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quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Por que a economia brasileira sofre ataques da velha mídia e de seus serviçais?

Marco Damiani _247 – Depois de reestruturar, num trabalho brilhante, no início da década de 1990, a dívida externa do Brasil ao longo de complexas negociações meses a fio com o FMI e dezenas de bancos credores, e pilotar com maestria os primeiros quatro anos do Plano Real, o ministro Pedro Malan, que ocupou durante oito anos o Ministério da Fazenda do presidente Fernando Henrique, passou o segundo mandato do governante tucano, entre 1999 e 2002, praticamente de braços cruzados diante da crise internacional. 
 
Não havia medidas macroeconômicas, tampouco cobranças em escala na mídia tradicional pela paralisia da atividade. Dava-se, sem esperneios, aqueles anos como perdidos, em alinhamento com o discurso oficial, repetido até hoje pelo próprio Fernando Henrique. O discurso de que não havia mesmo o que fazer para enfrentar a crise global. Em Brasília, Malan convocava entrevistas coletivas que tinham como tema, durante os menos de 15 minutos de duração de cada uma delas,  a ida do Brasil ao FMI, em pedidos de empréstimos bilionários que ganhavam ares de pic-nics primaveris nos jornais do dia seguinte.
As coisas mudaram. Tanto do lado do governo, como do lado da mídia. A complacência com que o comando da economia encarou, na virada dos 1990 para os 2000, a crise internacional foi substituída pelo que se chama agora, com crítica e ironia, de hiperativismo. Lá fora, numa atitude por todos os ângulos honesta, a presidente Dilma ocupa os foros internacionais dos quais participa para defender sua receita anti-cíclica, sem receio de deixar de ganhar jantares de gala com direito a discursos amigáveis e honrarias de ocasião. À maneira de cada um, o governo tucano deu e a gestão dilmista dá o melhor de si ao País – mas esse segundo jeito parece que não serve.
Em meio a projeções do "pibinho" de 1% para 2012, uma revoada de avis raras ocupa a mídia tradicional rumando para a mesma direção de tempestadas no horizonte. É para lá que está indo a nossa economia, dizem. Entre colunistas de economia e de sociedade, como se diz, ex-presidentes do BC e antigos quadros da alta administração pública, o que se tem, hoje, é outra vez a expressão do pensamento único neoliberal de que não se pode voar contra o vento.
Tem-se o cuidado, até mesmo, de minimizar a crise internacional e atribuir exclusivamente à política econômica local a baixa do PIB. "Uma investigação minimamente mais cuidadosa, contudo, mostra um quadro muito distinto daquele suposto pelo Banco Central (BC). A começar porque, do ponto de vista da economia global, a desaceleração recente é pálida sombra do que foi a crise de 2008/2009", escreveu o economista e ex-diretor do Banco Central (2003-2006) Alexandre Schwartsman. Ele compara o desempenho brasileiro com o de outros países do continente para garantir sua tese. "Quando se examina o período mais recente, todavia, é visível a diferença de desempenho entre o Brasil e os demais países latino-americanos. Embora o crescimento tenha se desacelerado em todos eles (em média uma redução de 1 ponto percentual), a desaceleração brasileira foi muito mais forte (cerca de 4 pontos percentuais) e o Brasil é o único que registra expansão abaixo da tendência estimada. Posto de outra forma, os dados sugerem que o baixo crescimento nacional é um fenômeno local", cravou.
Por outro ângulo, alerta a colunista Sônia Racy, de O Estado de S. Paulo, em nota intitulada Guinada 1, que empresários que ela ouviu, pró e contra o governo, já exprimem o mesmo temor: "Acreditam que, sob pressão, ela (a presidente Dilma) possa... radicalizar. Sem romper contratos, mas aprofundando a atual centralização". Se não bastasse, tem a Guinada 2: "Para o mercado financeiro, a pior coisa que Mantega poderia ter feito era reclamar publicamente dos números do IBGE. Imediatamente, lembraram-se de Cristina Kirchner".
As dúvidas do ministro sobre o PIB do terceiro trimestre apontados pelo IBGE valeram, nesta quinta-feira 6, editorial do mesmo Estadão: "Parece-nos muito grave que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, duvide dos dados do IBGE, que desde 1936 reúne estatísticas sobre o Brasil." Na verdade, o que Mantega levantou publicamente, durante entrevista, foi uma dúvida sobre o peso dos investimentos públicos na composição do resultado, o que foi interpretado, sem condescendência, como quase uma ordem de revisão dos números dada pelo titular da Fazenda aos técnicos do IBGE. Isso não aconteceu, mas para o Estadão...
Há, é certo, algo de ufanismo na postura de Mantega. Ele acredita ser papel do ministro da Fazenda portar boas notícias, animar os agentes econômicos, mexer com os brios dos empresariado e até mesmo proteger os trabalhadores. Exagerou, assim, em suas projeções para o PIB do terceiro trimestre – e a escorrega já vai lhe custando praticamente uma crucificação em praça pública. Com direito a grossa ironia. É também do ex-BC Schwartsman, no seu artigo O Quarto do Riso, publicado no jornal Valor Econômico, a tirada de sarro sobre o ministro: "É preciso reconhecer que, em retrospecto, o ministro da Fazenda estava correto ao qualificar a projeção do PIB de 1,5% como piada; só não percebeu que a sua própria piada (crescimento de 4%) era bem mais engraçada...".
Quando, por outro lado, o governo aponta para a ideologização do debate econômico, tal qual aconteceu há pouco em torno do julgamento do chamado mensalão, no campo político-jurídico, não parece estar errado. Os ataques à Fazenda e ao BC eram, até aqui, comedidos, mas bastou, digamos, sair o primeiro dos que apostam contra o governo para que toda a torcida mostrasse sua paixão. Já há quem veja a presidente Dilma e o ministro Mantega definitivamente de mau com o empresariado e o público, apesar da série de bons resultados no emprego, na renda e no consumo. É o caso do colunista Carlos Alberto Sardemberg, que escreve para jornais e tem presença diária no Jornal da Globo, da Rede Globo: "Vamos falar francamente: as relações do governo Dilma com o setor privado caíram no pior dos mundos. Há uma perversa combinação de hostilidade ideológica, negócios de compadres e corrupção. Nesse ambiente, só investe quem consegue um jeito de transferir o risco para o governo, obter financiamento e/ou subsídio e/ou acertar com funcionários na base da propina."
Se os ânimos se acalmarem em ambos os lados, o debate econômico sem dúvida sairá ganhando. Mas nem há sinal de trégua.

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