O
escritor e jornalista francês, Gilles Lapouge, em sua coluna no
Estadão, registrou nesta sexta (13) a impressão que os franceses têm dos
novos governantes brasileiros — leia-se Cunha, Renan e Temer,
respectivamente — depois de consumado o golpe contra Dilma: “corrupto,
lobista e traidor”.
“Cunha, um político corrupto. Renan Calheiros usava um lobista para
pagar pensão para sua amante grávida, e se Temer é um homem bonito,
elegante, polido, de onde saiu? Era vice-presidente de Dilma! Bom, a
pergunta então era esta: ‘seria ele um traidor?’”, escreveu o
conservador Gilles para o Estadão
Com base no testemunho de Gilles Lapouge, tem-se a certeza de que a
Europa tem mais consciência que o Brasil foi tomado de assalto na quinta
(12).
A seguir, leia a íntegra da coluna:
Fato consumado
por Gilles Lapouge, no Estadão (13/05/2016)
Fato consumado. Dilma caiu. O que nos deixa aturdidos. Deus bem sabe
que nós, franceses, somos dotados para a incoerência política, as
mentiras de Estado, as traições, as ideologias em debandada, os falsos
arrependimentos.
Pois bem, os brasileiros nos deixaram estupefatos. Em comparação com
os parlamentares do Planalto, Sarkozy e mesmo Hollande são transparentes
como vidro. A cada dia, lendo os últimos capítulos da telenovela,
dizemos: “Bravo, artista”.
É sobretudo o suspense e os acontecimentos inesperados que nos deixam
fascinados. A cada dia uma revelação: no início todos os franceses se
revoltaram com essa Dilma que, não contente em ser um “zero”, esgotou os
cofres do Estado. Admiravam, pelo contrário, os corajosos, os
generosos, os puros, que deviam abatê-la.
No decorrer dos dias o quadro mudou. Sim, ela cometeu as “pedaladas”,
mas seus inimigos eram do mesmo estofo, talvez piores. Cunha, um
político corrupto. Renan Calheiros usava um lobista para pagar pensão
para sua amante grávida, e se Temer é um homem bonito, elegante, polido,
de onde saiu? Era vice-presidente de Dilma! Bom, a pergunta então era
esta: “seria ele um traidor?”;
Disseram também que Temer é chamado de “ejaculador precoce”, mas não entendemos a razão.
Um jornal francês citou este provérbio africano: “quando queremos
subir no coqueiro é bom nos certificar de que nosso traseiro está
limpo”.
Neste teatro de sombras a imprensa francesa não ajudou muito a
distinguir entre traidores e traidores. No início era globalmente hostil
a Dilma, a Lula (que tanto admirava antes) e ao PT. Mesmo os jornais de
esquerda passaram ao ataque. E em seguida observamos a mudança. Mas aí
então, novo paradoxo: o primeiro jornal a expressar dúvidas quanto à
genialidade e pureza de Cunha e outros foi o jornal de direita Le
Figaro, porta-voz do empresariado.
Em compensação, o jornal da esquerda elegante e erudita, o Le Monde,
continuou reticente com relação a Dilma, a ponto de precisar publicar um
longo artigo para se desculpar diante de tantas cartas de indignação
enviadas pelos leitores. “Por que o Le Monde tem de se juntar ao coro
monocórdio da mídia brasileira?”. Ou perguntando por que o jornal se
referia à presidente brasileira com desprezo. Depois dessas críticas, o
jornal retificou seu discurso.
A revista de direita L’Express também forneceu um quadro atenuado.
Não foi terno com Dilma, sua obstinação, seus erros, mas destacou
sobretudo o peso da conjuntura mundial, o que é evidente. Em seguida fez
uma tipologia dos inimigos de Dilma: “Entre os partidários da
destituição de Dilma está um belo grupo de hipócritas, atingidos por
inquéritos judiciais por corrupção. Para eles, trata-se de uma operação
de dissimulação maciça de suas torpezas”.
E ainda segundo o L’Express, como o tecido democrático é frágil, “a
cólera é dirigida contra os únicos dirigentes expostos ao veredicto
popular, ou seja, os líderes políticos, ao passo que o banqueiro e o
empresário corrompidos escapam à responsabilidade que teriam de
assumir”.
Abordamos esse assunto porque a França vem fazendo uma imagem sombria
do futuro do País. Se uma dirigente nula, longe da realidade e do povo,
áspera e arrogante, cedesse seu assento a gênio ou simplesmente a
indivíduos de boa vontade poderíamos esperar que este novo poder,
apoiado por uma opinião pública encantada e inflamada salvará o país do
abismo. Mas se, como diz o L’ Express, a herança corrompida de Dilma
ficar nas mãos de corruptos, medíocres e especialistas na prática de
atos infames, então realmente há razões para nos inquietarmos.
Felizmente, o Brasil já demonstrou muitas vezes, e há apenas 31 anos,
que, quando precisa escolher caminhos duvidosos é capaz de se
recuperar, ao passo que outros países se dão por vencidos. / TRADUÇÃO DE
TEREZINHA MARTINO
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