Amigos(as), mais um livro que apresenta com argumentos como os cabeças de planilha do Plano Real enriqueceram com informações privilegiadas do governo FHC além da roubalheira da privataria e decisões lesa-pátria. Um governo que teve um presidente do Banco Central preso por passar informações amigos banqueiros e por praticar crimes contra o sistema financeiro.Um governo que quebrou o país por três vezes para beneficiar uns poucos e defender os interesses de fora do Brasil.
A imprensa comemora as duas décadas do
Plano Real. Pessoalmente, prefiro comemorar os 7 anos do livro de Luis
Nassif que desvendou os mecanismos utilizados pelos gestores do Plano
Real para enriquecer com a troca de moeda exatamente como Rui Barbosa e
seus acessores fizeram durante o Encilhamento. Em homenagem aos 20 anos
do Plano Real, portanto, republico aqui a resenha que fiz do livro "OS
CABEÇAS-DE-PLANILHA".
Apesar de não ser celebridade da Rede Globo, Luis Nassif (http://luisnassifonline.blog.uol.com.br/
) tem sido um dos jornalistas econômicos mais importante dos últimos 20
anos. Junto com Aloisio Biondi denunciou os abusos da privatização e
apontou de forma clara, precisa e didática as falhas do Plano Real.
Desafiando os consensos técnicos que preservam a desordem econômica e
social brasileira, cuja única virtude é exatamente seu maior defeito
(concentrar poder renda na mão de poucos), Nassif já tinha seu lugar
garantido no Panteão de intelectuais honestos deste país. Em razão de
seu novo livro, OS CABEÇAS-DE-PLANILHA (editoro, 2007), o jornalista
merece uma atenção ainda maior.
Quais são
as semelhanças entre a política econômica de Rui Barbosa de Fernando
Henrique Cardoso? A resposta de Nassif pode ser resumida numa palavra:
muitas. Nassif não só identificou as semelhanças como apontou como elas
ocorreram e, principalmente, quem foram s maiores beneficiados.
Usando
como referência teórica a obra de Friedrich List (Sistema Nacional de
Economia Política), Nassif chegou a conclusão que o Brasil teve suas
grandes janelas para se tornar um país desenvolvido. Perdeu ambas em
razão da ganância oportunista dos responsáveis pela gestão econômica do
país.
Antes da
proclamação da República, Rui Barbosa se notabilizou em razão da critica
a política econômica do Visconde de Ouro Preto. Rui escreveu muitos
artigos para dizer que a mesma beneficiava escandalosamente o Banco
Nacional do Brasil (que foi criado a partir do Banco Intercontinental,
do Conde Figueiredo). Ouro Preto concedeu ao Banco Nacional o direito de
emitir moeda e definir o cambio.
Após a
proclamação da República, Rui Barbosa substituiu o Visconde de Ouro
Preto com a missão de moralizar a administração financeira. Nassif
sustenta que o novo ministro das finanças fez exatamente o oposto, ou
seja, preservou a concentração do poder de emitir moeda e definir o
cambio nas mãos dos Bancos privados. Fez isto sem consultar os demais
colegas de ministério. Mas ao contrário de beneficiar apenas o Banco
Nacional do Brasil, Rui Barbosa concedeu o privilégio a três Bancos: o
primeiro no Rio de Janeiro, o segundo na Bahia e o terceiro em Porto
Alegre.
A decisão
de Rui Barbosa provou séria objeção dos outros ministros. A
controvérsia acabou quando foi aprovada a criação de um banco emissor de
moeda em São Paulo.
O dono do
Banco emissor no Rio de Janeiro seria o Conselheiro Francisco de Paula
Mayrink, amigo pessoal de Rio Barbosa. Mas o Banco dos Estados Unidos do
Brasil criado por Mayrink nasceu sob suspeita de fraude, de
falsificação de seu capital. O Encilhamento (como foi chamada a política
econômica de Rui Barbosa), foi usado com maestria para alguns poucos
brasileiros enriquecerem enquanto o país era levado à bancarrota.
Nassif é enfático ao afirmar que “...os
golpes foram montados em cima de emissões primárias de ações. O
comprador pagava 10% do valor da emissão; a empresa era lançada. Quando
necessitava de mais capital, procedia a novas chamadas. Se o investidor
não subscrevesse a nova chamada, perdia direito ao que já havia pago.” O resultado da jogada era sempre o mesmo
“...as empresas não tinham como reduzir o valor das ações, que estavam
amarradas ao valor nominal dos vencimentos. Resultava disso o encalhe
dos lançamentos posteriores, inviabilizando as empresas e dando prejuízo
integral aos acionistas.”
Ainda segundo o autor depois da “...especulação
com ações, seguiu-se uma muito mais ampla, sofisticada e intensa com o
câmbio, em geral pouco estudada, principalmente após a quebra do Banco
Baring Brothers, inglês, especulando com câmbio na Argentina.” No Brasil de “...janeiro
a abril, tal como Demétrio havia previsto, houve intensa desvalorização
cambial, de cerca de 25%, seguida da volta da inflação. De uma taxa
negativa de 16,1% em 1887, a inflação chegou a alcançar 84,9% em 1891,
quando a especulação atingiu o seu auge.”
