seg, 02/05/2016 - 10:45
Atualizado em 02/05/2016 - 10:45
Jornal GGN – A Escola
de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP) realizou
um seminário com professores brasileiros e estrangeiros a respeito da
crise política e econômica. De acordo com os acadêmicos, a crise não é
exclusivamente brasileira, mas decorre de uma nova realidade global que
tem vitimado países de todo o mundo.
“O que se passa no Brasil não é muito
diferente do que nós, em Portugal, na Espanha e até mesmo na Itália,
tivemos em outros momentos, com a autonomização dos grandes meios (de
comunicação) em relação aos meios políticos e o desenvolvimento da
própria política”, diz a professora da Universidade de Coimbra Isabel
Ferin Cunha. Ela comparou o momento atual do Brasil com a chamada
“austeridade neoliberal” que se instaurou em Portugal e na Espanha.
Os professores falaram da participação
dos meios de comunicação no aprofundamento da crise política. “A questão
da relação entre mídia e política é um outro fenômeno, introduzido na
chamada globalização neoliberal na terceira ou quarta fase, em que a
mídia tem o papel de domesticar a população pela aceitação dessa nova
fase do neoliberalismo”, afirmou Maria Cristina Castilho Costa,
coordenadora do Observatório de Comunicação, Liberdade de Expressão e
Censura (Obcom).
Da Rede Brasil Atual
Por Eduardo Maretti
Em seminário na USP, professora de
Coimbra diz que crise brasileira é semelhante à que ocorreu em Portugal.
Para professor da ECA, “não regulamentação” dos meios teve papel
importante no processo
São Paulo – A aguda
crise político-econômica do Brasil e a participação dos meios de
comunicação nessa crise não têm causas exclusivamente brasileiras. O
fenômeno decorre de uma realidade global, que tem vitimado outros
países. “O que se passa no Brasil não é muito diferente do que nós, em
Portugal, na Espanha e até mesmo na Itália, tivemos em outros momentos,
com a autonomização dos grandes meios (de comunicação) em relação aos
meios políticos e o desenvolvimento da própria política”, diz a
professora da Universidade de Coimbra Isabel Ferin Cunha.
Para ela, o momento do Brasil é
semelhante ao período em que se instaurou a chamada “austeridade
neoliberal" em Portugal e Espanha, com intervenções do Fundo Monetário
Internacional e do Banco Central Europeu no início da década. Os países
estão entre os primeiros a ser fortemente afetados pela crise de
dimensões globais que se abateu sobre as economias mais frágeis da
Europa – e que revelou ao mundo que o neoliberalismo estava mais vivo do
que nunca. Na Itália, o processo, segundo ela, foi representado pelo
governo de Silvio Berlusconi (a partir de 2008).
Isabel foi uma das palestrantes no
seminário Liberdade e Interdição: Pontos de Vista, realizado na Escola
de Comunicações e Artes (ECA) da USP, ontem (29). Após o seminário, foi
lançado livro com mesmo título, organizado pela professora Maria
Cristina Castilho Costa, coordenadora do Observatório de Comunicação,
Liberdade de Expressão e Censura (Obcom), reunindo ensaios de vários
autores.
“Temos uma tradição autoritária, que vem
da igreja católica e da própria formação dos nosso países. Portugal, e
depois o Brasil, é uma linha autoritária que se mantém. Mas a questão da
relação entre mídia e política é um outro fenômeno, introduzido na
chamada globalização neoliberal na terceira ou quarta fase, em que a
mídia tem o papel de domesticar a população pela aceitação dessa nova
fase do neoliberalismo”, afirmou.
O professor Vitor Blotta, do
Departamento de Jornalismo e Editoração da ECA e pesquisador Associado
do Núcleo de Estudos da Violência da USP, considera que a “não
regulamentação” dos meios de comunicação no país tem um papel
“importantíssimo” no processo político atual e na crise política
brasileira.
“Isso na medida em que diminui a
diversidade de opiniões, e então não há versões distintas. Às vezes
temos que olhar para a imprensa internacional para contrastar as versões
nacionais. Parte da liberdade de expressão é garantir a diversidade das
vozes. Por isso, as normas de direitos humanos mais atuais na Europa
colocam a necessidade da pluralidade da mídia ao lado da liberdade de
expressão e a proteção da privacidade”, diz o professor.
Nesse estado neoliberal
internacionalizado, a professora da Universidade de Coimbra não concorda
que o golpe contra o governo Dilma Rousseff possa ser atribuído a um
acontecimento típico de uma “república de bananas”.
“Não vejo assim. Vejo isso como um
processo muito maior, que no Brasil tem configurações próprias,
nacionais, mas está dentro de um processo de expansão e reestruturação
do neoliberalismo nessa fase da globalização que, em cada país, se dá de
acordo com sua cultura, não só no sentido geral, mas no sentido da
cultura do sistema midiático, e agora surge com todo seu ‘esplendor’
nesta fase do conflito político.”
Para Blotta, com a realidade trazida
pela internet, há uma perspectiva de ampliar o “espectro de vozes” que
podem se fazer ouvir no âmbito das comunicações. Mas, mesmo essa saída,
apontada por profissionais progressistas dos meios de comunicação e
analistas de mídia como um contraponto ao poder midiático dos grandes
grupos de comunicação, deve ser vista com reservas.
“Com a concentração, em termos de canais
provedores de internet ou grandes empresas de conteúdo e aplicativos
como Google e Facebook, também vai sendo gerada uma certa
homogeneização, o que dá uma falsa impressão de espaço mais democrático.
Tenho estado um pouco cético quanto a isso”, diz Blotta.
Nessa realidade que, para muitos, não
permite que se veja luz no fim do túnel, a evolução para um cenário mais
favorável à cidadania pode ser possível, mas com avanços lentos e
pontuais. “Em termos de estrutura dos meios e de regras de concessão,
sou um pouco cético quanto às perspectivas. Acho que são pequenas
reformas que podem talvez levar a uma melhora, mais do que um grande
marco geral de comunicações, que acho muito difícil de ser aprovado”,
diz Blotta. "O Marco Civil da Internet precisa ser protegido."
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