por Clerto Alves
Na semana passada, estampando na capa uma imagem do Cristo Redentor usando uma máscara de oxigênio, a revista The Economist trouxe uma reportagem afirmando que o Brasil vive hoje a sua maior crise político-econômica desde a redemocratização em 1985. A reportagem atribui o infortúnio nacional ao desastroso governo de Jair Bolsonaro.
A péssima gestão da pandemia, os problemas econômicos, sociais e ambientais são retratados em tom de críticas fortíssimas ao “comandante” do governo brasileiro e, no final, destaca que o futuro do Brasil depende fundamentalmente das eleições do ano que vem, sugerindo de maneira clara que é urgente a retirada de Bolsonaro do poder. Até aí nenhuma surpresa, visto que a imprensa internacional há muito tempo rechaça a política medieval implantada pelo atual presidente brasileiro.
Mas o que chamou mesmo a atenção foi a repercussão da matéria no meio político e na grande mídia brasileira. A maioria finge espanto quando se reporta ao conteúdo da revista inglesa como se ali houvesse coisas inimagináveis do ponto de vista de uma gestão governamental, quando na verdade, todos são sabedores que do espectro político do qual Bolsonaro emergiu e foi catapultado – por essa mesma classe política e mídia corporativa – não se poderia esperar coisa diferente.
Bolsonaro passou 28 anos ocupando cargos eletivos no parlamento brasileiro sem produzir absolutamente nada! Bolsonaro era um parlamentar do último porão do baixo clero da Câmara dos Deputados. Não passava de um político e uma figura humana desprezada pelos seus próprios pares.
Eis que, do “dia pra noite”, em virtude da “morte política nacional” do PSDB – aquele mesmo que com Aécio Neves e as bênçãos do intelectual-burguês FHC, em conluio com Eduardo Cunha, Michel Temer e o resto, derrubaram Dilma Roussef da presidência – elevam Jair Bolsonaro à condição de “redentor do Brasil”, de “messias da nova política”, que purgaria todos os pecados da degradada política tupiniquim.
Aliada dessa tresloucada ideia e com interesses nada republicanos, estava a operação Lava a Jato do então “impoluto” juiz Sérgio Moro e do goden boy and promoter Deltan Dallagnol, com suas ações pirotécnico-midiáticas, sem provas, é verdade, porém, inundadas de convicções, e que empurraram para a cadeia o único líder de oposição capaz de derrotar nas urnas o “iluminado” Jair Messias Bolsonaro. Foram 580 dias de cana para Lula da Silva.
A fórmula era perfeita: derrubava-se o governo petista, alijava-se da disputa eleitoral o principal rival político e era só correr pro abraço. Quem não lembra do ridículo título do editoral do Estadão às vésperas do segundo turno das eleições de 2018: Uma escolha difícil. Cínicos-canalhas! Foi só esperar o desfecho e abrir o champagne.
A presidência da República Federativa do Brasil – maior instituição nacional – era colocada no colo de um indivíduo protofascista, defensor dos piores horrores da ditadura militar, ferrenho incentivador do racismo, da misoginia, da homofobia, e combatente contumaz contra os direitos humanos.
Mas, para a mídia corporativa – serviçal do grande capital – o fato do messias de araque trazer a reboque o “liberal” dos anos 1950/60 Paulo Guedes, valia correr o risco. Eles calculavam: podemos até perder a nossa liberdade de expressão, ou quem sabe, voltarmos a uma ditadura, mas será uma ditadura constitucional e teremos ainda o desmonte dos serviços públicos e políticas sociais, a privatização generalizada das empresas estatais e, finalmente, o mercado regulará tudo, será um paraíso.
E o povo? Alguém poderia atrevidamente perguntar! A resposta seria simples: o povo que se dane! Foi sempre assim. Foi assim na Proclamação da República, foi assim na guerra de Canudos, foi assim na morte de Getúlio, foi assim no golpe de 1964… só que dessa vez, mais do que nas outras vezes, essa canalhada deu com os burros n’água e jogaram o Brasil à beira de um precipício, e a cada dia que passa, mais próximos da queda estamos.
Evidentemente esse “povo” que elegeu ou ajudou a eleger o Bolsonaro não contava com uma pandemia, com um vírus letal que exporia não apenas a face brucutu ou estado policialesco do bolsonarismo, mas também a sua sede por morte e o seu descaso pelas condições mínimas de sobrevivência da população.
E para piorar a situação da parte de cima da pirâmide, que nunca se preocupou com a população, o coronavírus não respeita “status social”, ele mata a todos que não estejam com suas condições imunológicas bem fortalecidas. Seja rico, pobre, homem, mulher, jovem ou velho, ele não perdoa: mata! Aí bateu o desespero! Pior pra essa turma foi que o Sérgio Moro, sua esperança em um direitista “limpinho e cheiroso”, desmoronou como uma estátua de barro na chuva; e o João Dória, sua outra aposta na direita de sapatênis-engravatado, só tem respiro político no estado de São Paulo e olhe lá!
Mas a mídia-burguesa é a mídia-burguesa e ela não desiste tão fácil! Dia após dia, eles tentam uma alternativa, que chamam de terceira via. Eis mais uma invenção da direita brasileira, aquela que a jornalista global Eliene Catanhêde chama de “massa cheirosa”.
E nessa loucura de dizer que não te quero, eles vão negando as aparências e disfarçando as evidências, tentando evitar o retorno da esquerda ao poder e, com isso, todo dia surge um nome novo pra ser candidato a presidente do Brasil, que vai de apresentador de TV a empresário sem qualquer cacife político.
O certo é que, de momento, querendo ou não, os cínicos que fingem-se estarrecidos com a diarreia política de Bolsonaro, não têm outra saída que não seja o retorno ao comando da nação daquele a quem mais eles “amaldiçoaram”, inclusive mandando-o para o cárcere por 580 dias. Os próximos capítulos desse enredo à brasileira e considerando a COVID-19, literalmente, quem viver, verá!
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