Luis Nassif esclarece que na verdade “... tinha havido um volume considerável
de vendas cambiais a descoberto antes da safra. Os tomadores dos papéis
passaram a atuar para forçar a baixa do câmbio. No momento da
liquidação, quem tinha vendido a descoberto (isto é, sem dispor da
mercadoria) foi obrigado a ir ao mercado adquirir cambiais a preços mais
elevados. A corrida dos vendedores a descoberto deflagrou um jogo
especulativo pesado, em que as somas jogadas eram sucessivamente
elevadas.”
A
especulação guarda muitas semelhanças com o jogo organizado. Em ambos só
os grandes apostadores ganham sempre. No caso do jogo, quem o banca
embolsa todas as apostas e paga os prêmios (que geralmente são
inferiores ao arrecadado dos apostadores). Num surto de especulação, os
grandes Bancos acabam se beneficiando das vulnerabilidades de cada um
dos especuladores. Foi o que ocorreu no princípio da República. “Com
a dinheirama inundando a economia e as reservas de ouro dos bancos
podendo influenciar o mercado de câmbio, o movimento especulativo em
torno da Bolsa de Valores atingiu ao máximo.”
Ao invés
de estancar a sangria da economia real, Rui Barbosa patrocinou a fusão
entre o Banco do Conselheiro Mayrink com o Nacional de Figueiredo. A
medida agravou a crise. Pessoalmente, entretanto, Rui não foi
prejudicado. Em virtude de suas relações perigosas com os banqueiros ele
abocanhou a Presidência da Companhia Frigorífica e Pastoril Brasileira e
o posto de consultor jurídico da Light and Power Co. Ltda. Em 1893 “...dois
anos depois de deixar o governo, Rui estava suficientemente rico para
comprar o palacete neoclássico na rua São Clemente, em Botafogo, que
pertencera ao Barão da Lagoa”.
Durante o
Encilhamento, Carlito, o jovem cunhado de Rui Barbosa também ficou
rico. Registrou em suas memórias as seguintes palavras, que foram
reproduzidas por Nassif:
“Minhas
atividades em torno da Bolsa proporcionavam-me resultados que me faziam
nadar em dinheiro. Os sucessos eram expostos na nossa rodada como
tacadas. De quando em quando, uma de 20, 30, de 50 contos.”
As
possibilidades do Real eram muito boas. A sociedade havia produzido uma
série de consensos que culminou na elaboração da nova política
econômica. O quadro internacional era favorável à modernização do país. “A
remonetização era um jogo de xadrez com inúmeras possibilidades. Os
economistas do Real poderiam ter escolhido o caminho da chamada
monetizarão da dívida pública. No vencimento, em vez de títulos, o
investidos receberia reais. A dívida seria monetizada, desapareceria, e o
mercado teria que se reorganizar para reciclar os recursos, abrindo
espaço para investimentos na atividade real.”
Não foi o
que ocorreu. A exemplo do Encilhamento, o Plano Real foi usado pelos
seus idealizadores mais para enriquecer do que para sanar as graves
deficiências da ordem econômica e social brasileira. Quando ocorreu a
troca de moedas a equipe econômica de Fernando Henrique Cardoso permitiu
“...ganhos extraordinários para os grupos que foram antecipadamente
informados sobre a lógica de apreciação do real. Era uma jogada
irresponsável, mas que aconteceria apenas uma vez, permitindo uma
‘tacada’ - no jargão do mercado financeira, o golpe aproveitando a
oportunidade única, termo, aliás, bastante utilizado por Carlito, o
cunhado de Rui, para explicar suas operações.” Curiosamente, quando
era estudante, Gustavo Franco, que foi o ideólogo do Real, chegou a
escrever uma monografia sobre a política econômica de Rui Barbosa.
Em OS
CABEÇAS-DE-PLANILHA o jornalista Luis Nassif demonstra as artimanhas
empregadas pelos gestores do Plano Real para encher suas algibeiras e
corajosamente afirma que:
“Pérsio Arida era eminentemente
técnico, via o plano como uma revanche do Cruzado e se preocupava com
sua consistência. Só depois que saiu do governo se envolveu com o
mercado, enriquecendo-se como sócio do complicadíssimo banqueiro Daniel
Dantas, do Banco Opportunity. A gratidão dos colegas para com ele, e o
reconhecimento de que perdera a chance de enriquecer, ao contrário dos
demais, foram elementos centrais nas facilidades que encontrou para
mobilizar fundos de pensão que permitiram a Daniel Dantas tornar-se um
dos vencedores do processo de privatização brasileiro.”
“André Lara Resende via o plano como uma forma de enriquecimento e ascensão social.”
“Gustavo Franco era o ideólogo, mas
casava com brilhantismo conhecimentos históricos, teóricos e de mercado.
Era um personagem mais interessante que os demais - Pércio com seu
rigor técnico, André com sua ambição de enriquecer.”
