal em relação às
vítimas das enchentes nos Estados de Minas e Espírito Santo, falou
sobre as trancas das portas depois de arrombadas.
Pelo visto, as suas estão escancaradas.
Penso que a ministra Gleisi Hoffmann deu uma ligadinha para o Lula.
Não precisa ir buscar inspiração nos gregos, quando se tem um
pernambucano que é a maior autoridade quando o assunto é se entender com
o povão. Reforçou-lhes a pecha de “ingrato”, a única condição que os
gregos não perdoavam.
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