A obra de Luis Nassif aponta os
descaminhos do Plano Real e da privatização. Demonstra como os gestores
do mesmo desperdiçaram a segunda oportunidade para o país se tornar
desenvolvido (exatamente como ocorreu na época do Encilhamento). O livro
desmantela cada uma das mentiras, simplificações, distorções e
meias-verdades que foram empregadas na década de 1990 para preservar os
juros altos e câmbio superestimado apesar dos seus malefícios para o
país (ou por causa dos benefícios pessoais que alguns auferiam). Mas não
vou descer aos detalhes. Os interessados devem consultar OS
CABEÇAS-DE-PLANILHA.
Leia mais aqui
Marcelo Fernandes *
Há alguns meses foi publicado pela editora Ediouro, sem grandes pompas, o livro, “Os Cabeças-de-Planilha” (1), do jornalista econômico Luís Nassif. Não obstante a precária distribuição, a pouca exposição em livrarias e pr
O livro realmente tem muitos méritos. Luís Nassif compara e analisa dois episódios-chave na história da nossa república: o Encilhamento e o Plano Real. No Encilhamento, um momento nada edificante na vida do célebre Rui Barbosa, então ministro da Fazenda, aliás, o primeiro ministro da Fazenda da nossa história republicana. No Plano Real, a falta de postura dos responsáveis pela administração do plano. Tanto Rui Barbosa como os economistas ligados ao Plano Real enxergaram uma possibilidade única de enriquecer às expensas do país.
Outras semelhanças são apresentadas. Nos dois períodos ocorre um aumento dos fluxos de capitais no mundo, juntamente com a criação de uma ideologia de defesa da liberalização financeira.
Dentro dos países da periferia, quadros técnicos, políticos e economistas dispostos a advogar em nome do grande capital, ajudaram a propiciar um ambiente favorável aos fluxos de capitais. Também, nos dois períodos, há um avanço na industrialização, porém, lembra o autor, “curiosamente, só crescem os países que não seguem as regras preconizadas pelas grandes potências. Quem se abre para o livre fluxo de capitais e de comércio, não consegue se desenvolver”. Mas a grande questão está no processo de remonetização advindo da reforma monetária, algo raro na história. O fato é que, tanto no Encilhamento como no Plano Real, esse processo foi manipulado de forma a servir os interesses individuais daqueles que estavam no topo dos acontecimentos, a despeito dos prejuízos causado ao Brasil.
Em relação ao Plano Real, na seção intitulada “As novas classes”, são mostrados alguns exemplos de como certos economistas cultos se envolveram em negócios pouco transparentes para realizar sonhos juvenis. Sobre um dos pais do Real afirma Nassif, “André Lara Resende via o plano como uma forma de enriquecimento e ascensão social. Depois de enriquecer com o Real, realizou sonhos adolescentes de comprar carros e cavalos de corrida – que transportou de avião para Londres, quando resolveu passar uma temporada por lá”.
No apêndice do livro há uma entrevista imperdível com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Deve ter sido surpreendente para àqueles acostumados a ver o ex-presidente “nadar de braçadas” em entrevistas preparadas sob medida para o seu próprio deleite. A entrevista é bastante reveladora: mostra como não passava de um mito, a história, bem montada, de um presidente intelectual, muito bem preparado, ciente dos rumos a ser tomados e que conduziria o Brasil no caminho ao primeiro mundo. Como bem disse Luis Nassif, o depoimento do ex-presidente “ajuda a entender como se formam ideologias, e como elas se impõem devido à inércia provocada pelo chamado pensamento hegemônico, pela ausência do contraditório, pela indefinição programática dos partidos políticos e, principalmente, pela falta de disposição dos governantes de tentar modificar os rumos dos ventos”.
Vale a pena conferir. Por mais de uma vez, os comentários de Nassif sobre a política cambial no Plano Real, recebeu a singela resposta do tipo “Isso eu não sei, não foi discutido comigo”. Sobre um tema fundamental como a abertura da conta de capitais, e a crítica que a maior parte do dinheiro que entrava era capital especulativo, tudo que o ex-presidente tem a dizer é: “Para mim não era claro. Para mim estava entrando investimento direto”. Nassif lembra da desnacionalização da economia, mas segundo Fernando Henrique, acreditem, “Isso não tem importância. Você compra empresas, o empresário faz outra”. Adiante, quando lhe é perguntado se a liberalização dos fluxos de capital não era discutida, o ex-presidente responde simplesmente que, “comigo não”. Poderia então se perguntar, com quem foi discutido, já que, como bem lembra Nassif, a liberalização financeira foi uma das marcas indeléveis do modelo implementado na sua gestão. A entrevista toda segue nesse nível. É obvio que um presidente não pode saber de tudo que acontece, mas algumas questões, como o câmbio, estavam no centro das discussões do Plano Real.
Enfim, o livro é uma ótima oportunidade para quem quer conhecer o outro lado da moeda; aquelas informações que só aparecem numa notinha no meio do jornal, quando aparecem...
Nota
(1) NASSIF, Luís (2007). Os Cabeças-de-Planilha. Rio de Janeiro: Ediouro.
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